A COMPOSIÇÃO COMO PROCESSO
DE FORMAÇÃO DE PALAVRAS EM PORTUGUÊS
Adaete Abreu Loureiro
(UFAC)
Alexandre Bandeira
de Menezes (UFAC)
Jacqueline Saturnino
de Souza Medeiros (UFAC)
Maria Guiomar Ramos
(UFAC)
Raimunda Rodrigues da
Costa
(UFAC)
INTRODUÇÃO
Este
trabalho tem por objetivo apresentar pesquisa
de campo realizada no mês de março do
corrente ano,
sobre: as gírias
utilizadas por
usuários
de drogas que
ficam aos arredores da praça da Justiça,
localizada nesta cidade; a linguagem usada pelos
flanelinhas (guardadores
de carros) que
concentram-se em
frente
a Polícia Militar.
A primeira
pesquisa
referente
à gíria é uma
linguagem
que nasce em
um certo
grupo social
e termina estendendo-se à linguagem familiar. Ela
perpassa aos meios de comunicação e morre ou
renasce na voz do
povo. Pode ser incorporada
pela
língua oficial,
permanecer no vocabulário
de pequenos
grupos
ou cair em desuso.
A segunda
pesquisa trata-se de uma linguagem também
cheia de gírias
que é criado
com o intuito
de segredo, e
quando
o segredo é
quebrado
surgem outras palavras
para
denominar o meio,
o mundo, as
coisas.
Enfim,
este trabalho será feito com a intenção
de atingir a expectativa
do tema escolhido
por
esse grupo,
ou seja, “formação
de palavras em
português”, relacionando
gírias
e expressões idiomáticas, mais freqüentes
em determinados
grupos sociais,
como os acima
citados, destacando aqueles formados pelo processo de composição por justaposição, com
seus devidos
significados.
OBJETIVOS
Geral
O trabalho em questão tem como pretensão mostrar que cada indivíduo ou grupo social apresenta diferentes
maneiras de
transmissão
de seus
conhecimentos
e comunicação.
Cada
um depende de seu
meio social,
podendo expressar-se de diferentes formas, porém,
transmitindo os mesmos significados, segundo
os seus desejos
e suas possibilidades.
Específico
Estudar
a linguagem
usada pelos
usuários
de drogas e pelos
guardadores de
carro
na cidade de Rio
Branco.
JUSTIFICATIVA
Este
trabalho foi realizado com objetivo de
expandir os nossos
conhecimentos no
campo
das denominações da
linguagem
utilizada pelos
três
grupos
específicos: dos usuários
de drogas
e dos guardadores de carros.
Justifica-se com
o presente estudo,
a maneira em
que surgem as
gírias
e como elas
são entendidas pelas pessoas, o processo comunicativo das palavras
usadas pelos rádio-taxistas.
METODOLOGIA
Este
trabalho foi realizado através de duas pesquisas
de campo, nas
quais
foram feitas
entrevistas. Na primeira
foram entrevistados adolescentes e adultos
pertencentes ao grupo dos usuários de drogas;
na segunda foram entrevistados os flanelinhas (guardadores
de carro).
Depois,
relacionaram-se as palavras
e expressões em
forma de gírias,
por ordem
alfabética, com
seus devidos
significados.
Além
disso, foi destacado todo o vocabulário formado pelo processo de composição por justaposição.
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
Entende-se por campo semântico
“associação de significação para um certo número de
semantemas, como os
termos
para cor, para partes do corpo animal, para os fenômenos
meteorológicos, etc. (...) em que cada palavra se associa com
outras na base de significações
correlatas dentro da cultura a que a
língua serve”.
Compreende-se como
linguagem
especial,
em sentido
estrito, uma
linguagem
fundamentada na prática de um
ofício ou
profissão. Há,
por
vezes, termos
técnicos e
científicos,
por outro
lado há, aqueles,
de criação
popular.
A Semântica
é a ciência que
estuda as significações das formas lingüísticas.
Essa visão da
ciência
vimos no decorrer do curso
e percebemos a sua aplicabilidade na feitura e organização
do presente trabalho.
Baseando-se
nos conceitos que a
semântica com
“o estudo do
sentido
das palavras”, vemos
ser
a linguagem
humana
um meio
eficaz de
comunicação. Nesse sentido,
a língua
é um instrumento,
o veículo que
serve à comunicação das idéias, assim
entendemos com Guiraud.
Segundo
Evanildo Bechara, semântica é “o estudo
da significação dos vocábulos e das
transformações de sentido por que estes mesmo vocábulos passam”. Já
para Mattoso Câmara Jr., semântica é “o estudo
da significação das formas lingüísticas.
No que
diz respeito à
linguagem
dos meninos de
rua, pode-se afiançar
que
a comunicação se estabelece a partir do momento que eles
utilizam as gírias para
expressar suas
idéias e
sentimentos. É esse
modelo
de linguagem denominada de “gíria” que eles utilizam no processo comunicativo, com
o intuito de esconder
às atividades que
exercitam enquanto “guardadores
de carros”.
As gírias,
criadas pela
necessidade
de sigilo, são
formadas a partir de
elementos
formais já
existentes ou tomados de empréstimos a outras línguas,
como é o caso
das palavras “vela”
ou “back” para
designar “cigarro
de maconha”.
Outro
tipo de processo, na formação
de novas gírias,
pode originar-se por composição por justaposição.
FORMAÇÃO
DE PALAVRAS
EM PORTUGUÊS
PLO PROCESSO DE COMPOSIÇÃO
POR JUSTAPOSIÇÃO
Em português as palavras se formam por
vários processos,
entre ele,
o processo de composição,
que é conceituado
por alguns
autores a seguir,
da seguinte forma:
Luiz Antônio Sacconi (Nossa Gramática: Teoria e Prática, p.70)
define:
“È a formação
de palavras
pela união de
dois ou mais sematemas”.
Exemplos:
por-espinho, testa-de-ferro, pernalonga,
passatempo,
malmequer, vaivém,
etc.
Evanildo Bechara (Moderna Gramática
Portuguesa, p. 351) diz que:
“É a junção
de dois
elementos identificáveis
pelo
falante numa
unidade
nova de
significado
único e somente.”
Exemplo:
papel-moeda,
boquiaberto, planalto,
etc.
Manuel Pinto Ribeiro (Nova Gramática Aplicada da Língua Portuguesa, p. 121) Explica-se que:
“A
composição acontece
quando
se juntam dois ou
mais radicais.”
Valter Kehdi (Formação de Palavras
em Português,
“Apostila”, p. 17) esclarece:
“É um processo de formação lexical
que consiste na
criação
de palavras novas
pela combinação
de vocábulos já
existente.” Exemplo: amor próprio, ganha-pão, etc.
Através
dos conceitos
e dos exemplos
acima
citados, dá para distinguir
dois tipos de
composição:
justaposição
e aglutinação. O primeiro apresentado, segundo o último autor referido acima
(apostila 18), “Ocorre quando
os termos
associados
conservam a sua
individualidade”,
ou seja, os sematemas permanecem absolutamente inalterados.
Eis
alguns exemplos: porco-espinho,
testa-de-ferro, pernalonga, passatempo, vaivém, sempre-viva, etc.
Como
o objetivo de apresentar palavras com estas características
é que, logo
abaixo, relaciona-se vocábulos (gírias)
dos flanelinhas e dos usuários de drogas,
com seus
devidos
significados, coletados através
de pesquisa de campo
realizada pelos
componentes
do grupo
responsável
por este
trabalho, onde
teve a preocupação de
destacar
todas as palavras formadas pelo processo de composição por justaposição.
A seguir, o
resultado da pesquisa
realizada:
Vocabulário
dos usuários
de drogas
que
ficam aos arredores
da praça da
Justiça
A
Aluado:
Distraído, desligado, de lua
Apoquentado:
Nervoso, irritado
Arroz:
Cocaína
Avião:
Pessoa que passa droga
B
Baião
de dois:
Mistura de maconha com pasta base (por justaposição)
Bocada:
Lugar onde vende-se droga
Brizolado: Cocaína e maconha
misturado
Barra-limpa:
Sem
impedimento, descontraído (por justaposição)
C
Cana: Cadeia, prisão
Carne-de-pescoço:
Teimoso,
pessoa difícil (por justaposição)
D
Dar
com a língua
nos dentes:
dizer o que não deve
E
Encarar:
Ficar olhando
J
Jaburu:
Mulher
feia
Jegue-manso:
Comer
quieto (por justaposição)
L
Lero:
Conversa
Levar
a pior:
perder um negócio, ser derrotado
M
Morcegão:
Pessoa que só sai à noite
N
Noiado:
Pessoa que usa droga
P
Palha: Fumo que não é bom
Pó: Cocaína
Pacoitero:
Grande quantidade de maconha
Q
Qual
é o do capeta?:
O que ele deseja?
T
Tá limpo:
Esta certo
Testa-de-ferro:
responsável
pelos
negócios de um
grupo; aquele
que assume tudo
pelo grupo (por justaposição)
Toldado:
Muito
louco
V
Vela: Cigarro de maconha
Vocabulário
dos flanelinhas
que
concentra-se em
frente à Polícia
Militar, nesta cidade.
B
Bater
um fio:
telefonar
Bicão:
Intrometido
Bicha
louca:
Pederasta,
barato,
escandaloso
(por justaposição)
Boca
quente: Local
perigoso
Boa-gente:
Educado, camarada, respeitador
Brocado:
Muita fome
C
Cabeça-de-bagre:
Jogador sem
classe, sem técnica, mau jogador (por justa posição)
Caixinha: Gratificação, gorjeta
Caixa
de pancada:
Pessoa infortunada, vítima que sempre leva a pior (por justa posição)
Careta: Pessoa chata, inconveniente, estraga
prazeres
Cara-de-Pau: Descarado, sem vergonha (por justa posição)
Cara:
Pessoa,
indivíduo, ser
Chapa: Companheiro, amigo
Caroça:
Carro velho
Cobra:
Ótimo em alguma coisa
D
Dar
mancada:
Cometer uma gafe,
ficar mal perante outras pessoas
Dar
pesada:
Avançado, sem preconceitos
incrementado (por
justa
posição)
Dar
no pé: Sumir
(por justa posição)
Dedar:
Denunciar
Dedo-duro:
Denunciante (por
justa
posição)
Descurtir:
Deixar de gostar,
abandonar
Deu furo: Não pagou
Dica: Informação, idéia
E
Educado:
Confuso, preocupado
Engrossar:
Perder
a classe,
faltar com educação
Entrar
em fria:
Ser mal
sucedido
Entrar
pelo cano:
Levar prejuízo,
ser derrotado
Enxuta: Mulher conservada, bonita
Estar
na pior:
Esta em dificuldade
Escalão:
Meninos que chegam sem ser convidados
F
Faturar:
Vencer,
conseguir, ganhar dinheiro
Fajutos: falso, enganoso
Fino: Pessoa que goza de bom conceito, honesta
Fofoca: Comentários, boatos,
mexericos
Flanelinha: Meninos que
trabalham lavando carros nas ruas e praças
G
Gata:
Garota
jovem
Grilado:
Cismado, preocupado, impressionado
N
Nó-cego:
enrolado (por justa posição)
P
Pão-duro: Pessoas que não pagam (por justa posição)
Pé-rapado: Soldado
Peixão:
Coronel
R
Rango:
Refeição, comida
Rolo:
Briga, confusão
S
Sacar:
Entender,
perceber
T
Transar:
Relacionar
encontrar, contactar
Tira: Policial
U
Um
tremendo barato: Uma coisa sensacional, fora do comum
CONCLUSÃO
Ao término
deste trabalho, constatamos
que
as palavras e
expressões
da língua portuguesa são usadas de acordo
com o lugar,
a cultura e os
costumes
de cada grupo
social.
Vimos que para efetuarmos a comunicação é preciso
“falar a mesma
língua”: o português,
por exemplo,
é a língua do
nosso
país.
Mas,
constatamos que
só isso
não garante a
comunicação,
pois existem diferentes
manifestações de uma língua: a linguagem
dos usuários de
drogas
e dos flanelinhas,
por
exemplo, não
são as mesmas de
outros
grupos sociais.
Às vezes
as diferenças
sociais
ou grupais tornam
um
pouco difícil
a compreensão de
certas
palavras. Daí surge
até
a necessidade de m
estudo
mais profundo
dos significados de
palavras
e expressões, ou
recorrer até mesmo a um dicionário.
No final
de nossa pesquisa
procuramos, dentro de nossas limitações, mostrar nesse
trabalho tudo
aquilo que
pudesse estar relacionado com
o assunto (formação
de palavras pelo
processo de composição
por justaposição),
elemento que
ficou estabelecido logo no início, e de contribuir para o estudo das
variações lingüísticas no campo das gírias
dos usuários de
drogas
e dos flanelinhas
nos
pontos mencionados na introdução.
Por
tudo quanto foi dito,
vale lembrar que: “Ainda que criativa e expressiva, a gíria
só é admitida na
língua
falada. A
língua
escrita não
a tolera, a não ser
na reprodução da
fala
de determinado
meio
ou época, com a visível intenção de documentar o fato, ou em casos especiais de comunicação
entre amigos,
familiares,
namorados, etc., caracterizada pela linguagem informal.”
(Sacconi)
BIBLIOGRAFIA
BECHARA, Evanildo.
Moderna
Gramática Portuguesa. 37ª ed., rev. e ampliada. Rio de Janeiro : Lucerna, 1999.
RIBEIRO,
Manuel Pinto.
Gramática Aplicada da
Língua
Portuguesa. 11ª ed., ref. e atual. Rio de Janeiro : Metáfora, 1994.
SACCONI, Luiz Antônio.
Nossa
Gramática: Teoria
e Prática no TP. 18ª ed., reformada e atualizada. São Paulo : Atual,
1994.
JOTA,
Zélio dos Santos.
Dicionário de Lingüística.
2ª ed. Rio de Janeiro
: Presença, 1981.
CAMARA
JÚNIOR, J. Mattoso. Dicionário
de Lingüística
e Gramática. 13ª ed. Petrópolis : Vozes, 1986.