Confrontando a formosíssima Maria
e a
linda Inês

Maria Paula Lamas (Lisboa)

 

Ao confrontar os episódios da Formosíssima Maria e da linda Inês, patentes no III Canto d’Os Lusíadas, verificamos que, apesar de apresentarem certas identidades, os desfechos contrastantes das respectivas ações intensificam as diferenças entre as protagonistas.

A introdução do episódio da Formosíssima Maria é constituída pela estrofe 102. De imediato, Luís de Camões localiza a ação no espaço, tratando-se de um ambiente faustoso. D. Maria desloca-se a Portugal, aos paços reais, para solicitar auxílio ao pai, D. Afonso IV. O reino castelhano estava a sofrer uma poderosa invasão moura e D. Maria, que se encontra casada com Afonso XI de Castela, pretende a colaboração do rei português, combatendo ao lado do genro.[1] O poeta, para melhor realçar a tristeza desta personagem, apresenta o seu retrato psicológico em oposição com toda a sua beleza:

Entrava a fermosíssima Maria

Polos paternais paços sublimados,

Lindo o gesto, mas fora de alegria,

E seus olhos em lágrimas banhados.

Os cabelos angélicos trazia

Pelos ebúrneos ombros espalhados.

Diante do pai ledo, que a agasalha,

Estas palavras tais, chorando, espalha: / «(...).»

(Canto III, est. 102)

No respeitante à introdução do episódio de Inês de Castro, que se desenrola nas estrofes 118 e 119, também surge um aspecto contrastante. Trata-se precisamente do êxito alcançado na Batalha do Salado, em que os portugueses e os castelhanos uniram forças contra o inimigo comum, e o triste caso de Inês. O poeta dá, assim, mais ênfase ao trágico desenlace, responsabilizando unicamente o Amor, que impõe sacrifícios.[2] Alguns recursos estilísticos ajudam a expressar essa exclusividade, como a utilização do advérbio e a diácope do pronome pessoal tu:

Tu, tu, puro amor, com força crua,

Que os corações humanos tanto obriga,

Deste causa à molesta morte sua,

Como se fora pérfida inimiga.

Se dizem, fero Amor, que a sede tua

Nem com lágrimas tristes se mitiga,

É porque queres, áspero e tirano,

Tuas aras banhar em sangue humano.

(Canto III, est. 119)

Neste episódio, verifica-se que há uma predominância das vogais u e o, para exprimir crueldade, utilizadas relativamente a D. Afonso IV, e da vogal i, denotando fragilidade, remetendo para Inês de Castro. Este jogo de fonemas contribui para transmitir a indignidade do ato praticado contra uma dama indefesa:

Passada esta tão próspera vitória,

Tornado Afonso à Lusitana Terra,

A se lograr da paz com tanta glória

Quanta soube ganhar na dura guerra,

O caso triste e dino da memória,

Que do sepulcro os homens desenterra,

Aconteceu da mísera e mesquinha

Que despois de ser morta foi Rainha.

(Canto III, est. 118)

De seguida, surge o desenvolvimento da ação, que se prolonga da estrofe 120 à 132. De início, o poeta faz a caracterização de Inês, a quem qualifica de linda, e a quem trata por tu, aproximando-se, deste modo, mais desta personagem, com quem partilha da dor. Por seu turno, D. Maria também revela grande beleza, sendo adjetivada de formosíssima. No entanto, ao referir as ações da rainha de Castela, o poeta recorre à forma da terceira pessoa do singular, manifestando maior distância e, por conseguinte, menor envolvimento.

Luís de Camões vai denunciar a grande paixão que une Inês ao príncipe herdeiro do trono. Apesar de todo o cenário envolvente estar coadunado com este amor, pelo sossego e beleza inerentes ao ambiente rústico dos campos do Mondego, vislumbra-se, desde logo, um mau presságio, através de pequenos indícios, tais como, o significado dos verbos utilizados. Por exemplo, na estrofe 121, o poeta vai terminar os seis primeiros versos, em tom gradativo, empregando verbos que remetem para as várias etapas do romance de Pedro e Inês (respondiam, moravam, traziam, apartavam, mentiam e voavam), verificando-se que as três primeiras ações manifestam a alegria de os dois amarem e serem correspondidos e as seguintes são um prenúncio de que essa felicidade é ilusória e fugaz:

Do teu Príncipe ali te respondiam

As lembranças que na alma lhe moravam,

Que sempre ante seus olhos te traziam,

Quando dos teus fermosos se apartavam;

De noite, em doces sonhos que mentiam,

De dia, em pensamentos que voavam;

E quanto, enfim, cuidava e quanto via

Eram tudo memórias de alegria.

(Canto III, est. 121)

D. Inês, por ser oriunda de influente família galega, oferecia perigo para a independência lusitana. O povo não aceita esta situação e, pressionando o rei, através dos seus conselheiros, alcança o seu objetivo de eliminar a apaixonada de Pedro. O príncipe estava viúvo de D. Constança e não pretendia casar-se outra vez. Este fato preocupava os portugueses, pois havia apenas um legítimo herdeiro da coroa, o que não garantia a sucessão. Em contrapartida, os filhos de D. Pedro e D. Inês poderiam constituir uma ameaça para Portugal, devido à ambição da poderosa família Castro.

Neste episódio, muitos recursos estilísticos ajudam a expressar variados sentimentos, desde o amor à saudade. A utilização de formas populares, como meninos, para mencionar os netos do rei e os adjetivos queridos e mimosos, expressando carinho, são alguns dos artifícios a que recorre o poeta, para manifestar piedade. À semelhança da Cassandra da Eneida, Camões apresenta Inês, de mãos atadas, e de olhos erguidos, em direção ao céu, como se estivesse a implorar auxílio divino. A palavra olhos é duplamente utilizada, para reforçar a idéia de que estes teriam de atuar mais convincentemente, de forma a compensar as mãos que estavam impossibilitadas de o fazer, por estarem presas:

Pera o céu cristalino alevantando,

Com lágrimas, os olhos piedosos

(Os olhos, porque as mãos lhe estava atando

Um dos duros ministros rigurosos);

E despois, nos mininos atentando,

Que tão queridos tinha e tão mimosos,

Cuja orfindade como mãe temia,

Pera o avô cruel assi dizia: / «(...).»

(Canto III, est 125)

 

Igualmente o recurso ao discurso direto vai transmitir maior emotividade, partilhando o leitor da situação angustiante. Luís de Camões narra as súplicas de D. Inês, perante o rei D. Afonso IV, suplicando-lhe que não a mate, principalmente tendo em atenção os filhos, netos do rei, que se encontravam presentes e que ficariam órfãos e desamparados. Para melhor realçar a desumanidade deste ato, D. Inês vai comparar o seu caso com as histórias de Semíramis e de Rômulo e Remo, que foram abandonados à sua triste sorte, mas sobreviveram porque foram alimentados por animais. De fato, D. Inês utiliza argumentos fortes, colocando alternativas à sua execução, como o desterro para muito longe, onde não voltaria a ver o príncipe e onde poderia educar os filhos, a quem designa por relíquias, para manifestar a preciosidade que representavam, por serem descendentes de D. Pedro. No entanto, de nada lhe serviram os seus rogos, pois Pêro Coelho, Álvaro Gonçalves e Diogo Lopes Pacheco insistiram com o rei, alertando-o para o risco da perda da independência. Por mandado de D. Afonso IV, Inês de Castro foi degolada em 7 de Janeiro de 1355, como consta do documento Chronicon Conimbrigense.[3] Devido à injustiça deste desenlace, o poeta compara Inês com Policena, que foi sacrificada por Pirro, sob imposição de seu pai, Aquiles:

Qual contra a linda moça Polycena,

Consolação extrema da mãe velha,

Porque a sombra de Aquiles a condena,

Co ferro o duro Pirro se aparelha;

Mas ela, os olhos, com que o ar serena

(Bem como paciente e mansa ovelha),

Na mísera mãe postos, que endoudece,

Ao duro sacrifício se oferece: / (...).

(Canto III, est. 131)

No respeitante ao desenvolvimento do episódio da Formosíssima Maria, que ocorre entre as estrofes 103 e 105, o poeta igualmente utiliza o estilo oratório, para transmitir maior impacto no leitor. D. Maria, para tentar convencer o rei a auxiliar Afonso XI de Castela, no combate ao mouro, travado na Batalha do Salado, apresenta-se a chorar, utilizando argumentos persuasivos. As hipérboles a que recorre D. Maria evidenciam a ferocidade do inimigo, contrastando com a sua fragilidade física e amplificando o teor da mensagem veiculada:

Quantos povos a terra produziu

De África toda, gente fera e estranha,

O grão Rei de Marrocos conduziu

Pera vir possuir a nobre Espanha.

Poder tamanho junto não se viu,

Despois que o salso mar a terra banha;

Trazem ferocidade e furor tanto,

Que a vivos medo, e a mortos faz espanto. / (...).

(Canto III, est. 103)

Outros recursos estilísticos ajudam a expressar a necessidade de atuação rápida, por parte de D. Afonso IV, como, por exemplo, as antíteses utilizadas para diferenciar e opor os dois povos, e o hipérbato, pois a inversão da ordem habitual das palavras desperta a atenção do receptor. D. Maria responsabiliza o pai pela sua sorte, enumerando, em tom gradativo, a privação dos seus bens, caso D. Afonso IV não se disponibilize a auxiliar o rei de Castela, pois havia a forte possibilidade de a rainha ficar «Sem marido, sem reino e sem ventura.». Através das apóstrofes dirigidas a D. Afonso IV, inicialmente, invocando-o como Rei, e posteriormente, chamando-lhe pai, D. Maria incentiva o soberano de Portugal, e apela simultaneamente ao seu sentimento paternal, fortalecendo o seu pedido. Na estrofe 105, um jogo hábil de palavras, repetições e sonorizações, com insistência no fonema o, e o emprego do imperativo transmitem um ritmo acelerado aos versos, denotando a necessidade de o rei se apressar, pois a sua demora poderia ser fatal:

(...) . / Portanto, ó Rei, de quem com puro medo

O corrente Muluca se congela,

Rompe toda a tardança, acude cedo

À miseranda gente de Castela.

Se esse gesto, que mostras claro e ledo,

De pai o verdadeiro amor assela,

Acude e corre, pai, que, se não corres,

Pode ser que não aches quem socorres.

(Canto III, est. 105)

Passando à conclusão dos episódios em análise, verificamos que, apesar de D. Afonso IV ter nas suas mãos a solução de ambos os casos, as respectivas decisões vão se opor, pois o rei vai ser adjuvante de D. Maria, combatendo ao lado de Afonso XI, e oponente a D. Inês, autorizando a sua execução. São decisões antagônicas tomadas pela mesma personagem, aparentando o rei uma dupla personalidade, pois, por um lado, manifesta humanidade, por outro, evidencia crueldade. No entanto, o que está em causa é o objetivo máximo de preservação da independência portuguesa. É essa preocupação que D. Afonso IV manifesta nas duas situações, pois, ao ajudar D. Maria, afasta o mouro da Península Ibérica, e, ao eliminar D. Inês, acautela a manutenção da nacionalidade lusitana.

Assim, na estrofe 105 do episódio da formosíssima Maria, D. Afonso IV prontifica-se a ajudá-la, de imediato, como impõem as circunstâncias, contribuindo para um desfecho feliz, pois os mouros foram completamente devastados. Luís de Camões compara a súplica de D. Maria com a de Vênus, na Eneida, quando esta deusa intercede pelo filho Enéias, junto do seu pai, Júpiter:

Não de outra sorte a tímida Maria

Falando está, que a triste Vénus, quando

A Júpiter, seu pai, favor pedia

Pera Eneias, seu filho, navegando;

Que a tanta piedade o comovia,

Que, caído das mãos o raio infando,

Tudo o clemente Padre lhe concede,

Pesando-lhe do pouco que lhe pede.

(Canto III, est. 106)

Por seu turno, a conclusão do episódio de Inês de Castro desenrola-se nas estrofes 133-135. O poeta inicia com uma apóstrofe ao Sol, que, segundo a sua opinião, devia ter manifestado a sua oposição, afastando os raios, tal como sucedeu no caso hediondo dos irmãos Atreu e Tiestes.[4] A natureza, que foi importante desde o início do episódio, vai surgir personificada, condoendo-se com a morte de Inês. Os côncavos vales, que testemunharam o trágico desfecho, vão ajudar a transmitir o efeito de eco, amplificando o tom, como uma chamada de atenção. A insistência nos sons nasais e a utilização do gerúndio sugerem um murmúrio prolongado, como uma lamentação pelo desenlace infeliz que se impõe perpetuar. Reflexo da grande mágoa, as lágrimas, metamorfoseadas em fonte, cujas águas correm continuamente, são denunciadoras de uma tristeza infinita:

As filhas do Mondego a morte escura

Longo tempo chorando memoraram,

E, por memória eterna, em fonte pura

As lágrimas choradas transformaram.

O nome lhe puseram, que inda dura,

Dos amores de Inês, que ali passaram.

Vede que fresca fonte rega as flores,

Que lágrimas são a água e o nome Amores.

(Canto III, est. 135)

No confronto sintético entre os dois episódios, verificamos que ambos têm a mesma estrutura, apresentando estrategicamente localizado, no desenvolvimento da ação, o discurso dirigido ao mesmo receptor, D. Afonso IV. As duas personagens femininas são caracterizadas fisicamente como detentoras de uma grande beleza, e, em contraste, emocionalmente, encontram-se amarguradas. No entanto, é de salientar o desfecho favorável a D. Maria, que se opõe ao desenlace relativo a D. Inês. Através destas duas figuras, o poeta apresenta as principais características da mulher, atendendo à respectiva época. Em D. Maria ressalta a mulher-esposa, e em D. Inês sobressai a mulher-mãe-mártir, completando-se as predominantes facetas femininas, através dos respectivos papéis desempenhados. Nos dois casos é relevante o espírito de sacrifício da mulher, a sua fragilidade física e o fato de depender inteiramente do homem, que decide sobre o seu destino.

Em ambos os episódios Camões utiliza uma linguagem rica em recursos estilísticos, em que se destacam os tempos e os modos verbais, como o imperativo, de acordo com a função apelativa; a linguagem metafórica e hiperbólica, para intensificar a ação; os jogos de palavras e de sonorizações, ao ritmo das sensações despertadas; a abundante adjetivação, usada, por vezes, em forma de antítese, e as comparações, salientando-se as que remetem para a Antiguidade, contribuindo para a elevação destes textos líricos.

Comparando os dois episódios com as respectivas fontes históricas, verificamos que a formosíssima Maria se aproxima mais da personagem que encarna do que Inês de Castro. O poeta segue os cronistas, quando refere a vinda de D. Maria a Portugal, para pedir auxílio ao pai, na Batalha do Salado.[5] No entanto, Camões apresenta D. Maria aparentando um casamento feliz, pois teme ficar viúva e triste e posta em vida escura e as crônicas narram as desavenças entre o casal real castelhano e os maus tratos de que a rainha era vítima.[6] No respeitante a D. Inês, o poeta também se baseia nas crônicas, quando apresenta o romance contrariado que conduziu à execução,[7] a influência da família Castro, as pressões dos conselheiros e a vingança de D. Pedro. No entanto, todo o episódio está impregnado de ficções próprias da imaginação poética. Na sua época, Inês era considerada uma mulher maldosa e ambiciosa, causadora da infelicidade do príncipe,[8] temendo-se, conseqüentemente, a sua ligação com o herdeiro da coroa portuguesa. Luís de Camões, tal como outros escritores, contribuiu para a transfiguração desta imagem, passando Inês a ser percepcionada como uma inolvidável mártir, protagonista de uma das mais belas e emocionantes histórias de Amor.

 

Confronto sinóptico entre os episódios
da Formosíssima Maria e de Inês de Castro

Formosíssima Maria

Inês de Castro

Contraste entre o retrato físico de D. Maria e o seu estado psicológico.

Contraste entre o êxito alcançado na Batalha do Salado e o caso triste de Inês.

Voluntariamente, D. Maria dirige-se a D. Afonso IV.

Involuntariamente, D. Inês enfrenta D. Afonso IV.

D. Maria informa o rei português sobre a forte invasão moura a Castela, solicitando-lhe auxílio.

D. Inês é informada da sua execução, suplicando clemência ao rei.

Tentando convencer o pai, D. Maria responsabiliza-o pelo seu destino, pois teme ficar viúva e sem reino.

Tentando sensibilizar D. Afonso IV, D. Inês realça a menoridade dos filhos, netos do rei, pois receava a sua orfandade.

Em D. Maria sobressai o papel de mulher-esposa.

Em D. Inês evidencia-se o papel de mulher-mãe-mártir.

D. Afonso IV decide logo colaborar com Afonso XI, combatendo o inimigo comum.

D. Afonso IV hesita, deixando ao critério dos conselheiros a sorte da donzela indefesa.

O rei revela-se corajoso e humano.

O rei manifesta-se oscilante e cruel.

A colaboração de D. Afonso IV proporciona um desenlace feliz.

A atuação de D. Afonso IV conduz a um desfecho infeliz.

AMOR FICTÍCIO: D. Maria e Afonso XI permanecem juntos, mas passionalmente distantes.

AMOR VERDADEIRO: o desaparecimento físico de Inês não extingue a paixão de Pedro.

 

BIBLIOGRAFIA

CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Org. por Emanuel Paulo Ramos. Porto: Porto, 2000.

FARIA, Maria do Céu Novais. Esquemas de lições sobre Os Lusíadas. In: Comissão Executiva do IV Centenário da Publicação de Os Lusíadas. Lisboa: Neogravura, 1972.

PINA, Ruy de, Chronica de Elrey Dom Afonso o Quarto. Lisboa: Bíblion, 1936.

SCHEREMETA, Antônia Ariete et alii. Comparação do drama de Inês de Castro em Camões e em Garrett. In: Publicação semestral para a divulgação da Cultura Portuguesa, vol. 1, nº 6, Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 1972.

TEYSSIER, Paul. Le mythe d’Inès de Castro – La Reine Morte. In VII Separata dos Arquivos do Centro Cultural Português, Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, 1974.

VASCONCELOS, António de. Inês de Castro. 2ª ed. Barcelos: Cia. Ed. do Minho, 1933.


 


 

[1] «A sua felicidade pessoal também está em causa (e ela é filha de Afonso IV). Assim: / 1. Quem está em perigo é o seu marido. / 2. Esse marido foi-lhe dado pelo pai dela (...). / 3. Maria ficará viúva e triste e posta em vida escura / sem marido, sem reino e sem ventura. (...). / 4. Novo recurso ao contraste: a) entre o pequeno poder do marido e a força e ferocidade dos mouros, representada pelo duro golpe da maura espada; b) entre essa escassez de recursos e a valentia, a força moral, de rei e cristão oferecido a esse duro golpe.» Maria do Céu Novais Faria, «Esquemas de lições sobre Os Lusíadas», in Comissão Executiva do IV Centenário da Publicação de Os Lusíadas, Lisboa: Neogravura, 1972, pp. 13-14.

[2] «Em Camões o amor é injusto, cruel, maldito e culpado de todo [o] sofrimento humano. Este sofrimento não se restringe somente ao campo moral e espiritual, mas também físico: / «tuas aras banhar em sangue humano». / O amor dá o tom permanente de dor, mas de dor cósmica; é o amor do AMOR, das antíteses, pela presença irremediável da morte. É um contínuo fatalismo; até parece que a salvação de todo o sofrimento humano está na morte.» Antônia Ariete Scheremeta, et al., «Comparação do drama de Inês de Castro em Camões e em Garrett», in Publicação semestral para a divulgação da Cultura Portuguesa, vol. 1, nº 6, Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 1972, pp. 29-30.

[3] O documento refere o seguinte: «Era m. ccc. nonagesima tertia vii. dies lanuarii decolata fuit Doña Enes per mandatum domini Regis Alfonsi iiij.» Cf. António de Vasconcelos, Inês de Castro, Barcelos: Companhia Editora do Minho, 2ª ed., 1933, p. 21.

[4] Atreu, para se vingar do seu irmão, Tiestes, que tivera uma ligação com sua mulher, simulou fazer as pazes, convidando-o para um banquete, no qual lhe serviu a carne dos filhos, por serem fruto da relação ilícita.

[5] «(...) se veyo loguo á Cidade de Evora, em Portugal onde elRey, & a Rainha Dona Beatriz seus Padre, & Madre, sabendo que vinha, a vieram esperar, & a receberam com muyta honra, & com sinais de grande amor, & loguo sem mais trespasso a Raynha com grande humildade, & muytas lagrimas, disse a elRey o fűdamento, esperança, & necessidade, com que vinha que era pedirlhe com grande efficacia que em sua pessoa, & com as gentes darmas, & Frotas, & tizouros de seus Reynos, quizesse em taõ evidente periguo hir ajudar elRey Dom Affonso seu marido, contra os Mouros imigos de Fee, & da Cruz, porque em sua ajuda, & esforço de sua real pessoa, elRey tinha tal confiança (...), de quem com graça de Deos esperava aver loguo certa, & dezejada victoria (...).» Ruy de Pina, Chronica de Elrey Dom Afonso o Quarto, Lisboa: Edições Bíblion, 1936, p. 152.

[6] «Indo jà em dous annos, que Dom Afonso de Castella hera cazado com a Rainha Dona Maria, & nam avēdo della geraçam, namorouse, & ouve em seu poder em Sevilha D. Leanor Nunes de Gusmaõ (...), & della ouve elRey por tempos muytos fllhos, & contra sua honra, & estado real, & conciencia, a teve sempre em todo estado, & acatamento de Rainha denegando tudo isto a Rainha Dona Maria sua molher, a quem tratava com grandes disfavores, & com muy poucas mostranças de verdadeyro amor (...).» Ibidem, p. 16.

[7] «(...) elRey (...) consentido na morte da dita Dona Ines acompanhado de muyta gente armada, & seveo a Coimbra onde ella estava nas cazas do Mosteyro de Santa Clara, a qual sendo avizada da hida de elRey, & da iroza, & mortal tenção que contra ella levava achandosse falteada pera se não poder ja saluar per alguma maneyra, o veo receber à porta, onde com o rostro trãsfigurado, & por escudo de sua vida, & pera sua innocencia achar na ira de elRey alguma mais piedade, trouxe ante si os tres innocentes Infantes seus filhos netos de elRey, com cuja apresentaçaõ, & com tantas lagrimas, & com palauras assi piadozas pedio misericordia, & perdaõ a elRey que elle vencido della se dis que se volvia, & aleyxava ja pera nõ morrer como levava de terminado, & alguns Cavaleyros que com elRey hiaõ pera a morte della que loguo entrarão, & principalmente Dioguo Lopes Pacheco (...) Alvaro Goncaluesmeirinho mor, & Pero Coelho quando assi viraõ sahir elRey (...), lhe fizeraõ dizer, & consentir que elles tornassem a matar Dona Ines se quizessem, a qual por isso loguo mataraõ (...).» Ibidem, p. 195-196.

[8] Cf. Paul Teyssier, «Le mythe d’Inès de Castro – La Reine Morte», in VII Separata dos Arquivos do Centro Cultural Português, Paris: Fundação Calouste Gulbenkian, 1974, pp. 569-570.

 

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