4
principal (C. “a pessoa amada”) ou noutros, mais difusos (D. “pessoa muito querida,
agradável, com quem se quer estar”).
Conforme o mesmo verbete, na língua comum, amor indica um segundo conjunto
mais abstrato de acepções (E. “gosto vivo por alguma coisa”; F. “excesso de zelo e
dedicação” a algo; G. “inclinação ditada pelas leis da natureza”), bem como dois sentidos
ligados ao Sagrado (H. “sentimento de devoção direcionado a alguém ou ente abstrato;
devoção, adoração” ou I. “designação do Cupido, deus romano do amor”).
A mesma obra ainda registra expressões idiomáticas compostas por amor: amor ao
próximo (J. “‘sentimento que leva alguém a agir com caridade, generosidade’”); amor à
primeira vista (K. “‘sentimento amoroso que se tem por alguém que se acabou de
conhecer’”); amor cortês (L. “‘amor servil, nobre, leal do cavaleiro por uma mulher,
normalmente figurado em literatura medieval’”) e amor platônico (M. “‘amor ideal, puro, que
não se pauta em desejo físico, [...] impossível, não correspondido’”).
A partir do levantamento de todos esses sentidos
2
, Ribeiro (2021) lista sinônimos
(afeto, amizade, adoração, devoção, zelo, cuidado) e antônimos (desamor, ódio, raiva)
contextuais para a lexia; e, por fim, indica-lhe por étimo a forma latina amor, is.
Ora, em latim
3
, contudo, os conceitos cobertos, em português, por amor e listados
acima são expressos por diferentes lexias: amor, is (forma deverbal ‘eu sou amado’, talvez
associável aos nossos sentidos C e D), caritas, tatis (sentido J), studium, i (G),
benevolentia, ae (A e F), voluntas, tatis (B); pietas, tatis (H); cupido, inis (sentidos E e I).
Assim como a portuguesa, as demais formas românicas calcadas em amor, is
conservam-na praticamente intacta, como se vê: esp./cat. amor, fr. amour, it./corso. amore.
Por outro lado, as outras lexias latinas acima originam, em português, formas com
significados próximos aos originais, mas bem menos expressivos: lt. caritas, studium,
benevolentia, voluntas, pietas, cupido > pt. caridade, estúdio, benevolência, vontade,
piedade, Cupido – o que representa, de alguma forma, perdas semânticas em sua
passagem da língua latina à lusitana.
Neste mês de celebração, no Brasil, da efeméride dos casais enamorados e em
tempos tão difíceis de tanta expressão de ódio e desamor na sociedade e na politica, entre
nós e no mundo, encerramos essas reflexões filológicas sobre os múltiplos sentidos e
formas amor relembrando a necessidade de expandirmos o amor pelas pessoas amadas
(com ou sem conotação passional ou erótica) para a difícil e quase utópica esfera de um
amor universal, que nos faça ver em todos os seres extensões de nós mesmos, como nos
ensinou o Cristo: “'Ama o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22, 39).
Referências
CARVALHO, Paulo César. Os nomes do amor. Discutindo língua portuguesa, São
Paulo, ano 1, no. 1, p. 54-7, jan./2004.
NAVARRO, Eduardo de Almeida. Dicionário Tupi-antigo: a língua clássica do Brasil. São
Paulo: Global, 2013.
O’HAGAN, Zachary. Dicionario del idioma omágua. 2011. Disponível em:
<http://linguistics.berkeley.edu/~zjohagan/pdflinks/omagua_fw2011_dict_TOTAL_FINAL.pd
f>. Acesso: 21.mar.2020
RIBEIRO, Débora. “Amor”. In: DICIO: Dicionário Online de Português. Porto: 7Graus,
2021. Disponível em: <https://www.dicio.com.br/amor/>. Acesso: 13.maio.2021.
SANTOS, Descoredes M. dos. Ioruba tal qual se fala. Salvador: Ilê Asipá, 1959.
TORRINHA, Francisco. Dicionário português-latino. 2e. Porto: Domingos Barreira, 1939.
__________________
1. A título de curiosidade, apresentamos o correspondente a amor, na acepção básica, em algumas
línguas brasilíndias e africanas referidas neste jornal, em outros artigos e edições anteriores: em Tupi-
antigo, aûsuba /aw’suba/ (NAVARRO, 2013); em Omágua, saxita /sa’∫ita/ (O’HAGAN, 2011); em ioruba,
ife /’ife/ (SANTOS, 1959), em fon, wànyìyí /wà’njìjí/ (DELAFOSSE, 1894)
2. Observando esses sentidos, confirmamos os traços comuns às acepções do vocábulo amor indicados
por Carvalho (2004): o sujeito amante e sua atração pelo objeto do amor; a forte e tônica euforia do
sujeito amante em relação ao objeto amado e a relação intensa e de grau variado do sujeito com o objeto.