A AFETIVIDADE NO CONTEXTO DE ENSINO
DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS

Bruna Rafaele S. da Silva (PUC-Rio)

Este trabalho apresenta uma prática reflexiva sobre o processo de ensino e aprendizagem, do qual a pesquisadora foi objeto de análise dela mesma ao atuar como professora de Português Língua Estrangeira (PLE) e de Francês Língua Estrangeira (FLE).

Para facilitar a compreensão das anotações da mestranda sobre suas aulas e para que este trabalho não se estendesse muito, foi feito um resumo dos principais momentos das aulas e uma breve descrição sobre os alunos. Como a quantidade de anotações sobre as aulas foi grande, a mestranda buscou focalizar em um número pequeno de alunos.

É importante ressaltar que uma das prioridades desse trabalho é apontar uma reflexão sobre o ensino de LE e não se ater a citar teorias pelo simples fato delas servirem apenas como uma alavanca para as reflexões. Certamente, este trabalho apresenta pensamentos dos autores que ofereceram embasamento teórico sobre o assunto, mas dentro do contexto de prática reflexiva presente nesta pesquisa, eles não obtêm um lugar de destaque.

A reflexão apresentada é justificada pela oportunidade que a mestranda teve de refletir sobre a relevância de fatores envolvidos no processo de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras, o que lhe permitiu uma visão mais ampla de sua atuação como professora de LE e do contexto em torno do ensino de línguas estrangeiras.

Foi observado que além dos dados já coletados em pesquisa anterior (Mendes, 2005: 48), há outros fatores que influenciam a efetuação da correção de erros em aula de línguas estrangeiras. Dentro destes fatores, podemos incluir a inconsistência teórica do professor e, o elemento que recebe maior destaque neste trabalho, a afetividade situada no contexto onde ocorre o processo de ensino e aprendizagem.

O objetivo deste trabalho é relatar dados coletados através da prática reflexiva realizada pela mestranda, atuando como professora durante o primeiro semestre de 2005 somado a um arcabouço teórico sobre a prática do ensino de LE. Este trabalho não tem como objetivo descrever arduamente todo o conteúdo das aulas lecionadas, somente as particularidades de cada caso analisado. A mestranda tem como alvo o relato de casos bem distintos ocorridos com ela como professora de língua estrangeira, que geraram grandes reflexões a respeito do contexto das aulas de LE.

De acordo com Prabhu (1990: 161), partimos da visão de método como conjunto de atividades a serem realizadas em sala de aula.

A pesquisa não se ateve ao estudo de métodos de ensino de LE, uma vez que não se fez necessária uma comparação entre diferentes métodos porque a mestranda trabalha com base no Foco na Forma (Doughty, 1988: 15) e no Método Comunicativo (Larsen-Freeman, 2000: 121), pois erros que não interferem na comunicação não são objetos de estudo na composição deste trabalho.

É importante destacar que o Foco na Forma e o Método Comunicativo são métodos que se diferenciam quanto à sua visão do erro. O Método Comunicativo aborda o erro como algo que não interfere na comunicação e de acordo com o Foco na Forma, o erro pode interferir no processo comunicativo e deve ser corrigido quando gera incompreensão e sua correção pode incluir pontos gramaticais.

Atuando com professora, a mestranda opta por corrigir o erro em casos que não ocorre compreensão da mensagem do locutor e focaliza tópicos gramaticais somente quando percebe que o aluno ainda não tem conhecimentos a respeito da forma empregada.

Segundo Prabhu (1990: 162), a mestranda faz uma mescla entre métodos que na sua experiência como aluna e professora de LE ofereceram resultados positivo sendo que esta combinação apresenta doses distintas na aplicação com os alunos, pois cada aluno apresenta uma dificuldade diferente, o que necessita da observação de todo o contexto da aula.

É importante salientar que a professora muitas vezes opta por não respeitar a ordem das atividades apresentadas nos materiais didáticos e algumas são excluídas do plano de aula, além de haver a inserção de atividades, que segundo a professora oferecem maior resultado no ensino de LE. As atividades extras também são escolhidas num acordo entre a professora e as alunas.

Partindo do pressuposto de que “os seres humanos são criaturas emocionais” (Brown, 1994: 61), vemos a emoção como o centro do pensamento, do significado e da ação. Sendo assim, este trabalho observou fatores emocionais no processo de ensino e aprendizagem. De acordo com Brown, o campo afetivo pode incluir empatia, auto-estima, extroversão, inibição, imitação, ansiedade, mas não há definições exatas sobre os elementos em torno da afetividade.

Este trabalho busca apresentar a afetividade caracterizada em atitudes, que no ponto de vista da mestranda, recebem destaque, como a receptividade do professor como uma pessoa (Allwright, 1991: 160).

Em Focus on the Language Classroom, Allwright & Bailey (1991: 93) citam Brown (1987) e Vigil & Oller (1976) se reportando a pesquisas sobre fossilização, que apontam para a maneira como os aprendizes recebem o feedback na língua estrangeira. De acordo com Vigil & Oller (Allwright, 1991: 94), podemos receber dois tipos de feedback, o feedback cognitivo que corresponde à informação sobre a linguagem usada pelo aprendiz e o feedback afetivo definido como reações emocionais em resposta a elocuções produzidas, assim como sinais que indicam ao interlocutor que ele pode continuar sua produção na língua estrangeira. Segundo estes autores, o aprendiz recebe os dois tipos de feedback enquanto testa suas hipóteses na língua alvo.

Baseada nestas teorias apresentadas, a mestranda observou o andamento de suas aulas em torno da correção oral. Para a coleta de dados, a mestranda utilizou suas próprias anotações sobre o conteúdo das aulas atuando como professora.

A mestranda leciona Francês e Português com língua estrangeira geralmente através de aulas particulares, estando somente o aluno e a professora no ambiente da aula, exceto o caso de três amigas de trabalho (F2, F3 e F4) que estudaram francês juntas. As aulas foram realizadas na casa dos alunos, com exceção das aulas de PLE, ocorridas num curso no Rio de Janeiro.

Geralmente, o ambiente da aula apresenta uma mesa dividida entre a professora e o aluno, que se sentam lado a lado. A duração das aulas é de 2 horas semanais, sendo que há alunos que tem 4 horas por semana.

Na maioria das vezes, na primeira aula, a professora apresenta ao aluno a sua liberdade de escolha sobre o material didático a ser empregado, assim como as atividades que não fazem parte do material didático e podem ser escolhidas para compor a aula, como músicas e filmes.

O conteúdo das aulas é escolhido entre a professora e os alunos que chegam sempre a um acordo na escolha do material didático, as atividades e o horário das aulas. Há alunos que apresentam maior experiência em aulas de línguas estrangeiras em curso e preferem escolher o que fazer durante a aula, com o caso da aluna F1, como veremos a seguir. Há casos em que o aluno se sente inseguro para optar por um material didático e deixam a escolha por parte da professora.

A professora, na maioria das vezes tenta persuadir o aluno para não trabalhar somente com atividades de drill e de preenchimento de lacunas durante todo o período da aula, para que o aluno construa seu conhecimento na língua alvo de forma variada, o que na opinião da professora permite melhores resultados na produção na LE.

Para a composição dessa pesquisa, foram analisadas as anotações em diários de aula de Português Língua Estrangeira (PLE) e Francês Língua Estrangeira (FLE) da própria mestranda, em que foram relatadas observações de aula, como o conteúdo planejado e o ensinado, como foi recebido o conteúdo das aulas pelos alunos e como a professora tratou os temas das aulas. As anotações que compõe os dados foram escritas no período entre fevereiro e junho de 2005.

O relato das aulas é composto apenas pelo pensamento da mestranda sobre sua atuação em aula de LE, os alunos não foram atuantes no processo de composição dos diários.

O total de alunos que tiveram suas aulas anotadas para a efetuação da prática reflexiva é composto por uma aluna alemã de PLE, de 24 anos, e quatro brasileiras de FLE. A aluna F1 tem 49 anos, F2 tem 35, F3 tem 37 e F4 40. A mestranda tem 24 anos.

É importante destacar que este trabalho apresenta somente o relato das aulas que se distinguiram quanto à afetividade e, particularmente trabalhamos com uma aluna de PLE, uma aluna de FLE que tem aulas sozinha e três alunas de FLE que tinham aulas em grupo.

O primeiro Caso

A aluna F1 tem 49 anos, estuda francês há cerca de um ano e tem 4 horas semanais de aula. Quando começamos em 2004, iniciamos nossas aulas seguindo um livro que tem como base o drill, a repetição de estruturas, o que foi uma escolha da aluna. Segundo o modelo de Chaudron (Allwright, 1991: 220) durante este período, a professora corrigia a aluna logo após e sempre que fosse cometido um erro oral, como é indicado no método baseado no drill.

Mesmo dando a oportunidade para o aluno escolher sobre as atividades feitas na aula, a professora não demonstra satisfação em trabalhar como drill, pois na opinião da professora trabalhar assim é muito cansativo, pois o aluno não tem um momento de reflexão sobre o conteúdo aprendido e ele apenas repete as informações oferecidas.

Após ter estudado todo o conteúdo do livro que tinha como base o drill, foi escolhido trabalhar com outro material didático para dar prosseguimento às aulas. Como a professora já tinha experiência em trabalhar com outros métodos e com base em sua avaliação sobre como F1 se relacionava com o Francês, a professora selecionou o material Forum para dar uma aula demonstrativa do material didático a fim de verificar a adaptação de F1 a este livro, que tem como base a Abordagem Comunicativa, além de possuir um enfoque em tópicos gramaticais.

Primeiramente, a aluna demonstrou repulsa ao livro, afirmando que era de baixa qualidade porque ela não falava o tempo todo, depois percebeu através da simples tarefa de elaborar um diálogo que o conteúdo aprendido através do drill não lhe permitia estabelecer uma comunicação tão eficiente.

Confiando na experiência da professora, F1 resolveu aceitar o Forum como material didático e se adaptou muito bem. Durante as aulas de F1, houve a criação de um laço afetivo grande entre a professora e a aluna, que permitiu uma relação de amizade entre elas.

Durante o maior tempo das aulas, a professora oferece feedback afetivo positivo sobre a produção da aluna, sendo que ocorreu um episódio em que foi oferecido muito feedback afetivo negativo quando a aluna demonstrou não ter estudado as regras de emprego de verbos no passado e a aluna produziu muitos erros. Segundo Chaudron (Allwright, 1991: 220), a professora empregou vários tipos de correção, entre eles a interrupção, a negação, redução e a ênfase.

Foi um momento de bastante tensão, pois a professora se queixou com a aluna por ela não ter estudado, fora do momento das aulas, um assunto visto há mais de vinte dias. A matéria era as regras sobre o uso do pretérito perfeito no francês e por conseqüência, o conteúdo da aula estava dependendo disso. A aluna se sentiu constrangida por ser corrigida diversas vezes e chegou a retrucar dizendo que a professora estava muito má e demonstrou feedback afetivo negativo à produção da professora, o que continuou durante as três aulas seguintes. Mesmo assim, a aluna estudou o conteúdo fora da aula, conseguiu fixar as regras e seu desempenho melhorou muito.

Depois de duas semanas do fato ocorrido, a professora conversou com a aluna e explicou mais uma vez a necessidade de aprender as regras não estudadas para dar prosseguimento às atividades da aula. Neste momento, a aluna explicou o motivo de não ter estudado, afirmando não ter tempo para estudar, mas aceitou a explicação da professora. Depois desta conversa, a afetividade entre as duas voltou a ser bastante positiva.

A relação entre a professora e F1 é de grande amizade e intimidade. Durante as aulas e nos intervalos são comentados fatos do quotidiano de ambas, o que de acordo com a professora não a impede de tecer críticas negativas sobre o desempenho da aluna na língua alvo.

Este episódio ocorreu nos meados de maio e atualmente, aluna se empenha bastante para a assimilação das regras, não está inibida como ficou após a crítica da professora e demonstra ter mais consciência sobre o momento em que produz um erro no emprego de verbos no passado.

A professora percebeu que ao ser rígida com a aluna, a auto-estima da aluna em relação ao francês foi abalada, pois a aluna se sentia insegura em relação a sua produção na LE e cometeu erros que nunca tinham sido efetuados como a troca de preposições e o uso de palavras em português em suas produções em francês.

Este fato demonstra que oferecer grande quantidade de feedback afetivo negativo, pode constranger o aluno na interação na língua alvo e cabe ao professor ter consciência sobre este fato para não deixar de estimular a produção dos alunos.

Um Segundo Relato

Uma ex-aluna (F2) que estudou francês no ano anterior com a professora por motivo profissional resolveu voltar a estudar francês. As aulas tiveram como duração três horas e a freqüência de uma vez por semana. F2 teve aula com mais duas amigas que não conheciam a professora anteriormente. As aulas foram planejadas para ocorrer entre de abril e o início de junho.

Seguindo a mesma forma de trabalho, a professora as perguntou se elas tinham preferência por algum material didático. Elas apresentaram interesse por diferentes tipos de atividades. F2 se interessou por seguir o Forum, F3 quis trabalhar somente com livros que apresentam em seu conteúdo frases traduzidas do português para o francês, que geralmente apresentam francês empregado em viagem porque ela não queria se aprender a estrutura da língua escrita. F4 se aproximou mais de F3 na sua escolha, pois quis trabalhar com frases em português construídas por ela que deveriam ser traduzidas pela professora durante a aula.

Elas estavam muito ansiosas por saber a língua, pois tinham como objetivo a fluência no Francês em menos de dois meses. A mais calma era F2, por já ter estudado Francês anteriormente e ter algum conhecimento sobre a língua.

Um acordo foi estabelecido entre as quatro pessoas. Como se tratava de uma única aula em que as três alunas estudavam juntas, a professora ofereceu às alunas a opção de trabalhar uma seleção de atividades de acordo com o gosto das três alunas.

Como base, teríamos o livro Forum, mas os exercícios que visam a produção escrita não seriam utilizados e como atividade fora da aula, as alunas deveriam traduzir vocabulários através de leitura de artigos de revista e jornal, a fim de ter maior conteúdo de informações sobre a língua alvo. Além disso, as alunas foram aconselhadas a pensar em frases importantes a serem utilizadas no seu trabalho na França. Sendo assim, a aula seria dividida entre os vários tipos de conteúdo, que elas julgavam necessários.

As aulas se iniciaram sem seguir muito o roteiro estabelecido, pois a professora optou por começar ensinando como são empregadas frases na forma afirmativa, negativa e em questões. As aulas ocorreram neste esquema durante na primeira semana.

Ao seguir o roteiro, os conflitos começaram a surgir quando foi feita a atividade de traduzir frases da L1 para a LE, principalmente quando foram traduzidas construções verbais que apresentam gerúndio em português e as alunas perceberam que a tradução não tinha esta forma nominal no francês.

As alunas F3 e F4 pareciam incomodadas com a suposta perda do valor de suas frases na língua francesa, o que gerou feedback afetivo negativo tanto com a professora como com o francês. Mesmo com a professora apresentando explicações sobre o emprego dos tempos verbais na língua alvo, segundo Allwright (1991: 162) o conteúdo sofreu baixa receptividade.

Depois deste fato, a professora percebeu uma mudança nas atitudes das alunas F3 e F4 que demonstravam feedback afetivo negativo, pois pareciam desconfiar do conteúdo aplicado nas aulas. O rendimento das alunas F3e F4 diminui muito, elas se demonstravam dispersas, queriam conversar em português sobre assuntos profissionais, ignorando a presença da professora, o que gerou na professora um feedback afetivo negativo em relação às alunas. Para contornar este fato, a professora chamava a atenção de F3 e F4 para o conteúdo da aula, se baseando no roteiro planejado pelas quatro atuantes, o que não surtiu efeito positivo. Em seguida, para tornar a aula mais dinâmica, como foi sugerido por F3, só foi empregada a tradução de frases do português para o francês e a leitura de revistas e jornais foi feita em aula.

No andamento das aulas, a professora percebeu uma baixa receptividade sobre a sua forma de ensinar pelas alunas (Allwright, 1991: 161). Mesmo tentando atrair o interesse das alunas dispersas o fato não ocorreu.

As aulas foram interrompidas antes da última semana de abril, quando a professora teve que alterar seu horário para trabalhar num curso e não foram retomadas porque a viagem das alunas estava prevista para os meados de junho.

O Terceiro Caso

to é composto pela atividade da professora de lecionar Português como língua estrangeira. Durante o mês de maio de 2005, a aluna P1 fez um curso intensivo de segunda a sexta e cada aula tinha a duração de quatro horas. A aluna é alemã, tem 24 anos e não tinha conhecimentos sobre a língua portuguesa. Seu objetivo era alcançar a fluência na língua durante este período a fim de fazer um estágio numa agência de viagens no Rio de Janeiro. As aulas ocorreram num curso de idiomas.

No primeiro contato, a apresentação da aluna à professora foi feita por um alemão que hospedou P1 em sua casa. Em seguida, a professora conversou com a aluna em inglês sobre seus objetivos, seus conhecimentos de português e se ela tinha preferência por algum material didático. P1 demonstrou ser bastante tímida, ansiosa e durante as aulas, foi observado que ela é uma pessoa muito perfeccionista e exigente consigo mesma, o que percebemos através do ato de se negar a produzir frases quando tinha dúvidas se elas estavam realmente certas.

Sobre sua escolha a respeito do material, P1 se absteve logo a professora optou por utilizar o livro Avenida Brasil 1 por se tratar de uma aluna que não tinha conhecimentos de português. P1 sempre demonstrava um grau alto de ansiedade em aprender o português, o que não foi observado como ansiedade facilitadora (Allwright, 1991: 172) do processo de aprendizagem.

Uma ocasião extrema ocorreu na segunda semana de aula. A professora deu o comando de uma atividade em que P1 deveria contar oralmente ações ocorridas na sua infância. Neste momento, a professora deixou a aluna fazer suas produções sem corrigi-la, pois se tratava de uma atividade em que havia o interesse da professora em aproximar a aluna de uma situação real de conversa com um falante nativo de português.

A professora anotava os erros da aluna durante sua produção na língua alvo. Ao se exprimir, a aluna fazia várias pausas e auto-correções. Num momento em que a professora anotava uma construção inadequada da aluna, percebeu que o tom de voz de P1 estava se alterando. A professora olhou para a aluna e notou que ela estava ficando nervosa, em seguida a professora pediu que fosse feita uma pausa na atividade.

Logo depois, a aluna começou a chorar compulsivamente e num primeiro momento a professora ficou constrangida porque se sentiu culpada pelo fato da aluna estar nervosa. Num segundo momento, a professora percebeu que não tinha culpa alguma sobre o fato da aluna estar chorando porque a aula estava se sucedendo como com outros alunos e imediatamente tentou dialogar com P1 para saber o motivo de seu nervosismo.

Neste momento, a professora observou que sua atitude se assemelhou a de um psicólogo. Perguntou qual era o problema de P1, porque estava chorando e tão nervosa. Explicou que a ansiedade da aluna não podia vencê-la, que ela deveria usá-la a seu favor e não como um obstáculo para seu desempenho no português. A aluna só repetia que o português é muito difícil e chorava cada vez mais. A professora ofereceu um copo de água para tentar acalmá-la e a conversa passou a ser em inglês para facilitar a compreensão da aluna, já que ela só tinha uma semana de contato com o português.

No desenrolar da conversa, P1 foi ficando mais calma e depois desse acontecimento, a aluna se demonstrou muito mais aberta para a relação com a professora e também com o português. Podemos observar que depois deste fato foi estabelecido um laço maior de afetividade entre a aluna e a professora que favoreceu o aprendizado do PLE.

As aulas terminaram como foi previsto, no período de um mês e depois das aulas as duas trocaram e-mails sobre o desempenho da aluna no seu estágio além da aluna pedir auxílio sobre o emprego do português em diferentes contextos com por exemplo expressões idiomáticas em português.

Através desta pesquisa concluímos que em Mendes (2005: 48), a mestranda apontou a inconsistência teórica como um dos principais fatores que interferem na prática da correção oral. Observamos que mesmo o professor tendo embasamento teórico sobre o ensino de LE, ele está sujeito a produzir uma reflexão técnica e a ter somente uma visão restrita a trabalhos feitos por outros pesquisadores sem relacioná-los a sua atividade em sala de aula e, conseqüentemente não produzir uma reflexão crítica, o que pode contribuir para a efetuação de correções adequadas ao contexto ao qual ele faz parte.

Após ter um arcabouço teórico em torno do ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras que permitiu a elaboração dessa pesquisa, a mestranda buscou verificar outros fatores que interferem no processo de ensino e aprendizagem de LE e sua percepção foi além da atuação como professora. Pôde perceber algo simples que passou despercebido em seus estudos anteriores – o processo de ensino e aprendizagem não necessita apenas do conhecimento do professor sobre a LE, o contexto tem uma enorme importância, pois engloba tanto o professor como o aluno, a língua estrangeira, o material didático, o ambiente em que ocorre a aula, as expectativas do aluno em torno do aprendizado da LE, além de fatores psicológicos.

Foi observado através da pesquisa um outro fator muito relevante que, a princípio, não servia como base para as observações desta pesquisa, mas demonstrou ter um papel de destaque, a afetividade, algo que influencia extremamente o processo de ensino e aprendizagem de LE, pois da mesma forma que pode facilitar o aprendizado de alunos, pode bloqueá-lo.

Um fato surpreendente para a mestranda foi o surgimento de uma percepção maior com relação ao contexto do ensino de LE. A mestranda pode obvervar que além do arcabouço teórico que o professor deve ter conhecimento sobre o ensino de LE, há outros fatores que interferem no ensino e que a afetividade foi caracterizada durante as aulas como tendo uma grande influência tanto no professor como no aluno.

Um dado observado na atuação da professora com todos os alunos que pode ser contrastado com sua experiência em aulas em grupo dentro do contexto de cursos de idiomas foi a intimidade existente entre os atuantes da aula de LE. No início de suas observações, a professora relacionava este acontecimento ao fato das aulas ocorrerem na casa dos alunos, mas a intimidade também foi observada durante as aulas lecionadas em contexto de sala de aula, de um curso de idiomas. Concluímos que o fator intimidade está mais relacionado ao fato das aulas serem particulares.

Concluímos que a afetividade está inserida no contexto de sala de aula de LE porque há um movimento psicológico em torno do ensino. Observamos que mesmo que o professor em aula de LE opte por trabalhar com atividades em que o aluno utiliza uma outra identidade, personagens fictícios ou verídicos, há uma exposição do aluno porque ele demonstra sua relação com o mundo, consciente ou inconscientemente, exprimindo suas opiniões, suas emoções e outros fatores que estão incluídos no processo comunicativo.

Um outro ponto observado em aulas particulares foi aproximação existente entre as profissões do professor e do psicólogo. A língua estrangeira a ser ensinada passa a servir apenas como um instrumento para a comunicação e em seguida se iniciam diálogos em torno do quotidiano dos atuantes, mesmo que fictícios. Além disso, ao ser construído um feedback afetivo positivo entre a professora e os alunos, foram iniciados diálogos sobre a intimidade de alunos. Os alunos expõem suas emoções, dúvidas, satisfações, frustrações e planos de vida em suas aulas, o que é visto pela professora como ponto positivo para o processo de aprendizado da língua estrangeira.

A professora tinha em mente que trabalhar com aulas particulares facilita a relação entre professores e alunos, mas descobriu que tanto o aluno quanto o professor ficam mais expostos ao processo de ensino, pois os diálogos ocorridos em aula são sempre entre os dois atuantes no processo, o que pode oferecer tanto resultados positivos como negativos. Um ponto negativo a exemplificar é o fato do aluno não querer expor sua vida particular e por conseqüência reagir como um feedback afetivo negativo ao sistema de aulas particulares e à professora, o que é atenuado quando o aprendizado ocorre em grupo, pois o aluno deixa de ser o único foco da atenção e suas particularidades podem ser despercebidas dentro do grupo. Além disso, podemos destacar que a afetividade fica mais evidente neste tipo de aula.

Um ponto interessante a ser destacado é a relação existente entre o feedback afetivo positivo e a rejeição da língua estrangeira. Quando o diálogo toma dimensões maiores ao passo que o aluno obtém uma fluência razoável na língua alvo, alguns alunos iniciavam suas produções na fala na LE (F1, F2) e em seguida começavam a falar em Português, o que foi contornado pela professora com comandos pedindo o emprego da LE.

Um fato bastante interessante foi a observação da rejeição da língua alvo, da metodologia e da professora, algo que compõe uma mescla que é difícil de ser caracterizada, como no segundo relato, pois as alunas F3 e F4 identificam a professora como aquela que tem conhecimentos da língua que está oferecendo a elas empecilhos para a realização do seu trabalho. Ainda sobre o segundo relato, a mestranda aponta outra interpretação sobre este feedback afetivo negativo, as alunas podem ter associado a língua francesa à professora, já que elas apresentaram inicialmente um feedback afetivo negativo com relação à língua.

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