ESTRUTURA E FORMAÇÃO DE VOCÁBULOS
EM PORTUGUÊS

Almilene da Silva Freire (UFAC)

José Tadeu Silva Araújo (UFAC)

Gercineide Maia de Souza (UFAC)

Ozéias Moreira da Costa (UFAC)

Rainise Pereira Lima (UFAC)

 

INTRODUÇÃO

O propósito deste trabalho é compreender o processo em que o vocábulo, em Língua Portuguesa, se realiza.

Foram usados como fonte de pesquisa bibliográfica, livros de autores conhecidos que empreenderam atividades nessa área, confrontando-os com a linguagem acreana com suas características e vocabulários próprio. Consideramos necessário usar como base para esse texto o ponto-de-vista de autores como Vanildo Bechara, Joaquim Mattoso Câmara Jr. e outros.

 

ESTRUTURA E FORMAÇÃO DE VOCÁBULOS

EM PORTUGUÊS

O temo vocábulo procede do latin voz que significa “a voz”, no entanto para a boa compreensão desse trabalho poderemos usar tanto o termo vocábulo quanto simplesmente palavra.

Reconhecemos, no entanto, que os dois termos têm entre si coincidências tais a ponto de gerar à grosso modo essa “confusão”. Para esse trabalho, porém, consideramos que toda palavra é vocábulo, mas nem todo vocábulo é palavra, isto é, não palavras os vocábulos que apresentam significação lexical. Há, portanto, dois tipos de vocábulos, o lexical e o gramatical. São lexicais os que representam idéias e gramaticais os que não traduzem idéias, mas, servem para estabelecer relações entre as palavras.

Para Evanildo Bechara (Bechara, 2000; 333) toda palavra deve ser classificada levando em conta três prismas diferentes:

a) o seu aspecto material, fônico;

b) a sua significação gramatical;

c) a sua significação lexical.

A palavra não pode ser observada, levando-se em consideração somente a sua constituição formal, isto é, considerando somente as letras ou os fonemas que a constituem. Para que os estudos morfológicos dos vocábulos sejam feitos através de uma base rigorosa, é necessário atentarmos para as sua unidades mínimas significativas às quais denominam-se morfema:

a) a palavra deve ser observada como significante ou expressão material da língua (falada ou escrita);

b) a palavra se apresenta sob o seu aspecto formal, isto é, deve ser observada segundo uma classificação morfológica;

c) observamos a palavra em relação a outra.

 

Palavra e morfema

Observamos que me português as palavras estão constituídas de uma base fônica e de duas formas semânticas, a gramatical e a lexical. Essas unidades são conhecidas pelo nome técnico de morfema.

O que são morfemas?

Morferma é a unidade mínima dotada de significado que integra a palavra.

 

Tipos de Morfema na estrutura das palavras

Quanto ao aspecto formal os morfemas podem ser considerados como: Morfemas aditivos, substantivos, modificativos, zero, etc.

 

I- São aditivos os morfemas representados pelos:

1. prefixos-morfemas que se antepõem a uma base lexical. Ex.: pre + visão = previsão; previsão + metro = perímetro;

2. sufixos, interfixos e desinênciasque se pospõem a uma base lexical. Ex.: marcha + ar = marchar; geral + mente = geralmente;

3. infixosque se inserem no interior da palavra. Ex.: repor + com = recompor.

4. circunfixos – que são chamados parassintéticos, que tanto se antepõem como se pospõem à base simultaneamente. Ex.: a + calma = acalma

Existem também os:

a) descontínuos (ou alternativos) que é uma fragmentação pela intercalação de outros morfemas. Ex.: acudo – acodes; bebo – bebes; todotudo.

b) reduplicativos – onde há uma repetição da parte inicial das bases. Ex.: papai, vovô etc.

 

Os Morfemas substantivos são representados por

1. Substantivo propriamente dito que é uma subtração de fonema do radical para exprimir uma indicação gramatical.

2. Supressivos – ex.: anãoanã; órfão – órfã.

3. Abreviaturas: redução da extensão da palavra, que passa a valer pelo todo. Ex.: PT (Partido dos Trabalhadores)

 

Os Morfemas modificativos representados por

1. Apofonia – substituição de um fonema vocábulo pertencente a um radical do mesmo paradigma (flexional ou derivacional) por mudança do timbre para indicação de significado gramatical.

2. Metátesequando ocorre mudança de sílaba tônica.

 

Morfemas Æ

Alguns morfemas deixam de estar presentes nas palavras (ausentes). Essa ausência recebe a denominação de morfema Æ.

Ex. O plural em português é marcado pelo morfema / s/ : casa / casas; jardim/ jardins. Palavras como lápis e simples que carregam o morfema / s/ no singular não se modificam no plural. Dizemos então que estas palavras estão sinalizadas pelo morfema Æ.

 

Classificação dos Morfemas Em português

Os morfemas podem ser classificados em:

Radical

É o elemento irredutível e comum às palavras de uma mesma família. Na série pedra, pedreiro, pedreira – o segmento pedr é o radical, pois satisfaz as exigências acima. A raiz da palavra também recebe a denominação de Semantena.

 

Afixos: prefixos e sufixos.

Chamam-se afixos os elementos que se juntam ao radical para mudar-lhe o sentido, acrescentar-lhe uma idéia secundária ou ainda, mudar a classe gramatical do vocábulo. Ex.: Padre/ padreco (houve uma mudança de sentido); bom/ bondade (o adjetivo bom passou ao substantivo bondade). Os afixos ao radical denominam-se prefixos e os póspostos ao radical chama-se sufixos.

São exemplos de prefixos: impossível, desatar; superpor. E de sufixos: pequenino; dormitório, espiritual.

A diferença fundamental entre os prefixos e os sufixos, é que, diferente do sufixo, o prefixo não contribui para a mudança de classe do radical. Se acrescentarmos ao adjetivo leal o sufixo dade, ele passa a substantivo lealdade;o mesmo não ocorre se acrestarmos o prefixo des, o adjetivo leal passa a desleal, que também é adjetivo.

 

Desinências

São os morfemas terminais das palavras variáveis. Existem desinências nominais, que encerram a idéia de gênero e número, e as desinências verbais que exprimem modo e tempo (modo-temporais) e indicam número e pessoa (número-pessoais).

Tanto sufixos quanto as desinências são morfemas terminais das palavras. No entanto, existem duas diferenças relevantes entre eles: a primeira é que, as desinências fazem a concordância das palavras na frase:

Os homens trabalhadores prosperam

Os e trabalhadores concordam com o sujeito homens em gênero e número; o sujeito homem e o verbo prosperam concordam em número e pessoa. Enquanto que os sufixos possibilitam a criação de novas palavras. Se acrescentarmos o sufixo eiro ao substantivo manga, teremos outro substantivo, mangueira; outra diferença é que as desinências são morfemas que não se pode dispensartoda forma verbal portuguesa está associada às noções modo e tempo e de número e pessoa.

Com estas consideração, Valter Kehdi diz que o grau, ao contrário do que dizem muitas de nossas gramáticas, não constitui um caso de flexão e que o substantivo flexiona-se apenas em gênero e número. Pois a expressão do grau não implica concordância, não havendo, portanto, obrigatoriedade do uso desse elemento em: casinha bonita, em vez de casinha poderíamos dizer casa pequena. Sendo assim, a expressão de grau é um caso de derivação prefixal.

 

Desinências nominais

a) De gêneromasculino Æ, feminino – a .

Muitas gramáticas consideram o –o como marca de masculino em oposição ao –a feminino. Mattoso Câmara diz que não existe desinência de gênero masculino, ele considera o –o, como vogal temática;

b) De númerosingular Æ (ausência de desinência), plural -s.

 

Desinências verbais

a) número pessoal e b) Modo temporal

1ª P.S. Æpasso -o = variante do presente do indicativo

2ª P.S. -s – passas

3ª P.S. -Æpassa

1ª P.P –mos – passamos

2ª P.P –is – passais

3ªP.P –m – passam

Alomorfes (variantes)

Pres. Ind.: 1ª P.S. -o e 2ª P.P -des.

Pret. Perf. Ind. 1ª P.S. -i, 2ª P.S. -ste, 3ª P.S. -u, 2ª P.P -stes e 3ª P.P. -ram

Fut. Pres.: 1ª P.S. -i e 3ª P.P. -o/ -un.

Fut. Subj./ Inf.: 2ª P.S. -es, 2ª P.P. -des e 3ª P/P. -em.

Imp. Afirm. 2ª P.S. Æ e 2ª P.P. -i/ -de .

 

Para o indicativo e para o subjuntivo

São vogais colocadas entre o radical e a desinência. Acrescentam-se ao radical para formar o tema da palavra. Têm a função de marcar classes de nomes e de verbos.

Presente: Æ

Pret. Imp.:              (1ª conj.), -va – (-ve-, ama-va.

                (2ª e 3ª conj.), -ia- (-ie-), vendi-a, subi-a.

pret. Perf.: (Para as cinco primeiras pessoas) Æ

(para a 3ª P.P.) -ra- canta-ra-m.

pret. M-q- pert.: -ra – (-re-) átonos cantara.

Fut. Do pres.: -ra (-re-) tônicos canta-rei.

Fut. Do Pret.: -ria (-rie-), vende-ria.

Presente:               (1ª conj.) –e – cant-e.

                (2ª conj.) -a- vend-a, port-a.

Imperfeito: -sse – canta-sse

Fut. / Inf.: -r-c-re-vend-e-r, part-i-r.

Gerúndio: ndo- parti-ndo

Particípio: -do – parti-do.

 

 

Vogais temáticas nominais.

O: livr-o, urs-o        A: cart-a, cas-a     E: mont-e, val-e.

É necessário aqui diferenciar desinência de vogal temática. Para Valter Kehdi, o –o e o –a serão desinências, quando existir uma forma masculina e outra feminina para as palavras que as mesmas encerram. Caso contrário serão vogais temáticas.

 

Vogais temáticas nominais

configuração – a- (and-a-r).

configuração – e – (colh-e-r)

configuração – i- (part-i-r)

 

Alomorfes (variantes)

Vogais e consoantes de ligação

São elementos sem significação, que ocorrem no interior do vocábulo para facilitar a pronúncia ou por razões análogas.

* De –a-: (-e) e (-o) na 1ª e na 3ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo (and –e-i), (and-o-u).

De –e-: (-i), no pretérito imperfeito do indicativo, na 1ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo e no particípio passado (colh-i-a), (colh-i), (colh-i-do)

 

Vogais de ligação

As vogais temáticas de português são apenas duas: /i/, que compõe elementos de origem latina, e /o/, que compõe elementos de origem grega. Ex.: facilidade _ fácil + i+ dade.

* O /i/ e o ?o/ serão vogais de ligação, quando poderem ser isolados como nos exemplos acima.

* Nas composições a partir de adjetivos terminados em –io, o /i/ possui variante / e/, que servem para evitar a eufonia. É o caso de: sério/ seriedade e próprio/ propriedade.

 

Consoantes de ligação

As consoantes de ligação mais freqüentes são /z/ e l/ , que são observadas em palavras como: café –z –al; capin-z –al; pau-l – ada e cha-l-eira. São raras as ocorrências de outras vogais de ligação, como /g/ e /t/ que figuram em palavras como: mata-g- al e café-t-eira.

 

Processo de Formação de Palavras

Derivação

Cada língua tem seus mecanismos de formação de palavras novas, uns até mais condensados do que outros. No caso específico da língua portuguesa, dentre vários processos destacam-se a derivação e a composição.

Limitemo-nos em primeiro plano analisamos a derivação, que segundo Bechara, esse procedimento consiste em formar palavras de outra primitiva por meio de afixos (*1) (moderna gramática de língua portuguesa: 2001, p. 357)

Compreende-se assim que essa maneira de enriquecer o léxico, articula-se em torno das formas presasem posição anterior com os prefixos e posterior com os sufixos. Daí a classificação em derivação sufixal e prefixal.

Mattoso Câmara salienta que em português, os sufixos assumem funções diversificadas, as quais servem não para acrescentar a um semantema (* 2) uma idéia acessória como a de grau e a de aspecto, mas também para transpor uma palavra de uma classe para outra. Observe: famoso. De forma; cantor de canto.

Dentro desses lineamentos, há escritores que classificam o sufixo em três categorias: verbal quando concorre para a formação de verbos – entarde(cer), namor(icar), relamp(ejar), etc. Nominal quando contribui para a produção de substantivo e adjetivos – orelh(udo), bel(íssimo); adverbial quando agrupa-se a outro vocábulo para formar advérbio, tais como: tri(eza), real (mente) (* 3).

Vale lembrar que existem casos especiais em que o sufixo é aparentemente aumentativo. Veja-se o que acontece nesta frase: “João, traga-me por favor àquele calção...!”. Constata-se, no entanto, que o nome fixado não corresponde a calça grande.

Acresce que os principais prefixos (*4) ocorridos em português são de procedência latina ou grega. Do latim, tem-se por exemplo, a- < ad (avizinhar), ben- ou bem- < bene (benfazer, bem- aventurança), e do grego os vocábulos a – acefalo etc.

A propósito, considerada um problema para alguns estudiosos e solução para outrem, a derivação parassindética abolida pela NGB, constitui um processo formado por prefixação ou sufixação simultânea. Exemplo: desalmado, inquebrável, anoitecer.

Quanto a derivação regressiva ou deverbal, esta se propõe a formar palavras por analogia, pela subtração de algum sufixo, dando a falsa impressão de serem vocábulos derivantes. Exemplo: lutar (luta), embarcar (embarque). Assim afirma Bechara (2001, p. 370.)

Insere-se também nesse processo, a reduplicação que é um recurso para criar palavra marcada pela expressividade. Consiste, entretanto, na repetição de uma vogal ou consoante. Exemplo: vovô, cacá, tique-taque, etc.

Outro mecanismo muito limitado é a abreviatura de alguns compostos formados por radicais gregos ou latinos. De cinematográfico, obtêm-se a abreviatura cinema; automóvelauto; motocicleta- moto etc.

José Lemos revela em um de seus ensaios que na língua portuguesa há infixo, circunfixos, interfixos. Além dessas modalidades ainda acrescenta o infixo, o que contraria não o pensamento do lingüista Mattoso Câmara e do filósofo Bechara, mas de muitos estudiosos.

A título de ilustração, note-se nos vocábulos esquec-i – mento e grat- i- dão, um elemento destituído de significação, o qual une o radical a um infixo. Para tanto, esse fragmento que realiza a articulação entre a raiz de certos derivados é o que Lemos classifica de interfixo.

(* 1) Afixo é um segmento fônico, o qual se incorpora a palavra ou radical, com a finalidade de criar outras palavras. Podendo modificar o sentido ou função do vocábulo.

(* 2) Semantema é o elemento da palavra que expressa a significação externa.

(* 3) Há autores que consideram -mente, como única forma verbal.

(* 4) Diversos estudiosos incluem a prefixação no processo de composição. Mattoso Câmara, Coutinho Lemo, etc.

 

Composição

Na composição ocorre a formação de novas palavras, que inclusive adquirem outro significado. Ex.: Guarda-chuva.

E também na composição aparece ao menos dois radicais.

 

Tipos de composição

a) Por justaposição: se dá quando dois vocábulos se unem formando um novo, sem que haja perda de elemento. Ex.: Couve-flor.

b) Por aglutinação: é a união de dois radicais em que a palavra sofre alterações. Ex.: Planalto.

 

Uso de Hífen nos compostos

Explicitaremos o assunto através da colocação de Celso Pedro Luft, no grande Manual de Ortografia Globo. Citado por Valter Kehdi:

1- apresentar unidades semântica: a significação global deve ser diferente da significação individual dos elementos constitutivos. Examine-se a título de exemplo o contraste: mesa-redonda/ mesa redonda;

2- Ter consciência dos elementos constitutivos que conservam a realização prosódica normal dos fonemas e acentos. Note-se, por exemplo, os timbres diferentes do o nos contrastes: roda-gigante (com o o aberto)/ rodapé (com o fechado);

3- Serem formas livres os elementos componentes: alça/ / alçapão (de alça e põe) (Kehdi, 37-38).

É claro na disposição dos termos compostos obedece uma seqüência, na qual não pode ser inscrito outro elemento. Ex.: Honesto guarda-civil

                   Guardahonestocivil

É certo que qualquer dos elementos constituintes do composto, não é plausível de substituição onde vier retirado do mesmo. Ex.: fazer auto-relevo

Fazer alto Æ                             Fazer Æ relevo

Sabe-se que os compostos tem formação sintática que foge ao padrão. Ex.: surdo-mudo (há uma junção de 2 substantivos sem o auxilio de uma conjunção).

Entende-se que o composto exemplifica um vocábulo.

Ex.: Comprei um pão-de-ló                     Comprei um pão.

 

Estrutura dos nomes compostos

Há uma grande variação no que diz respeito a estrutura dos vocábulos em português.

1-      Substantivo + substantivo: mãe-pátria;

2-      Substantivo + preposição + substantivo: baba-de-moça

3-      Substantivo + adjetivo: belas-artes;

4-      Adjetivo + adjetivo: surdo-mudo;

5-      Pronome + substantivo: Nosso Senhor

6-      Numeral + substantivo: três-Marias

7-      advérbio + substantivo/ adjetivo/ verbo: benquerença/ sempre-vivas/ be querer.

8-      Verbo + substantivo: lança perfume;

9-      Verbo + (conjunção) + verbo: corre-corre/ leva-e-traz;

10-   Verbo + advérbio: pisa-mansinho;

11-   Um grupo de palavras ou uma frase inteira: Um Deus nos-acuda/ mais vale um toma do que dois darei” (Kehdi , 42-43)

 

Bibliografia

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa, 37ª ed. Rio de Janeiro : Lucerna, 2000.

CAMARA, Jr., Joaquim Mattoso. Estrutura da língua portuguesa, 20ª ed. Petrópolis : Vozes, 1991.

MACAMBIRA, José Rebouças. Português estrutural. 2ª ed. São Paulo : Pioneira, 1978

RIBEIRO, Manoel Pinto. Nova gramática da língua portuguesa. 11ª ed. Rio de Janeiro : Metáfora, 2001.