Nossos povos, nossas línguas
LÍNGUAS INDÍGENAS BRASILEIRAS: PATRIMÔNIO E DIVERSIDADE
No Brasil, tornou-se comum dizer que, além da língua portuguesa e de outras línguas
europeias e asiáticas aqui introduzidas a partir do século XIX, são faladas cerca de 270
línguas indígenas, algumas isoladas (Aikaná, Arikapu, Awakê, Irantxe, Jabuti, Kanoê ou
Kaixaná, Koaiá ou Arara, Máku, Mky, Tikuna, Trumai e Zo’é) e as demais, distribuídas em
três troncos linguísticos (tupi, macro-jê, aruaque), algumas famílias isoladas (Karib ou
Caribe, Maku, Mura, Nambiquara, Pano, Tucano, Txapakura, Yanomami). Mas o que
significam essas categorias?
Dizer que o aikaná é uma língua isolada significa que ela não tem semelhança
estrutural com nenhuma outra língua que indique elas procedência de uma língua
anterior, comum: “As línguas isoladas [...] ‘são muito importantes para se compreenderem
as fases mais antigas da história da cultura – datas além do alcance da técnica
comparativa, ou seja, anteriores a 4000-5000 a.C.’ (URBAN, 1992, p.99).
Por sua vez, línguas com semelhanças estruturais indicativas de procedência de uma
mesma língua anterior são agrupáveis em diferentes famílias linguísticas. Assim, dadas
as semelhanças estruturais entre as línguas abaixo indicadas, foi possível aos linguistas
agrupá-las na família denominada Karib ou Caribe
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. Logo, elas são línguas aparentadas,
termo usado hoje como metáfora, mas de sentido bem mais denotativo na época de seu
surgimento (século XIX), quando a Linguística sofria forte influência da Biologia.
Tabela 1: Correspondências lexicais entre línguas da família caribe
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significado galibí apalaí wayâna hixarayana taulipáng
‘lua’ nuno nuno nunuy nuno kapyi
‘sol’ wéiu xixi xixi kamymy wéi
‘água’ tuna tuna tuna tuna tuna, paru
‘chuva’ konopo konopo kopo tuna kono’
‘céu’ kapu kapu kapu kahe ka’
‘pedra’ topu topu tepu tohu ty’
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Inicialmente localizados nas guianas e no extremo norte do Brasil (baixo Amazonas,
parte do Amapá e Roraima), uma vez desalojados, dizimados ou assimilados durante a
era colonial pelos espanhóis, os caribes mantiveram o controle de algumas ilhas no mar
cujo nome os homenageia e em direção ao qual já se haviam expandido há cerca de 3 mil
anos, ocupando território hoje colombiano (etnias Yupka e Karijona) e brasileiro (etnia
Bakairi). Alguns empréstimos linguísticos apontam a existência de redes complexas de
comércio e tráfico humano entre caribes e tupis na Antiguidade.
Voltando à terminologia, a Linguística Comparativa entende por família linguística
isolada aquela cujas línguas integrantes só se relacionam entre si, ou seja, com nenhuma
outra língua oriunda de família distinta, como a família caribe e as seguintes: maku, mura,
nambiquara, pano, tukano, txapakura e yanomami.
Por sua vez, um tronco linguístico surge da comparação entre diversas famílias
linguísticas com traços estruturais próximos e da conclusão, daí resultante, de que essas
semelhanças se devem à existência de uma língua ancestral comum a essas famílias.
O tronco aruaque
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se compõe de três famílias, duas representadas no Brasil:
a) família aruaque (aruak, arwak) ou maipure – com cinco grupos, quatro no Brasil:
• setentrional – localização no Brasil: Alto Rio Negro (Amazonas) e Roraima; línguas:
apurinã (ou ipurinã), baniwa do Içana, baré, mandawáka, warekana e wapixana;
• oriental – localização: Amapá; língua: palikur;
• central – localização: Parque do Xingu e outras áreas de Mato Grosso; línguas:
waurá, mehinaku, pareci (ariti ou haliti), enawené-nawé, tariana; yawalapiti;
• meridional – localização no Brasil: Acre, Amazonas e Mato Grosso; línguas: axinika