DIALECTOLOGIA
RURAL
Joseph Ildefonso de Araújo
(UFRJ, UFV,
ABF, CiFEFiL)
FALA
RURAL E
ATLAS
LINGÜÍSTICOS
MUNICIPAIS
A
elaboração
de
Atlas
Lingüístico
Municipal
Rural
surgiu
em
decorrência
da
pesquisa
dialectológica
rural
feita
em
quatro
municípios
da
Microrregião
de
Ubá:
Astolfo Dutra, Rodeiro,
São
Geraldo e Tocantins. A
grande
riqueza
de
informações
constadas na
fala
rural
levou a
equipe
a
tentar
elaborar
os
Atlas
Municipais. O
volume
de
informações
abrangia
todo
os
aspectos
da
linguagem
rural
ao
revelar
características
próprias no
léxico,
na
semântica,
na
fonética,
na
morfologia,
na
sintaxe
(especialmente
concordância
e
colocação),
não
levando
em
conta
o
aspecto
étnico-lingüístico e
folclórico
com
todos
os
seus
matizes.
Desde
o
início,
a
pesquisa
realizada
nos
vinte
municípios
da
Microrregião
de
Viçosa
visava
recolher
os
nomes
populares
rurais
de
doenças
de
criações
e
culturas
agrícolas.
Esse
é o
objetivo
fundamental
da
pesquisa
ao
qual
juntou-se o
levantamento
e a
análise
da
linguagem
da
fala
rural.
Os
dados
colhidos mostraram as
características
dessa
fala,
tomando
como
fonte
as
informações
prestadas
pelos
entrevistados,
especialmente
quando
discorriam
sobre
as
dificuldades
encontradas
para
desenvolver
suas
propriedades
e
quando
davam o
nome
das
doenças,
descrevendo
como
se manifestavam
em
suas
criações
e
culturas.
Era
rico
o
acervo
de
dados
colhidos,
além
de
outros
que
poderiam
ser
recolhidos no
contato
direto
com
microcomunidades
rurais,
as
propriedades
pesquisadas.
Os
dados
colhidos revelaram os variados
aspectos
das
falas
regionais,
reflexos
do
interior
de
cada
indivíduo
do
agrupamento
humano
em
que
está inserido. É a exteriorização
através
de
um
instrumento
fundamental
e
comum
da
comunicação
do
agrupamento:
a
língua
internalizada, “externalizada”
através
da
fala.
As
riquezas
de
informações
sociolingüísticas das
comunidades
rurais
ainda
não
foram exploradas
pelos
estudos
dialectológicos.
Por
isso,
a
surpresa
de
alguns
confundindo a
pesquisa
dialectológica
em
comunidades
restritas –
propriedades
rurais
–
com
a
pesquisa
clássica
realizada
em
comunidades
mais
amplas.
Há
resultados
surpreendentes
entre
os
dois
tipos
de
pesquisa
como
se pôde
constatar
com
as líqüidas
que
fecham
sílaba:
a vibrante -r e
lateral
–l. No
nosso
meio
rural
e
entre
falantes
das
periferias
urbanas,
originários
do
meio
rural,
a líqüida
lateral
-l
não
se vocaliza
mas
recebe a paragoge de
um
-i
quando
fecha
a
sílaba
final
da
palavra:
mel>meli,
sol>soli,
mal>mali,
azul>azuli,
carnaval>carnavali.
Em
algumas
palavras
o -l-
medial,
travando
sílaba,
recebe,
também,
a epêntese de -i-
como
foi constatado
em
silvestre>silivestre,
dificuldade>dificulidade,
faculdade>faculidade,
etc.
Já
a líqüida vibrante
final
de
palavra
sofre a
síncope
nos
verbos,
mas
em
outra
classe
de
palavra
recebe
também
a paragoge de
um
-i:
ardor>ardori,
amor>amori,
calor>calori,
cor>cori,
dor>dori,
ar>ari.
Há
estudos
que
generalizam a
apócope
da vibrante -r e a
vocalização
da
lateral
-l>-u, o
que
não
é
comum,
por
exemplo,
no
nosso
meio
rural.
A
riqueza
lingüística
aparece
ainda
nos
neologismos
lexicais
como
mamifa;
nos
neologismos
conotativos (ou
semânticos)
que
são
numerosos
como
ave-maria,
catapora,
piruca, sapiroca,
sarna,
varicela,
varíola,
etc,
para
dizer
bouba
aviária.
O
falante
reflete o
seu
interior
na
fala.
Já
diziam os
latinos
“ex abundantia cordis os loquitur“ (a
boca
fala
do
que
está
cheio
o
coração).
Esse
reflexo
interior
de
cada
falante
levou G. Bertoni a
caracterizar
cada
fala
como
uma
língua
ao
dizer
“tante
sono
le lingue, insomma, quanti
sono
i parlanti“
(“tantas
são
as
línguas,
enfim,
quantos
são
os
falantes“).
O
dizer
de Bertoni revela o
que
há de
individual
em
cada
fala,
porque
cada
ser
humano
recorta a
vida
de
modo
muito
pessoal
porque
a
fala
reflete o
modo
de
sentir
a
vida.
O
sentimento
na
língua
é
pessoal
e
não
coletivo
ou
comunitário.
O
grupo
sente a
vida
mas
com
nuanças
individuais.
A
realização
da
língua
é
individual.
Conforme
o
tom
de
voz
do
locutor,
interpreta-se a
fala,
manifestação
da
estrutura
da
língua.
Isso
não
quer
dizer
que
há numa
língua
vários
idiomas.
As
divergências
refletem
exclusivamente
formas
diversas da
fala.
As
divergências
são
o
reflexo
pessoal
do
interior
de
cada
falante
do
agrupamento
humano
em
que
está inserido.
São
exteriorizações
através
do
instrumento
fundamental
e
comum
da
comunicação
do
agrupamento:
a
língua
internalizada
que
é “externalizada”
através
da
fala.
Um
povo
se caracteriza
pela
sua
língua,
mesmo
quando
ela
é
alienígena.
O
povo
a recebe na
sua
cultura,
mas
a transforma, adaptando-a a
seu
modo
de
sentir
a
vida,
modificando-a
tanto
na
sua
estrutura
física,
o
significante,
quanto
na
idéia,
o
significado.
Aliás,
em
toda
e
qualquer
língua,
o
objetivo
é
comunicar,
mas
comunicar
idéias.
As
estruturas
lingüísticas
são
meros
arcabouços
do
essencial:
as
idéias.
Mudam-se as
estruturas
mas
não
se mudam as
idéias.
Muitas
vezes
uma
estrutura
lexical
pode
adquirir
inúmeras
idéias
como
a
palavra
latina
“macula”
que
chegou
até
nós
com
vários
significados,
mantendo
um
mesmo
traço
semântico:
malha,
mancha,
mágoa,
mangra
além
da
forma
culta
do
significado
primitivo:
mácula
=
mancha.
Portanto,
para
conhecer
um
povo
é
necessário
conhecer
a
sua
língua
porque
ela
reflete todas as
experiências
históricas deste
povo,
todos
os
seus
aspectos
socioculturais,
toda
a
sua
vivência.
A
língua
é
um
fator
tão
forte
para
um
povo
que
levou Monteiro Lobato a
dizer:
“A
Pátria
é a
língua,
nada
mais”.
Gagné,
lingüista
francês,
assim
se expressou ao
falar
da
língua:
constitui a
língua
um
dos
fatores
da
existência
e da
definição
de uma
comunidade,
um
elemento
essencial
de
identificação
nacional”
e Humboldt,
lingüista
alemão,
arremata: “A
língua
não
é
um
simples
meio
de
comunicação,
mas
a
expressão
do
espírito
e
concepção
do
mundo
dos
sujeitos
falantes:
a
vida
em
sociedade
é
um
auxiliar
indispensável
de
seu
desenvolvimento,
mas
de
modo
nenhum
o
fim
para
que
se tende.
Ora,
toda
língua
falada
tem
suas
variantes
que
não
chegam a
constituir
uma
nova
língua.
São
variantes
provenientes das
diversidades
culturais
que
cada
agrupamento
humano
desenvolve.
São
tendências
regionais
grupais
que
refletem os recortes
que
cada
indivíduo
de uma
comunidade
faz do
ambiente
em
que
vive. Faraco explica
com
clareza
as
divergências
na
língua
ao
afirmar:
toda
e
qualquer
língua
é
um
conjunto
heterogêneo
de
variedades
e
cada
variedade
é o
resultado
das
peculiaridades
das
experiências
históricas e socioculturais do
grupo
que
a
usa:
como
ele
se constitui,
como
é
sua
posição
na
estrutura
socioeconômica,
como
ele
se organiza
socialmente,
quais
seus
valores
e
visão
de
mundo,
quais
suas
possibilidades de
acesso
à
escola,
aos
meios
de
informação,
e
assim
por
diante[6].
Toda
língua
é
um
conjunto
heterogêneo
de
variedades
porque,
como
diz
Charles
Bally, citado
por
Coseriu:
“As
línguas
mudam
sem
cessar
e
não
podem
funcionar
senão
mudando”. E
a
mudança
na
língua
é uma
conseqüência
impositiva e
imprescindível
para
que
possa “adaptar-se às
necessidades
expressivas dos
falantes,
e continua a
funcionar
como
língua
na
medida
em
que
se adapta”.
Há,
portanto,
não
só
uma
tendência
para
alterar
a
língua
mas
uma
necessidade
de alteração
para
adaptar-se ao
falante
e,
conseqüentemente,
à
comunidade
lingüística
em
que
está inserido. Esta
adaptação
é
comum
a todas as
falas
de
qualquer
povo
ou
cultura
porque
evolução
e
mudança
são
características
de
todos
os
povos.
As
diferenças
de
fala
não
são
erros
de
língua,
mas
características
peculiares
e necessárias à
fala
porque
refletem o
ambiente
cultural do
agrupamento
a
que
pertence.
Outra
diferença
no
processo
da
comunicação
falada
surge
entre
linguagem
e
fala
e Coseriu
faz uma
profícua
consideração
em
sua
obra
“O
homem
e
sua
linguagem”
sobre
este
assunto
ao
falar
no
desenvolvimento
da
dicotomia
língua
e
linguagem:
A
linguagem
é
também
instrumento
da
vida
prática,
mas
esta é
apenas
uma das possibilidades secundárias e derivadas.
Por
outro
lado,
é,
sem
dúvida,
muito
correto
que
também
para
a
vida
prática
se considere recomendável
um
uso
lingüístico
claro
e
preciso...
...de
fato,
o
engano,
a
mentira,
a
aleivosia
podem
ser
expressos
tão
bem
(se
não
melhor)
mediante
um
uso
preciso
da
linguagem
como
por
um
impreciso.
E, de
qualquer
maneira,
é
preciso
distinguir
também
a
esse
respeito
entre
linguagem
e
falar
(ou
uso
da
linguagem).
O
falar
pode
ser
verdadeiro
ou
falso,
preciso
ou
impreciso,
claro
ou
obscuro;
pode
ser
mentira
ou
engano,
mero
palavreado
ou
falatório
vazio;
mas
a
linguagem
não
pode
ser
nada
disso. As
línguas
não
são
sistemas
de designação, e
sim
sistemas
de significação.
Coseriu
mostra,
ainda,
o
valor
da
língua
e da
linguagem
para
o
ser
humano,
não
só
como
indivíduo
como
também
membro
de uma
comunidade:
Chega-se à
compreensão
do
homem,
através
da
compreensão
da
linguagem,
enquanto
tarefa
de
nossa
época.
A
compreensão
do
homem
deve
começar
pela
compreensão
da
linguagem,
pois
o
humano
começa
precisamente
pela
linguagem.
A
linguagem
é,
certamente,
fundamental
para
a
compreensão
da
humanidade
do
homem;
mais
ainda:
é a
função
por
excelência
da
humanidade
(do “ser
homem”).
Para
o
mesmo
Coseriu, “a
linguagem
é a
abertura
de todas as possibilidades humanas,
não
em
função
desta
ou
daquela
atividade
humana
já
determinada
como
tal
e
não
como
outra”
.
Diríamos
que
a
linguagem
é a
projeção
dinâmica
do
homem.
As
colocações
de Coseriu servem de
fundamento
para
que
o
presente
trabalho
seja voltado
para
as
comunidades
rurais
que
vivem,
atualmente
tão
isoladas das
aglomerações
humanas,
como
se pôde
constatar
in
loco.
Passam-se
semanas
inteiras convivendo e falando
com
os
mesmos
membros
da
família
rural
que
atinge, de
um
modo
geral,
um
agrupamento
de
quatro
a
cinco
pessoas
–
marido,
esposa,
filhos
e
empregados.
Faltam-lhes
interação
e
comunicação
com
outras
pessoas
que
não
pertencem à
própria
família.
Há
um
conceito
distorcido de
que
toda
fala
que
foge aos
padrões
da
norma
está errada.
Ora,
são
há
erro
de
fala.
O
que
se afigura é
um
conjunto
de
variedades
de
linguagem
que
não
constituem uma
outra
língua
ou
dialeto
“stricto sensu”. No
entanto,
se o
conjunto
de
variedades
for
tão
acentuado
que
impeça a
comunicação
normal
com
falantes
de
comunidades
diferentes,
neste
caso,
constituir-se-á num
dialeto.
E
esse
dialeto
será uma
nova
língua
com
estruturas
próprias,
apesar
da
semelhança
que
possa aparentar-se
com
a
língua
da
qual
ele
é uma
variante.
Concluindo, a
criação
dos
Atlas
Lingüísticos
Municipais
Rurais
tem
seu
objeto
específico:
a
língua
rural
manifestada na
fala
dos
que
vivem
em
comunidades
pequenas
como
as
propriedades
e
Atlas
Municipais refletem,
por
amostragem,
a
fala
dessas
propriedades.
A
ciência
que
cuida do
estudo
das
falas
populares
e
suas
variantes
lingüísticas
é a Dialectologia.
Dialectologia e
Dialeto
A dialectologia é a
ciência
que
busca
a
investigação
científica
dos
dialetos
e das
falas,
pois,
“uma dialectologia
consciente...
deve exercitar-se
em
trabalhos
experimentais...”,
procurando
determinar
a
região
geográfica
em
que
ocorrem as
divergências
de
fala.
É o
estudo
de
Geografia
Lingüística
que
tem
por
objeto
o
estudo
científico
dos
falares
populares
que
irão constituir-se, no
futuro,
um
dialeto.
Há
dois
conceitos
para
dialeto:
um,
de
sentido
restrito (stricto sensu)
que
se refere a uma
fala
regional
e
que
apresenta
grandes
divergências
em
relação
à
língua
de
que
se origina,
não
só
perturbando,
mas
impedindo uma
comunicação
satisfatória;
outro,
de
sentido
amplo
(lato
sensu)
refere-se às
divergências
de
fala
existentes numa
região
as
quais,
no
entanto,
não
perturbam, acentuadamente, a
comunicação.
É
como
lato
sensu,
que
será tomado o
significado
de
dialeto:
são
diferenças
que
não
trazem
distúrbios
acentuados na
comunicação
com
estranhos
ao
meio.
A
divergência
será
mais
acentuada no
uso
de
vocábulos
que
poderão constituir-se
em
neologismos
ou
que
podem
sofrer
alteração no
seu
significado
ou
que
sofreram alterações
nos
seus
fonemas
de
tal
forma
que
se tornaram
incompreensíveis
ao
ouvinte.
Podem
ocorrer
ambas as alterações.
Dois
exemplos
da
microrregião
de
Viçosa
revelam
isso:
mal-de-ano é a
forma
dicionarizada de uma
doença
que
atinge o
gado
com
cerca
de
um
ano
de
idade,
levando-o à
morte
em
poucas
horas.
É uma
espécie
de
febre
que
leva
ao
colapso
cardíaco
da
criação.
Apesar
das inúmeras alterações
fonéticas
que
sofreu – mardiana, mangina, madiana, margiana –
não
mudou o
significado;
outro
exemplo
é
cochonilha
que
se tornou chinil;
já
a
bouba
aviária
tem
outros
significantes
como
piruca, sapiroca,
caroço
e
mais
outros
16
nomes,
como
foi mostrado
mais
acima.
As
doenças
recebem
vários
nomes
populares
baseados
na
analogia
e
semelhança
apresentadas.
Não
se pode
negar
que
há
um
bilingüismo
entre
a
linguagem
popular
e a
linguagem
geral
em
uma
mesma
comunidade.
Há de
um
lado,
a
língua
escrita,
a
língua
literária,
a
língua
geral
e
oficial
de uma
nação,
a
língua
pátria,
a
língua
nacional
regida pelas
normas
dos
falantes
cultos
e é fundamentada na
língua
em
que
cientistas
e
escritores
escrevem os
seus
artigos
e publicam
seus
livros.
É a
língua
do
saber
culto
com
seus
recursos
de
linguagem
e
léxico
bem
maiores
que
a
linguagem
restrita e
imediatista
da
fala
popular.
Privar
a
criança
e o
adolescente
desta
linguagem
culta
é privá-la do
conhecimento
e do
saber,
que
só
aparece na
escrita
ou
fala
culta.
É
assunto
que
voltará ao tratar-se da
dicotomia
linguagem
técnica
versus
linguagem
popular.
Dialectologia e
Geografia
Lingüística
Não
há uma
oposição
entre
Geografia
Lingüística
e Dialectologia. Ambas constituem
modalidades
de
estudo
que
são
objeto
comum
dos
dialetos.
A
diferença
está no
modo
de
apresentar
o
estudo
do
dialeto,
pois,
a “dialectologia é a
investigação
científica
da
linguagem
humana”;
“a
geografia
lingüística
é o
estudo
cartográfico dos
dialetos,
porque
são
os
dialetos
(no
sentido
mais
lato)
e
não
a
língua
comum
falada
ou
escrita
que
constituem o
objeto
deste
método
lingüístico
“.
Cabe à
dialectologia
fazer
o
levantamento
em
glossários
dos
fatos
dialetais;
e cabe à
geografia
lingüística
usar
o
método
cartográfico
para
fazer
a
projeção
desses
fatos
em
mapas,
levando ao
aparecimento
de
um
elemento
novo
nos
estudos
dialetais:
os
Atlas
Lingüísticos
ou
Cartas
Lingüísticas.
A
Geografia
Lingüística
irá,
portanto,
apresentar,
em
Atlas,
o
levantamento
cartográfico das
características
dialetais
tiradas
dos
diversos
tipos
de
Mapas
(Cartas)
Lingüísticos.A
Dialectologia irá
mostrar,
em
seus
estudos,
além
dos
Glossários
a
análise
das
variantes
da
língua,
como
as
variantes
fonéticas,
fonológicas, sintáticas,
lexicais,
semânticas...
Os
dois
estudos
não
se excluem
mas
se completam.
A Dialectologia
usa
dos
métodos
da
Geografia
Lingüística
no
levantamento
dos
dados
dos
falares
regionais
para
que
possa
estudar
e
delimitar
os
dialetos.
E,
para
Navarro, a
Geografia
Lingüística,“ocupa-se
especialmente
em
descobrir
e
traçar
as
áreas
e
limites
dos
fenômenos
dialetais”.
Para
Carreter a
geografia
lingüística
é
um
método
de
investigação
lingüística
que
consiste
em
situar
sobre
o
mapa
da
região
estudada
cada
uma das
formas
com
que
se
expressa
um
conceito
ou
uma
expressão
especial.
Para
cada
noção
ou
expressão
emprega-se
um
mapa
distinto.
O
conjunto
de
mapas
constitui
um
atlas
lingüístico[14].
A
explanação
de Carreter
mostra
o
comportamento
do
pesquisador
que
deve
preparar
um
mapa
lingüístico
para
cada
conceito
ou
expressão
especial
ou
divergente,
melhor
dizendo,
para
cada
fenômeno,
para
cada
alteração,
para
cada
nuança,
um
mapa
específico,
delimitando a
área
em
que
ocorre o
fenômeno.
Portanto,
a Dialectologia “é a
investigação
científica
dos
dialetos”
e a
Geografia
Lingüística
“é
um
novo
processo
de
estudar
a
linguagem
humana”.
A
finalidade
é
estudar
a
fala
popular
existente nas várias
camadas
sociais
tanto
rurais
como
urbanas. O
estudo
é
feito
através
do mapeamento cartográfico da
fala
popular
com
suas
características
peculiares,
buscando
conhecer,
o
melhor
possível,
as
variedades
na
fala:
a
pronúncia,
o
vocabulário,
as
características
gramaticais,
semânticas,
morfológicas,
fonéticas,
etc.
Mais
uma
vez,
aparecem as
peculiaridades
da
fala
popular
ou
culta
que
irão
constituir
o
objetivo
do
trabalho
da
Geografia
Lingüística
e dos
Atlas
Lingüísticos.
A
seguir,
serão
apresentados os
vários
tipos
de
atlas
lingüísticos
reveladores das
características
etnossocioculturais de uma
determinada
região.
É
um
enriquecimento cultural
muito
grande
porque
revelam as
tendências
lingüísticas
de
cada
município,
de
cada
região.
Revelam as
tendências
culturais de
cada
comunidade
com
todas as
suas
características.
Atlas
Lingüísticos
Qualquer
Atlas
Lingüístico
é o
resultado
de uma
complexa
metodologia
de
trabalho
na
busca
das diversas
falas
e das
diversidades
culturais
que
delineiam o
perfil
de uma
comunidade,
o
perfil
de uma
língua
que
é a
projeção
do
meio
comunitário.
As
variedades
regionais
da
fala
são
formas
dialetais
conhecidas
através
das
pesquisas
com
o mapeamento
lingüístico
das
regiões
com
a
elaboração
dos
Mapas
Lingüísticos
ou
Cartas
Lingüísticas.
O
Atlas
Lingüístico
revela e determina as
localidades
onde
ocorrem as
características
regionais.
Cada
Atlas
Lingüístico
será a
reunião
das várias
espécies
de
Cartas
Lingüísticas
que
receberão
denominações
diferentes
de
acordo
com
o
assunto
pesquisado. O
leque
de
estudos
é
vasto
como
se verá a
seguir.
Tipos
de
atlas
(ou
cartas)
lingüísticos
Os
tipos
de
Cartas
Lingüísticas
mostram a
variedade
de
estudos
que
a
pesquisa
lingüística
etnossociocultural pode
contribuir
no
conhecimento
do
povo
ou
de
um
grupo
comuninatário.
Os
vários
enfoques
levam a
vários
tipos
de
Cartas
Lingüísticas
como:
a)
Cartas
Fonéticas:
representam
as
diferentes
pronúncias
de
um
mesmo
fonema
na
região
pesquisada.
b)
Cartas
Fonológicas:
representam as
características
pertinentes
dos
fonemas
as
quais
levam à
modificação
regional
do
significado
de uma
palavra.
c)
Cartas
Morfológicas:
representam modificações
regionais
na
estrutura
interna
da
palavra:
morfemas,
derivações,
flexões.
d)
Cartas
Lexicais:
representam
as
diferentes
palavras
usadas num
dado
território
para
expressar
o
mesmo
conceito
ou
expressão.
e)
Cartas
Sintáticas:
representam as
diferenças
na
organização
de
estrutura
de
sentenças,
num
determinado
território.
f)
Cartas
Semânticas:
representam as mudanças de
significado
das
palavras
num
dado
território.
g)
Cartas
Folclóricas:
representam as
variantes
de uma
cultura
folclórica
comum
a várias
regiões.
h)
Cartas
Lingüístico-etnográficas:
ocorrem
quando
as
indicações
lingüísticas
se agregam às
indicações
etnográficas (traços
antropológicos,
objetos
de
cultura
material)
com
desenhos,
esboços
adicionais
e
fotográficos.
A
esses
tipos
de
Cartas
Lingüísticas
podem-se
acrescentar
outros
dois:
i)
Cartas
Neológicas
Lexicais:
representam
a
criação
lingüística
de
novas
palavras
para
exprimir
coisas
novas
ou
não.
j)
Cartas
Neológicas Conotativas:
representam os
verbetes
que
adquiriram
nova
conotação
não
registrada
em
nenhum
dicionário.
É
grande
a
tendência
de
dar
novas
conotações
às
palavras
fato
muito
comum
no
meio
rural
como
foi constatado
pela
pesquisa.
Na
análise
dos
dados
será focalizada esta
característica,
apresentando a
possível
causa
da
criação
lingüística.
São
raros
os
verbetes
que
representam os
neologismos
lexicais.
ESTUDOS
DIALECTOLÓGICOS NO BRASIL
Os
estudos
dialectológicos têm tido
um
grande
desenvolvimento
em
todo
o
mundo.
Em
todas as
nações
cultas, o
estudo
dos
vários
falares
é
comum
entre
os
estudiosos
da
linguagem.
No Brasil, a
partir
de 1952, a dialectologia tomou
caráter
oficial.
Carlota
Ferreira
diz:
... manifesta-se a
intenção
de elaborar-se o
atlas
lingüístico
do Brasil
que
toma
forma
de
lei
através
do
Decreto
30.643, de 20 de
março
de 1952,
cujo
Art. 3º
como
principal
finalidade
da
Comissão
de
Filologia
da
Casa
de Rui Barbosa a ‘elaboração
do
atlas
lingüístico
do Brasil‘.
Tal
determinação
foi regulamentada
pela
Portaria
nº 536, de 16 de
maio
de 1952,
que,
ao
baixar
instruções
referentes
à
execução
do
decreto
de
criação
do
Centro
de
Pesquisa
Casa
de Rui Barbosa, estabeleceu
como
finalidade
principal,
entre
as
pesquisas
a serem planejadas, a
própria
elaboração
do
atlas
lingüístico
do Brasil.
A
geografia
lingüística
utiliza-se das
cartas
lingüísticas
para
elaborar
os
glossários
lexicais,
fazer
o
levantamento
fonético
das
falas,
buscar
a
sua
estrutura
morfológica e
sintática,
o
estudo
semântico
e neológico e
fazer
o
levantamento
etnográfico da
região.
Pode-se
dizer
que
cabe à dialectologia
fazer
o
levantamento,
em
glossários,
dos
fatos
dialetais;
a
geografia
lingüística
faz
uso
do
método
cartográfico
para
fazer
a
projeção
desses
fatos
em
mapas
(ou
cartas)
lingüísticos
levando ao
aparecimento
de
um
elemento
novo
nos
estudos
dialetais:
os
Atlas
Lingüísticos.
A
projeção
dos
fatos
da
linguagem
gera os
atlas
lingüísticos,
originados da
geografia
lingüística.
Os
atlas
mostram as
tendências
entre
os
falares
peculiares
de uma
mesma
língua
em
comunidades
diversas.
Os mapeamentos
lingüísticos
são,
pois,
de
importância
fundamental,
especialmente
para
a
elaboração
dos
léxicos
e
organização
dos
glossários
específicos.
O
levantamento
cartográfico é,
conseqüentemente,
o
retrato
do
que
ocorre na
linguagem
da
fala
diária
das várias
comunidades.
Para
um
avanço
dos
estudos
dialectológicos, é
necessário
o
avanço
dos
trabalhos
de
pesquisa
para
que
se possa
ter,
o
mais
rápido
possível,
o mapeamento das
falas
das
comunidades
brasileiras.
Esta
pesquisa
focaliza a
fala
rural
que
se desenvolve
em
propriedades
rurais
e
não
em
aglomerados
urbanos
conforme
prescreve a
pesquisa
dialectológica
clássica,
como
foi
exposto
mais
acima.
O
objetivo
de
dar
ao Brasil o
seu
atlas
lingüístico
torna-se
realidade
em
fins
de 1996, no
Seminário
Caminhos
e
Perspectivas
para
a Geoligüística no Brasil,
realizado
em
Salvador,
na
Universidade
Federal
da Bahia.
De 4 a 8 de
novembro,
foi
criado
o
Comitê
Nacional
do
Projeto
ALiB.
Neste
Seminário
foi elaborado o
Projeto
Atlas
Lingüístico
do Brasil e
preparados
os
Questionários
para
o
início
da
pesquisa
dialectológica.
O
projeto
tem,
como
“enfoque
prioritário,
a
identificação
nas
diferenças
diatópicas (fônicas, léxico-semânticas e prosódicas).
A
rede
de
pontos
a
ser
pesquisada no
país
atinge 235
localidades,
distribuídas
por
todo
o
território
nacional,
estando
previstos
outros
15
pontos
a serem
definidos
oportunamente.
É
provável
que
dentre
poucos
anos
o Brasil terá o
seu
Atlas
Lingüístico,
desejo
de
muitos
desde
os
anos
50
que
teve
como
pioneiro
e idealizador o
mestre
Antenor
Nascentes
que,
por
primeiro,
dividiu o Brasil
em
regiões
e determinou os
pontos
a serem pesquisados e
até
hoje
respeitados.
O
Comitê
Nacional
do
Projeto
Atlas
Lingüístico
do Brasil está
assim
constituído:
Suzana Alice Marcelino da
Silva Cardoso
– Diretora
Presidente
Jacyra Andrade
Mota
– Diretora
Executiva
Maria do
Socorro
Silva de Aragão
– Diretora
Científica
Mário Roberto Lobuglio Zágari
–
Diretor
Científico
Vanderci de Andrade Aguilera
– Diretora
Científica
Walter Koch
–
Diretor
Científico.
LINGUAGEM
POPULAR
VERSUS LINGUAGEM
TÉCNICA
Se
toda
língua
apresenta
falares
diferentes
que
refletem as
tendências
de
cada
aglomeração
humana,
é
necessário
que
em
certas
atividades
haja uma
aproximação
entre
os
falares
populares
e a
linguagem
apreendida e aprendida nas
escolas.
Esta é a
língua
oficial,
é a
língua
da
ciência,
é a
língua
da
cultura,
é a
norma
culta.
Não
se pode
abandonar
uma
em
detrimento
da
outra.
É
necessário
que,
entre
as duas
línguas,
entre
as duas
linguagens
haja uma
aproximação
maior
para
que
não
haja
distúrbios
na
comunicação.
Araújo,
em
sua
tese
de
doutorado,
apresenta
dois
fatos,
ocorrido
com
alunos
das
ciências
agrárias e
com
recém-formados
em
medicina:
Anos
atrás,
perguntávamos a
alguns
ex-alunos,
médicos
recém-formados
porque
não
iam
para
o
interior
deixando as
benesses
das
cidades
grandes,
a
fim
de
levar
ao
povo
do
interior
o
seu
saber”.
Em
resposta
a
esses
ex-alunos, argumentando
sobre
“o
homem
do
campo
tostado
pelo
sol,
puxando o
cabo
de uma
enxada,
sujeito
ás
intempéries”,
havia contribuído
para
que
se formassem
em
medicina
pouco
adiantou. Foi mostrado a
eles
que
a
medicina
era
rareada no
interior
e
que
mais
da
metade
dos
municípios
de
Minas
não
tinha
um
médico
sequer
para
ajudar
na
cura
de
seus
males
quase
sempre
endêmicos.
Apesar
da
argumentação
a
resposta
de
cada
um
foi
sempre
a
mesma:
“–Como
ir
para
o
interior,
se, chegando
lá,
aparece
um
paciente
dizendo: ‘–Dotô, istô
com
nór na
tripa
virado
pru
lado
isquerdo do istamo e tô percisano dumremédio pruquê num tô güentano trabaiá.’ –Que
remédio
vou
receitar
para
um
paciente
como
este?
Se pergunto o
que
esteja sentindo, vem
ele
com
sua
conversa
toda
esquisita,
com
uns
nomes
todos
atrapalhados e
incompreensíveis
e
eu
fico
sem
saber
o
que
receitar.
Já
pensou a
minha
situação
de
médico
perante
aquele
paciente
e aquela
comunidade?
Como
fica a
minha
reputação
ouvindo: ‘O dotori num sabe
nada.
Num é dotori
coisa
ninhuma. Num sabe
nem
curá
um
nór nas
tripa’.
O de
melhor
que
pode
acontecer
é a
gente
cair
no
ridículo
e no
descrédito
total
por
não
saber
curar
um
mal
de
tripa
virada”
Um
outro
fato,
relatado
por
alunos
estagiários de
ciências
agrárias da UFV, ocorreu
durante
uma
série
de
palestras
proferidas
para
proprietários
e
administradores
rurais
do
Mato
Grosso
ou
Goiás. Usaram retroprojetores, eslaides,
transparências,
etc.
Após
horas
de
exposição
e
orientação,
um
dos
proprietários
chegou
até
a
grupo
de
expositores
e disse: “É, dotori, vanceis falaro bunito memo,
mais
nóis num intendeu
nada.
Tale e tale duença cumé
que
a
gente
cura.
E tale e tale
praga,
cumé
que
a
gente
acaba
com
elas.
Após
a
exposição
do
proprietário,
ficaram olhando
um
para
o
outro
sem
entender
nada
do
nome
das
doenças.
Eram
nomes
populares.
Programaram uma
ida
até
a
propriedade
onde
constataram
que
as
pragas
e
doenças
tinham sido
assuntos
de
palestras.
A
decepção
dos
jovens
estagiários foi
grande.
Aprenderam uma
linguagem
que
não
era
a
linguagem
do
campo!
A
justificativa
mais
forte
para
buscar
no
campo
os
nomes
de
doenças
no
meio
rural
apareceu
durante
a
pesquisa
na
Microrregião
de
Viçosa
no
município
de
Rio
Espera
com
o informante 124. Relatou o informante o
fato,
transcrito da
tese
de
doutorado
de ARAÚJO, op. cit., pág. 7.
Contou-nos (ele)
o
fato
que
segue e
que
está gravado
em
fita
cassete.
A
sua
principal
atividade,
disse
ele,
era
a recria de
novilha
que
eram vendidas
após
a
primeira
cria.
Aconteceu
que,
na
fazenda
que
comprara a
cerca
de
um
ano,
estavam morrendo muitas novilhas.
Já
havia perdido,
em
pouco
mais
de
três
meses,
mais
de 20,
prenhes
e próximas da
primeira
cria.
Estavam na
invernada,
longe
da
sede
da
fazenda.
Sabia-se da
morte
pela
revoada,
em
círculo,
dos
urubus,
o
que
indicava
criação
morta.
Depois
de tantas
perdas
resolveu
dar
uma
batida
com
seus
em
pregados
para
descobrir
se
era
alguma “erva”
que
estava matando
suas
novilhas.
Feita
a
batida,
não
encontrou nenhuma
planta
venosa
conhecida,
no
trecho
da
batida.
Resolveu,
então,
fazer
um
trabalho
mais
acurado, entregando a
cada
empregado
saquinhos de
plástico
para
colocarem neles a
amostra
de
qualquer
planta
que
pudesse
ser
erva”.
Colheram
mais
de vinte
tipos
de
plantas
e enviaram à
Universidade
Federal
de
Viçosa
para
exame.
Cerca
de trinta
dias
depois,
a
Universidade
enviava a
ele
um
relatório
dizendo
que
algumas
plantas
eram tóxicas.
Junto
veio
uma
lista
com
o
nome
de
mais
de cinqüenta
espécies
de
ervas
tóxicas, acompanhadas de
orientação
de
como
tratar
animais
“ervados” e
que
remédio
aplicar
a
cada
tipo
de
erva
para
salvar
a
criação.
Apesar
da
atenção
da
Universidade,
arrematou o informante: ‘–Foi
tudo
feito
direitinho
mas
não
adiantou
nada
não
porque
nóis
não
intendeu
aqueles
nome
difícil
da
lista
e nela
não
tinha
nem
o
nome
de favinha, de erva-de-rato,
nem
de cafezinho-do-mato,
mais
comum
entre
nóis.
Era
uns
nome
isquisito e
não
adiantou
nada.
Nóis num entendeu
nada
e o
jeito
foi
mudar
as bizerra de
pasto
e arrancá
tudo
que
fosse
mato
suspeito...
Esses
três
fatos
mostram
que
muitos
cursos
superiores
desconhecem
ou
não
interessam
conhecer
que,
ao
lado
da
linguagem
técnico-científica
que
aprendem, existe a
linguagem
popular,
não
aprendida
entre
as
paredes
de uma
escola.
É
necessário
que
a
linguagem
científica
ou
técnica
se aproxime da
popular
afim
de
que
a
ciência
seja
útil,
neste
caso,
ao
meio
rural.
Quantos
jovens
se formam
em
ciências
agrárias e
não
exercem
sua
profissão
porque
a
linguagem
que
sabem
não
é
conhecida
pelo
público
a
que
é destinada. Tornam-se
vendedores
ambulantes
dos
produtos
agrícolas
dos
laboratórios.
Poder-se-ia
perguntar
o
porquê
dessa
disparidade.
E a
resposta
seria
porque
os
dois
tipos
de
fala
constituem
linguagens
diferentes
com
termos
e
expressões
próprios.
A
linguagem
técnica,
pode-se
dizer,
é
geral
e
até
mesmo
universal.
Já
a
linguagem
popular
é
própria
e
característica
de
comunidades
lingüísticas
menores.
A
maior
e
menor
compreensão
está
ligada
mais
na
dificuldade
de
saber
o
significado
de
certas
palavras
que
na
estrutura
frasal.
Esta assimila-se
com
facilidade,
mas
saber
o
que
significa
tal
ou
qual
palavra
do
léxico
é
necessário
consultar,
perguntar
o
que
quer
dizer
esta
ou
aquela
palavra.
Quais
as
causas
das
dificuldades
de
compreensão
entre
as duas
linguagem
que
tratam do
mesmo
assunto?
Ora,
sendo a
linguagem
popular
de uma
comunidade
o
reflexo
natural
da
cultura
do
meio
em
que
se vive,
ela
cria
sua
“terminologia”
através
da
sua
experiência
e da
sua
vivência
no
dia-a-dia.
Muitas
vezes
faz
analogia
com
o
mundo
que
a
cerca.
Deste
modo
as
doenças
de
criações
e
culturas
agrícolas
receberão
nomes
dados
pela
cultura
do
próprio
meio.
Por
outro
lado,
a
linguagem
técnica
é aprendida na
escola,
desde
o
ensino
fundamental
ao
superior.
Ela
está
totalmente
voltada
para
o
campo
nos
cursos
de
ciências
agrárias,
mas
aprendendo uma
nomenclatura
científica
com
um
vocabulário
bem
diverso
daquele
que
usa
o
meio
rural.
No
entanto,
é no
meio
rural
que
o
técnico
vai
atuar
direta
ou
indiretamente,
usando a
linguagem
técnico-científica
que
aprendeu na
escola
mas
incompreensível
para
o
homem
que
nele vive, muitas
vezes
sem
uma
instrução
primária
completa.
Isso
torna
impossível
a
compreensão
mútua
entre
as duas
linguagens,
gerando a
necessidade
de uma
aproximação
entre
os
dois
interlocutores:
o
homem
do
campo
e o
técnico
agrário.
Essa
situação
poderá
ser
amenizada se o
técnico
agrário
conhecer
ou
procurar
conhecer,
pelo
menos
o
léxico
das
doenças
encontradas no
campo.
Se
ocorrer
isto,
o
produtor
rural
poderá
usufruir
com
grande
proveito
a
orientação
que
o
técnico
agrícola
lhe
transmitir
de
modo
direto,
quando
pessoalmente
pode
dirimir
as
dúvidas
de
compreensão,
ou
de
modo
indireto,
pela
palavra
falada
ou
escrita
quer
por
rádio
quer
por
meios
dos inúmeros
programas
rurais
das
televisões
que
falam uma
linguagem
pouco
entendível
ou
assimilada
pelo
telespectador
ou
ouvinte.
É
preciso
criar
um
meio
que
possibilite
esclarecer
o
que
se
fala
nos
programas.
Há uma
dicotomia
de
linguagens.
Uma de
uso
popular
e
regional,
de
uso
constante
e
cheia
de
matizes,
utilizada
pelo
homem
do
campo
no
dia-a-dia
para
externar
os
sentimentos
de
alegria
ou
tristeza,
de
sucesso
ou
derrota.
Outra
é aquela
que
se aprende
nos
bancos
escolares,
com
suas
normas
e
regras,
com
seus
recursos
artísticos,
estilísticos e
literários,
com
a
amplidão
do
seu
vocabulário
que
traz
recursos
infindos
para
a
precisão
dos
termos
e da
expressão
ao
pensamento,
do
conhecimento
que
se adquire
nos
bancos
da
escola.
O
trabalho
diário
com
alunos
e o
contato
reiterado
com
pessoas
do
meio
rural
serão
o
caminho
para
sentir
a
necessidade
premente
de
aproximar
as duas
linguagens
de
uso
constante
mas
pertencentes a
universos
diferentes:
a
linguagem
popular
rural
e a
linguagem
técnico-científica. Esta
com
uma
nomenclatura
toda
especial,
primada
pelo
rigor
que
caracteriza a
ciência
e aquela
criada
ao
sabor
da
necessidade
pragmática
do
dia-a-dia
do
homem
do
campo,
onde
se dá o
NOME
às
COISAS
de
acordo
com
a
necessidade
do
momento:
aqui
um
nome,
ali
outro,
acolá
um
terceiro
para
exprimir
a
mesma
coisa.
Ora,
a
aproximação
das duas
linguagens
é uma
necessidade.
A
linguagem
técnico-científica deve achegar-se à
linguagem
popular
porque
ela
vem de
um
aprendizado
de
maior
escolaridade
e,
portanto,
de
mais
fácil
adaptação.
Para
atingir
essa
aproximação
buscou-se, na
pesquisa
em
propriedades
rurais,
o
nome
de
doenças
de
criações
e
culturas
agrícolas,
fornecidos
por
moradores do
meio
rural,
complementando a
iniciativa
com
o
vocabulário
popular
rural
e
suas
nuanças de
expressão.
Isso
seria
impossível
se as
pesquisa
se apegasse aos
ditames
da
pesquisa
clássica
que
se realiza nas
aglomerações
urbanas
bem
mais
amplas do
que
as
propriedades
rurais.
Seria
impossível
detectar
os
nomes
usados nessas
propriedades
através
dos
aglomerados
urbanos.
As
realidades
são
diferentes
porque
o
trabalho
de
cada
uma é
totalmente
diverso.
Este
trabalho,
iniciado
na
Microrregião
de
Viçosa,
está sendo expandido
para
a
toda
a
Zona
da
Mata
de
Minas
Gerais.
Já
foi realizada a
pesquisa
nas
microrregiões
de
Viçosa
e
Ubá.
Se houver
recursos
para
os deslocamentos e
remuneração
dos
pesquisadores,
será
levado
às outras
cinco
microrregiões:
Cataguases,
Ponte
Nova,
Muriaé, Manhuaçu e
Juiz
de
Fora.
Por
causa
da
aposentadoria
do
mentor
desta
pesquisa,
os
recursos
são
mais
difíceis
para
dar
continuidade ao
objetivo
proposto. Será despendido
todo
o
esforço
para
fazer
o
levantamento
da
fala
rural
e
elaborar
os
Atlas
Lingüísticos
Rurais
e
respectivos
Glossários
de
cada
Microrregião
para
finalmente
elaborar
o
Atlas
e
Glossário
da
Zona
da
Mata
de
Minas
Gerais.
Será uma
contribuição
da
pesquisa
à UFV, à FAPEMIG, aos
Governos
Estadual e
Federal
levar
aos
técnicos,
alunos
e
produtores
rurais
meios
para
um
melhor
entendimento
entre
o
desenvolvimento
técnico
do
meio
agrário
e o
trabalho
do
campo,
refletindo no
progresso
do
meio
rural
e,
conseqüentemente,
a melhoria de
condição
de
vida
do
povo
em
geral.
ATLAS
LINGÜÍSTICO
MUNICIPAL
RURAL DE
VIÇOSA
Para
a
elaboração
do
Atlas
do
município
de
Viçosa,
foi
feito
o
levantamento
de
dados
sobre
as
tendências
lingüísticas
em
16
propriedades,
escolhidas e demarcadas aleatoriamente
em
mapa
elaborado
pelo
DER de
Minas
Gerais.
O
levantamento
dos
dados
foi o
ponto
de
partida
para
elaborar
as
Cartas
Lingüísticas
que
demonstravam a
localização
geográfica
onde
ocorriam as
características
lingüísticas.
Essas
Cartas
forneceram os
dados
para
que
se pudesse
elaborar
o
Atlas
Lingüístico
Rural
de
Viçosa,
acompanhado
do
respectivo
Glossário
Rural
Geral
com
os
verbetes
da
fala
popular
e os das
doenças,
seguidos dos
verbetes
técnicos
e
vice-versa.
A
elaboração
do
glossário
tem
por
finalidade
estabelecer
um
paralelo
entre
as
linguagens
popular
e
técnica
tendo
como
base
o
Atlas
Lingüístico
Municipal
Rural
de
Viçosa.
O
trabalho
abrangerá todas as 7
Microrregiões
da
Zona
da
Mata.
Inicialmente
foi pesquisada a
Microrregião
de
Viçosa
com
seus
20
municípios.
No
município
de
Viçosa
foram selecionadas 18
propriedades
rurais
de
onde
foram tirados os
dados
dos informantes. Os
dados
levantados
serão
as
bases
do
Atlas
Municipal
Rural
de
Viçosa.
Após
o
término
dos
Atlas
Lingüísticos
Municipais
Rurais
das
Microrregiões,
será,
então,
elaborado o
Atlas
Lingüístico
Rural
da
Zona
da
Mata,
mais
amplo
e
com
o
Glossário
Geral
da
sete
microrregiões.
Metodologia
Aplicada
Nesta
pesquisa,
procurou-se
adaptar
as
normas
da
pesquisa
clássica
à
nova
realidade
do
contexto
– as
propriedades
rurais.
Para
isso
foram
criados
novos
tipos
de
questionários
e
fichas
como
a da
propriedade
rural
com
adaptação
das
fichas
tradicionais do informante e da
localidade,
o
número
de
perguntas.
Diferenças
Metodológicas
As
diferenças
entre
a
pesquisa
dialectológica
rural
e a
pesquisa
dialectológica
clássica
se notam
desde
a
limitação
dos
pontos
na
busca
das
informações.
A
pesquisa
clássica
estabelece
normas
para
a
escolha
do informante:
a)
Aglomerados
urbanos
com
700 a 3.000
habitantes.
b)
Idade
mínima
e
máxima.
c)
Nível
de
instrução:
analfabeto.
d)
Nativo
ou
morador
pelo
menos
por
um
certo
número
de
anos.
e)
Sem
prestação
de
serviço
militar.
f)
Não
pode
ter
morado
fora
do
município.
A
metodologia
teve
que
se
adaptar
a uma
nova
realidade,
pois
o
universo
do informante
era
uma
propriedade
rural.
Foram adaptadas algumas
orientações
da
pesquisa
clássica,
outras substituídas e
criados
novos
instrumentos,
observando as
seguintes
características:
Local
da
pesquisa:
propriedade
rural.
Informante: morador da
propriedade
rural.
Perfil
do informante:
pelos
primeiros
testes,
optou-se
pelo
proprietário
ou
seu
preposto,
porque
os
empregados
mal
sabiam
informar
sobre
a
atividade
específica
que
executavam
como
retireiro.
Origem
do informante:
não
levou
em
conta
a
origem
visto
que
muitos
eram
proprietários
originários
de outras
regiões;
Nível
de
instrução
do informante:
geralmente
com
2º
ano
primário
incompleto;
Nativo:
não
se preocupou
com
a
origem
do informante;
pois,
quando
informava, procurava-se
dar
a
conhecer
o
nome
da
doença
por
outros
nomes
e
qual
o
nome
da
região
em
que
morava;
Nome
da
plantação
ou
criação
era
dado
pelo
próprio
informante;
Nome
de
doença:
informante dava o
nome
e descrevia
como
se manifestava
.
Na
pesquisa
clássica
os
questionários
têm
dezenas
de
perguntas;
as
fichas
se prendem à do informante e da
localidade.
Para
o
meio
rural
foram elaborados os
seguintes
fichas
e
questionários.
(Em
anexo,
os
modelos
das
fichas
e
questionários).
Fichas:
Ficha
da
Localidade
(município).
Ficha
da
Propriedade
(criada
pela
pesquisa).
Ficha
do Informante.
Ficha
de
Descrição
da
Doença
(criada
pela
pesquisa).
Ficha
de
Descrição
das
Dificuldades
no
desenvolvimento
da
propriedade
(criada
pela
pesquisa).
Questionários:
Questionário
I:
Criação
de
quadrúpedes.
Questionário
II:
Criação
de
aves.
Questionário
III:
Cultura
agrícola.
ETAPAS
METODOLÓGICAS
O
desenvolvimento
metodológico obedeceu às
etapas
do
esquema:
INVENTÁRIO,
SISTEMATIZAÇÃO e
INTERPRETAÇÃO
dos
dados
da
amostragem
visando
especialmente
a
confecção
das
Cartas
Lexicais
e do
Atlas
Municipal e o
respectivo
Glossário
Popular-Técnico e Técnico-Popular e ao
levantamento
das
características
e
tendências
da
fala
rural.
Para
o
desenvolvimento
da
pesquisa
foram observadas as
seguintes
etapas
na
busca
dos
dados:
Inventário,
Sistematização e
Interpretação.
1. Delimitação do
campo
de
pesquisa7.
Visita
às
Propriedades
2.
Aquisição
do
mapa
oficial
do
município8.
Entrevista
com
informante e pré-
3.
Escolha
e
Demarcação,
no
mapa,
das
enchimento
da
Ficha
da Proprie-
propriedades
a serem pesquisadas. dade e
Ficha
do Informante
4.
Escolha
dos informantes9.
Anotação e
gravação
das
respostas
5.
Elaboração
das
fichas
aos
questionários
a-
Ficha
da
localidade10.
Transcrição
das anotações das
fichas
b-
Ficha
da
propriedade11..Transcrição
das
descrições
das do-
c-
Ficha
do informante e
questionários
enças e preenchimento das
fichas
d-
Ficha
da
descrição
das
doenças
de
descrição
das
doenças
6.
Elaboração
dos
questionários12.
Levantamento
dos
dados:
nomes
a-
Questionário
I–CRIAÇÃO
das
doenças
por
criação
e
cultura
b-
Questionário
II : -AVES
agrícola
e
propriedade.
c-Questionário III-CULTURA
AGRÍCOLA
Desenvolvimento
da
Pesquisa
Delimitação do
Campo
Em
03.05.90, o IBGE -
Fundação
Instituto
Brasileiro
de
Geografia
e
Estatística
– divulga
Portaria
da DRB –
Divisão
Regional
de
Estatística
–
com
nova
divisão
geopolítica
do
País
em
Macrorregiões
correspondentes
a
Unidades
da
Federação.
Cada
Macrorregião está dividida
em
Messorregiões, subdivididas
em
Microrregiões,
desmembradas
em
localidades
que
são
os
Municípios
com
seus
distritos
e
suas
propriedades.
1 –
Região
do Brasil:
Macrorregião 31:
Estado
de
Minas
Gerais:
12 Mesorregiões:
01 - Mesorregião do
Noroeste
de
Minas
02 - Mesorregião do
Norte
de
Minas
03 - Mesorregião do
Jequitinhonha
04 - Mesorregião do
Vale
do Mucuri
05 - Mesorregião do
Triângulo
Mineiro/Alto
Paranaíba
06 - Mesorregião
Central
Mineira
07 - Mesorregião Metropolitana
de
Belo
Horizonte
08 - Mesorregião do
Vale
do
Rio
Doce
09 - Mesorregião do
Oeste
de
Minas
10 - Mesorregião do
Sul/Sudeste
da
Mata
11 - Mesorregião de
Campo
das
Vertentes
12 - Mesorregião da
Zona
da
Mata
2 - Mesorregião 12 da
Zona da
Mata
7
Microrregiões
060 -
Microrregião
de
Ponte
Nova064
-
Microrregião
de
Ubá
061 -
Microrregião
de Manhuaçu 065 -
Microrregião
de
Juiz
de
Fora
062 -
Microrregião
de
Viçosa066
-
Microrregião
de Cataguases
063 -
Microrregião
de Muriaé
Foi
selecionada
a
Microrregião
062 de
Viçosa,
por
nela
estar
a
Universidade
Federal
de
Viçosa
com
seus
cursos
de
Ciências
Agrárias.
Outro
motivo
que
levou a
selecionar
a
Microrregião
de
Viçosa
foi a
facilidade
de
aproximação
com
os
professores
das várias
áreas
de
Ciências
Agrárias
para
a compatibilização das
descrições
populares
com
as técnico-científicas.
A
divisão
política
da
Microrregião
de
Viçosa
abrange 20
Municípios
ou
Localidades:
20
Municípios
da
Microrregião
de
Viçosa
0001 - 0210.0 -
Alto
Rio
Doce
0011 - 0210.1 - Paula
Cândido
0002 - 0250.6 -
Amparo
do
Serra0012
- 0210.6 -
Pedra
do
Anta
0003 - 0370.2 -
Araponga0013
- 0210.1 - Piranga
0004 - 0870.1 - Brás
Pires0014
- 0210.3 -
Porto
Firme
0005 - 1020.2 - Cajuri0015 -
0210.3 -
Presidente
Bernardes
0006 - 1170.5 - Canaã0016 -
0210.7 -
Rio
Espera
0007 - 1630.4 - Cipotânea0017
- 0210.5 - S. Miguel do
Anta
0008 - 1670.4 - Coimbra0018 -
0210.6 -
Senhora
de
Oliveira
0009 - 2400.5 - Ervália0019 -
0210.7 - Teixeiras
0010 - 3790.8 - Lamim0020
- 0210.3 –
Viçosa
A
Localidade
0020 - 0210.3 de
Viçosa
foi demarcada
para
o
início
da
pesquisa.
De
posse
do
Mapa
Rodoviário
do
Município
de
Viçosa,
elaborado
pelo
DER/MG, foram delimitadas as
Propriedades
Rurais
onde
foram realizadas as
pesquisas.
Propriedades
e
respectivos
proprietários:
153 –
Fazenda
Machado
ou
Boa
União
– Francisco de Castro Cardoso
154 –
Fazenda
Bom
Sucesso
– Antônio Manuel de Freitas
155 –
Fazenda
Pedra
Redonda
– Gabriel Alves de Freitas
156 –
Fazenda
Caratinga – José Guilherme da Silva
157 –
Fazenda
Santa
Teresa – Oscar
Milagres
Neto
158 –
Fazenda
Bela
Vista
– José Carlos
Milagres
159 –
Fazenda
Santiago – Francisco de Assis
Batista
160 –
Fazenda
Lustosa – Fernando Lustosa
160A –
Fazenda
São
Francisco – Vicente Fialho
160B –
Fazenda
Caramujo
– Antônio Camilo
160C –
Sítio
Vista
Alegre
– Luís
Reis
Arruda
160D –
Fazenda
Ipiúna – Antônio de Paula Lana
160E –
Fazenda
do
Leme
–
Hélio
Henrique
Fontes
160F –
Fazenda
dos
Nobres
– Ciro Lopes da Silva
160G –
Sítio
Leite
– Agostinho Teixeira da Silva
160H –
Fazenda
Arruda
– Bianca Romaiol Rodrigues