O PRAZER QUE A LEITURA DE TEXTOS LITERÁRIOS PODE NOS PROPORCIONAR

Rosana Muniz Soares (UERJ)

 

A IMPORTÂNCIA DOS PAIS E DO AMBIENTE FAMILIAR NA FORMAÇÃO DO LEITOR

Considera-se valioso o aprender a ler de “todos” de uma reação para que se possa transformá-la.

Politicamente, esta idéia não é bem aceita pelos governadores desde país, pois ainda se tem a idéia excludente de que somente uma pequena parcela da sociedade – a elite – detém o saber e conseqüentemente, o poder.Então para que formar cidadãos conhecedores, cultos?

Esta problemática perpassa pela história brasileira desde que ela existe.

Contudo, é preciso que se pense em questões que venham minimizar quiçá, equacionar futuramente este fato.Os pais e o ambiente familiar têm papéis importantes na formação do leitor.

Julga-se relevante que os pais devam ter uma preocupação com a formação literária de seus filhos.

É importante que os pais estimulem a leitura das mais variadas formas, sem que haja um momento com hora marcada, caso isto se concretize poderá ocorrer uma obrigatoriedade e não um desejo de leitura por parte de seu filho.

A literatura infantil é importante na vida de todos, desde cedo, pois

sua função básica é de estimular na criança todas as potencialidades latentes em seu ser:despertar em seu espírito uma série de valores (morais); atuar sobre a sua potencialidade psíquica, despertando e desenvolvendo seus dotes de imaginação e gosto artístico, oferecer alimento fecundo a sua imaginação, preparando-a para o conhecimento da realidade circundante e desenvolver sua capacidade expressiva[1].

Encaminhando assim, o leitor para o prazer literário.

Os pais precisam atuar mais na vida literária de seus filhos, devem ser incentivadores nesta difícil mas bela tarefa do estimular a leitura de textos literários. Os pais devem ser “parceiros neste processo”,[2] propiciando aos seus filhos, momentos de leitura sempre que possível.Eles podem: ler livros de literatura infantil à noite, antes dos filhos dormirem; pedir que os filhos escolham alguma história para que lhes contem; pedir que as crianças inventem histórias (oralmente), a partir das que já conhecem; ler junto com seus filhos, a mesma história, dividindo páginas ou capítulos; etc.O importante é que a leitura provoque vôos imaginativos.

A família que tem por costume ler, comprar livros, conversar sobre o que lê favorecerá ao possível desejo literário dos componentes da mesma.

Mesmo em ambientes menos favorecidos economicamente, quando a leitura é uma tônica cultural é possível se conquistar.

Entretanto, pode-se levantar um questionamento a partir das afirmativas anteriores:como incentivar esta prática se a “família não tem relação de intimidade e de prazer com a leitura?”.[3]

Constata-se que “o leitor pode ser formado em qualquer período de sua existência”[4], se for na infância, melhor, mas caso não aconteça o professor, como veremos mais adiante, tem o papel de estimular a prática literária.

Quanto maior estímulo cultural a criança obtiver, mais potencialidades ela pode exteriorizar, ampliando assim, suas chances de se encontrar e se realizar enquanto indivíduo.

Portanto, é necessário que o ambiente onde a criança viva, seja iniciador de uma prática literária, e provocador do prazer, da imaginação e da criação.

 

A RELEVÂNCIA DO PAPEL DO PROFESSOR COMO ESTIMULADOR DO PRAZER LITERÁRIO

O professor, iniciando, ou dando continuidade ao processo de leiturização dos seus alunos, tem uma real responsabilidade nesta aprendizagem.Ele cada vez mais tem de se conscientizar disto e pôr em prática estratégias variadas de leitura, para que os seus aprendizes consigam interiorizar o prazer que o texto proporciona e incorporem em suas vidas estes ensinamentos.

Para que haja a leitura propriamente dita, a da palavra, é preciso que a “leitura do mundo”[5] do aluno seja explorada e valorizada para que ele se sinta mais seguro.

Através das vivências do próprio leitor aumentará sua capacidade de criar símbolos, favorecendo assim o deciframento dos mesmos ao ler.

Acredita-se que a leitura deva ocorrer numa situação onde a experiência do leitor esteja em foco, contextualizando-o e que isto seja uma prática com estratégias variadas.Julga-se também que o “aprendizado da leitura passa por três eixos principais, a saber, 1º- a dependência de indicadores extratextuais; 2º- a dependência de indicadores textuais (portador, formato, organização, tipos de ilustração, pontuação, palavras que se repetem, título, etc.); 3º- decifrado”.[6]

Sem medo de radicalismos:“tradicionalismo”[7] ou “construtivismo”[8] acentuados, o professor deve operacionalizar com os três eixos supracitados.O primeiro é resultado natural da inteligência do sujeito em ação; o terceiro é fruto do ensino escolar.O segundo é tributário dos avanços psicolingüísticos e sociolingüísticos; assim o sujeito em ação obterá resultados mais favoráveis.

O importante na leitura é o leitor em ação interando-se do texto, e este mesmo texto levando-o a outros pensamentos, reportando-o a outros acontecimentos, ajudando-o a resolver situações concretas ou abstratas; é o texto lhe dando prazer.

Para que a criança desenvolva o gosto e a prática literária é preciso que ela seja muito estimulada, como já vimos anteriormente.O professor exerce um papel fundamental nisto.

Essa afirmativa é ressaltada por Fanny Abramovich:

Ler é um prazer.É uma gostosura.Mas para o aluno ser um apaixonado pela leitura, é preciso que o professor também seja.Para poder passar essa sensação de entrar no mundo através do imaginário, do fantástico, da brincadeira, da plenitude.O professor que lê com prazer, com volúpia, com garra, com curiosidade atiçada, com entusiasmo vibrante, terá alunos que também serão grandes leitores.Melhor para todos.[9]

O professor tem a função de mediador no momento de leitura ocorrido em sala de aula.Ele pode incentivar os seus alunos a lerem: os seus desenhos, suas próprias histórias e as de seus colegas, os livros da biblioteca da classe, as obras que forem indicadas, livros trocados em sala pelos alunos, assistindo a um filme/desenho, etc.

Convive-se com o paradoxo:a literatura é útil ou inútil na vida do ser humano?Segundo Barthes, “é a própria inutilidade do texto que é útil”[10], portanto, utiliza-se o prazer do texto através de sua inutilidade, pois quanto maior o número de textos literários lidos, o leitor estimula mais sua imaginação, viaja por caminhos nunca viajados, desperta por soluções não pensadas ainda, redescobre-se, reafirma-se, conhecendo-se.

Piaget nos ensinou que o homem não tem um comportamento inato como, também, suas atitudes não são resultado de condicionamentos.O homem na verdade, apresenta um comportamento construído por ele próprio ao interagir com o meio em que vive.

A partir desta afirmativa, o professor que tem a função de favorecer o desenvolvimento da criança, deve oportunizar em sua sala de aula, situações em que o aluno possa exercitar-se como ser social capaz de utilizar diferentes linguagens para se comunicar e resolver problemas.

O leitor dialoga com o texto e com o autor do mesmo ao lê-lo.Ele em seu pensamento coloca seu saber, sua visão no momento de leitura, questionando, concordando, sofrendo, alegrando-se muitas vezes com o texto, isto é salutar no processo de leiturização.

O autor é aquele que brinca com as palavras; o texto pode ter interpretações imprevisíveis; o leitor a proporção que lê, se constitui, se identifica.

Cada leitor é capaz de elaborar um sentido ao texto, ele compreende de acordo com suas vivências, oportunizando assim a criação de um novo texto, e como o pensamento, que não é puro e nem é acabado, é o texto.

 

AS TRANSFORMAÇÕES POSITIVAS QUE OS TEXTOS LITERÁRIOS PROPORCIONAM AO LEITOR

Ao texto pode-se atribuir o sentido material ou imaginário.O leitor pode percebê-lo como uma espécie de escritura somente, podereduzi-lo ao plano comum, onde o prazer é altamente enganado, substituído, esquecido por simplificações, explicações banais ou ele pode ser algo a se contemplar, a ser sentido, imaginado, renovado ao encontro do indivíduo; incutindo-lhe o prazer.

Somente a leitura de prazer pode levar o indivíduo à crítica.E através da crítica as modificações, sejam internas ou externas, acontecem.

Ouve-se muito falar em Cidadania, no entanto, urge que o Sistema Educacional Brasileiro se modifique realmente em prol da Educação, que as Leis Educacionais priorizemo ensino de qualidade, viabilize estruturalmente uma educação para todos, numa sociedade igualitária, onde as pessoas tenham igualdade de chance, e o saber seja oportunizado e distribuído para que não só a elite seja governante do país, mas sim, todos aqueles que mostrarem competência para administrá-lo, assim se estará pensando no cidadão.

Para Orlandi,

A educação é uma via eficaz para a formação da consciência crítica.Através da leitura se tem acesso ao saber, e pelo domínio do saber pode-se explicitar os mecanismos do funcionamento da sociedade.Duas coisas acontecem:aumenta a autoridade do Estado mas, ao mesmo tempo, se cria a possibilidade da consciência crítica.[11]

O leitor vai se formando no decorrer de sua existência, em suas experiências de interação com o universo natural, cultural e social em que vive.“A leitura é um ato cultural em seu sentido amplo, que não se esgota na educação formal.Deve-se considerar a relação entre o leitor e o conhecimento, assim como a sua reflexão sobre o mundo”.[12]

Percebe-se a necessidade de se questionar a importância do conhecimento legítimo, pois ele não é acabado.Ele é um fazer contínuo, onde o sujeito do ato em questão interage com o objeto a ser conhecido.E essas transformações entre sujeito e objeto são permanentes na busca do conhecimento.O autor Vigotsky deixa isto muito claro em seus estudos sobre a “zona de desenvolvimento proximal”[13], pois o sujeito (ser pensante) interagecom o objeto (algo a conhecer) transformando-se, ampliando e modificando o seu saber.

Ler precisa ser uma prática na vida do ser humano para que ele possa expressar seus sentimentos, suas dúvidas, refletir sobre os acontecimentos gerais e ter uma postura de vida mais saudável e crítica.

Considera-se o prazer do texto como um prazer intelectual, que bem desenvolvido leva o leitor ao autoconhecimento.

É lendo que nos tornamos leitores, nos informamos e formamos ao mesmo tempo, tornamo-nos cidadãos, refletindo, agindo e modificando nossa vida pessoal e a sociedade, buscamos nosso aperfeiçoamento, em prol de nossa melhor qualidade de vida.

 



[1] COELHO, Nelly N.O Ensino da Literatura.Rio de Janeiro:J. Olímpio, 1975, p. 166.

[2] JOLIBERT, Josette.Formando Crianças Leitoras.Porto Alegre:Artes Médicas, 1994, p. 129.

[3] GUEDES, Cilene.Leitura.Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 25 abr. 1999, p. 1.

[4] MERANI, Alberto L.Natureza Humana e Educação.Trad. por Helena L. Santos.Lisboa:Editorial Notícias, 1978,p. 55.

[5] “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele.Linguagem e realidade se prendem dinamicamente, a compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto”. FREIRE, Paulo.A importância do Ato de Ler. São Paulo:Cortez, 1983,p. 11-2.

[6] GROSSI , Esther P. & BORDIN, Jussara.Construtivismo Pós-Piagetiano:Um novo paradigma sobre aprendizagem. Rio de Janeiro:Vozes, 1993, p. 178.

[7] Tradicionalismo:a escola tradicional trabalhava apenas em volta do terceiro eixo.Idem, p. 178.

[8] Construtivismo:as propostas progressistas tendem a supradimensionar o primeiro eixo.Idem, p. 178.

[9] ABRAMOVICH, Fanny.Formato.Catálogo Infantil.Rio de Janeiro, 1999.

[10] BARTHES, Roland.O Prazer do Texto.São Paulo:Perspectiva, 1996, p. 34.

[11] ORLANDI, Eni P.Discurso e Leitura. São Paulo:Cortez, 1996, p. 209.

[12] Idem, p. 210.

[13] VIGOTSKY, L. S.Pensamento e Linguagem.Trad. Jeferson Luis Camargo.São Paulo:Martins Fontes, 1993, p. 121.