POSSIBILIDADES DE USO DA INFORMÁTICA
NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

Wagner Guimarães da Silva Almeida (UERJ)

 

Introdução: a realidade tecnológica

A acelerada expansão da informática que temos vivenciado desde as duas últimas décadas tem sido responsável por transformações significativas nos setores de trabalho e nas relações humanas. No trabalho, desde aqueles setores mais desenvolvidos, onde a aplicação de novos recursos tecnológicos faz-se essencial, até os mais simples, como as atividades que não exigem formação específica, todas atividades parecem incorporar de forma acelerada estes avanços. Assim, todos acabam por sentir os efeitos deste processo, que exige de todos um conhecimento desta nova tecnologia, mas, infelizmente, não possibilita a todos um acesso a ela.

Nas relações humanas, podemos observar como a informática, sobretudo com a Internet, faz com que várias pessoas dediquem horas diárias à busca e troca de informações, ao entretenimento e à realização de diversas atividades através do computador, o que faz com que muitos transformem-no em um substituto de suas relações interpessoais. No entanto, não podemos ignorar que o computador também estimula e otimiza os processos criadores humanos, além de aproximar pessoas, desprezando distancias através da Internet.

Sendo assim, pode-se dizer que a aplicação destes conhecimentos no ensino, seja em que âmbito for, é fundamental para que este acompanhe o dinamismo das atividades humanas contemporâneas, grandemente influenciadas por esta presença marcante da tecnologia. Por isso, a utilização destes recursos nos ensinos fundamental e médio, objeto de estudo deste trabalho, é de grande importância na sobrevivência destes como agentes de inserção e integração social, visto que muitos estudantes vivem de perto essa nova realidade tecnológica.

 

A Informática Educativa

O presente trabalho é um relato de minha experiência como bolsista de Iniciação à Docência do Programa EDAI (Educação com Aplicação da Informática), desenvolvido pelo centro de Educação e Humanidades da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e coordenado pela Professora Beatriz Helena Alcântara Magno da Silva, da Faculdade de Educação da universidade. Este programa beneficia, a cada semestre, estudantes de ensino fundamental e médio de escolas municipais e estaduais localizadas na cidade do Rio de Janeiro, bem como na Baixada Fluminense, onde há um campus da Faculdade de Educação da universidade. Através de um projeto pedagógico, relacionado com o projeto original da escola a que os alunos pertencem, elaborado em conjunto entre o professor da turma e um bolsista do EDAI, os alunos podem exercitar, com o auxílio da informática, o conteúdo de suas disciplinas regulares.

Todas as atividades do projeto são desenvolvidas no laboratório do EDAI, sob a orientação dos bolsistas e com o auxílio dos professores. Durante todo o semestre, estas crianças vão uma vez por semana ao EDAI, onde assistem a aulas em que realizam diversas atividades nos computadores. Através do uso de softwares educativos (específicos para cada disciplina ou interdisciplinares), bem como de aplicativos que, naturalmente, também podem ser usados no ensino, como editores de textos ou de planilhas, elas têm uma oportunidade de estudar de uma forma lúdica e dinâmica, contextualizando o conteúdo aprendido em suas escolas.

Como exemplo das atividades, podemos citar os softwares que se constituem de jogos onde cálculos matemáticos são exigidos para o êxito do jogador; ou os que apresentam fotos e mapas interligados através de hiperlinks, que estimulam a pesquisa no ensino de história ou geografia; ou, no caso do objetivo deste trabalho, os que permitem a construção de jornais, livros ou outros formatos de textos, enfim, práticas de uso da língua portuguesa que irão apresentar um produto final.

Vale ressaltar que a simples substituição do professor pelo computador não é a alternativa apresentada pela Informática Educativa. Na verdade, ela coloca-se como instrumento ou como mecanismo de auxílio na relação ensino-aprendizagem, oferecendo seu dinamismo para a diversificação das possibilidades de interação entre aluno e professor. Além disso, oferece aos alunos a oportunidade de porem em prática o conteúdo das disciplinas estudadas. Como ressalta o professor Arnaldo Niskier, a informática, hoje, tem uma participação muito grande em diversos ramos da atividade humana. Mais que isso, ela é indispensável nas áreas em que é introduzida. Portanto, aplica-la à educação apresenta-se como algo fundamental para uma adaptação do processo educativo às características da sociedade contemporânea. Diante disto, pode-se constatar que a importância de projetos como este, de iniciativa pública, reside não só no fato de possibilitar às crianças um contato com uma tecnologia a qual não podem ignorar, sob pena de sofrerem uma exclusão profissional ou, até mesmo, social. Sua importância também está no oferecimento a estas crianças de um método de ensino lúdico, com a utilização de toda a interatividade e desenvolvimento da criatividade e do raciocínio lógico que a informática apresenta a todos nós, sejamos crianças, jovens ou adultos.

 

Informática e língua portuguesa

um projeto pedagógico

Norteado pelos princípios acima, busquei, em meu projeto com alunos da 7º série do Ensino Fundamental Municipal, criar uma proposta de desenvolvimento criativo da linguagem escrita como uma extensão da fala, que já é plenamente conhecida e desenvolvida pelo aluno. Levei em conta que, como ressalta o ensaísta e autor Domício Proença Filho, “o uso da língua privilegia a comunicação” e:

(...) na base das variações de toda a ordem, está o processo de formação social: a língua está estreitamente ligada à estrutura da sociedade que a utiliza e dos valores adotados por essa sociedade. (...)

O idioma abre-se, em síntese, a inúmeras possibilidades de utilização. Conhecê-las e saber usar, em função das múltiplas situações de fala, as muitas variações que o caracterizam são garantia de permanência e de eficiência na expressão e comunicação de nossos pensamentos, sentimentos e ações, como indivíduos, como seres sociais e cidadãos.

Diante disso, procurei utilizar a informática como ferramenta para a pesquisa e elaboração de textos pelos próprios alunos. Todas as atividades tiveram como objetivo a reflexão sobre a língua portuguesa em seu uso escrito, fosse em um texto jornalístico informativo, em uma crônica de jornal ou em um texto de ficção.

Os alunos foram avaliados o tempo todo enquanto produziam os textos. A avaliação não se limitou a princípios normativos da gramática, mas considerou o potencial inato de uso da língua por parte dos alunos, procurando entender o porquê dos “erros” e levando os alunos a descobrirem por si mesmos as melhores formas de corrigi-los.

 

Algumas possibilidades

O editor de textos

Na primeira aula do projeto, utilizei apenas um editor de textos (Word), pedindo que os alunos produzissem um texto tendo como ponto de partida suas observações sobre três vídeos, de um minuto de duração cada, com temas variados, exibidos no início da aula. Nas aulas seguintes, utilizei o Power point que, embora não seja destinado basicamente à edição de textos, pode ser usado com este fim e ainda dispõe do recurso adicional de uma formatação de figuras mais elaborada e mais fácil. Durante estas aulas, os alunos realizaram trabalhos a partir de textos de jornais impressos e também retirados da Internet.

A elaboração de textos foi orientada de modo que os alunos puderam sentir-se à vontade, realizando-se, inicialmente, sem preocupações com erros gramaticais. Na avaliação, uma análise da capacidade escrita do estudante ao final da tarefa observava sua intimidade com a máquina e sua desenvoltura para escrever sobre diversos temas, sobre muitos dos quais é sabido que são capazes de falar.

As dificuldades na utilização dos recursos do aplicativo, naturalmente, interferiram no processo de escrita no processo de escrita. No entanto, as possibilidades de criação foram dinamizadas à medida que eles iam familiarizando-se com estes recursos, o que sucedeu rapidamente. Além disso, os alunos descobriram que, com a diversidade de tipos, tamanhos e cores das letras poderiam deixar personalizar de forma mais acentuada seus textos. Ou seja, essas descobertas aliadas à possibilidade de escrever livremente, não tendo os vídeos necessariamente como tema, mas como um auxílio ao processo criativo, aproxima-os de um relacionamento mais lúdico com a escrita:

A escrita de textos utilizando o processamento de textos pode significar uma melhoria na qualidade e na quantidade de escrita produzida pelas crianças. A facilidade com que o texto pode ser escrito, corrigido, melhorado, encoraja a escrita de textos mais extensos do que utilizando lápis e papel. Saber como o texto pode ser facilmente manipulado encoraja as crianças a transformarem suas idéias em palavras. (...) O estilo da escrita, feito até nossos dias, deverá ser complementado com experiências de utilização do processamento de texto de modo que os alunos possam concentrar a sua atenção no conteúdo e no estilo. Reescrever pode transformar-se numa actividade fácil e agradável. (BELCHIOR, 1993)

Sobre os corretores ortográficos dos editores de texto, vale dizer que representam controverso objeto de estudo. Eles encarregam-se de marcar todos estes erros diante dos alunos, que, obviamente os corrigem sem, talvez, aprender porque erraram. Porém, desativar esses corretores não se mostra como uma solução para este problema, visto que muitos erros são ocasionados por falhas de digitação, por falta de habilidade no uso do teclado ou por simples falta de atenção. Sem os corretores, os alunos acabariam por escrever textos sem sentido e nem se dariam conta disso. Por isso, acredito que o corretor ortográfico traga mais benefícios do que malefícios à pratica da escrita pelos alunos, e até estimula a reflexão sobre o que estão escrevendo.

Portanto, acredito que estes representem por si só um interessante objeto de pesquisa, visto que o erro é, obviamente, comum em qualquer âmbito de aprendizagem, o que não é diferente no ensino de língua.

 

Os softwares educativos

Muitos dos softwares educativos dedicados à língua portuguesa, bem como muitos materiais didáticos, infelizmente, tendem a ser normativos, não explorando o potencial criador do aluno a partir de sua relação natural com a língua. Portanto, optei por trabalhar com aqueles softwares destinados à produção textual e não a um simples teste de conhecimento de regras gramaticais, o que não significa que este tipo de abordagem não tenha também sua efetividade. Dentre eles, o que me despertou a atenção foi o Story Book, que permite a produção de livros virtuais, ilustrados com desenhos feitos pelas crianças ou com as inúmeras figuras de temas variados contidas no próprio software. Além disso, o programa oferece uma infinidade de efeitos sonoros e músicas para enriquecer o trabalho.

Com este software, os alunos foram orientados para a elaboração de um livro virtual, tendo como tema suas próprias vidas, seus cotidianos, suas famílias, ou seja, puderam utilizar a língua portuguesa de modo a falar sobre si mesmos. Além disso, construíram um texto auxiliado por imagens, que tanto conhecem como recurso de comunicação, sobretudo através da televisão.

 

A Internet

Considerando-se a enorme quantidade de informações dos mais variados campos do conhecimento humano contidas na Internet, não há a menor dúvida de que ela é de grande importância para um projeto pedagógico deste tipo. Sobretudo se levarmos em conta que se trata de um meio de comunicação tão difundido atualmente, inclusive por muitas crianças que, em alguns casos, utilizam seus recursos com muito mais desenvoltura do que seus próprios pais. E mais: são capazes de observar estas informações, refletir sobre elas e até produzi-las, como afirma o consultor e cientista social Don Tapscott:

Quando estão on-line, as crianças lêem, analisam, contextualizam, criticam e compõem seus pensamentos. Estamos assistindo ao nascimento de uma geração de jovens inovadores, antenados, entendedores do poder da mídia, que aprendem por meio da interação. A informação não é apenas consumida. Ela também é produzida pelos jovens. (TAPSCOTT, 2000)

Talvez o consultor esteja superestimando o potencial formador de consciência crítica da Internet, mas há que se reconhecer que ele existe. Além disso, a dinamização da sociedade atual precisa ser incorporada à pratica educacional pois ela é parte da vida destes estudantes e interfere em seu cotidiano e, até mesmo, em sua forma de pensar, agir e falar. Como afirma artigo da revista Veja: “o raciocínio da garotada é fragmentado, ou seja, muda de foco com uma rapidez impressionante. Por essa razão, nunca uma ferramenta de apoio pedagógico se mostrou tão adequada ao ritmo dos jovens quanto a Internet. Baseado nisto, o trabalho que desenvolvi consistiu em um estímulo à pesquisa, direcionada ou de tema livre, na Internet, em sites de informação, tais como de jornais e revistas originalmente impressos ou de jornais essencialmente virtuais. A partir da observação destes sites em conjunto com os alunos, pudemos discutir sobre as vantagens deste veículo de informação sobre os tradicionais, entre elas a capacidade de um maior armazenamento de dados e uma maior velocidade na renovação das informações. Podemos ainda constatar, comparando-se a Internet com a televisão, que a vantagem daquela sobre esta reside no fato de que pode disponibilizar os mesmos dados ininterruptamente e com facilidade de atualização, oferecendo a seu usuário a opção de uma informação muito mais específica.

Porém, sempre haverá o perigo de a criança fazer da Internet um substituto dos recursos tradicionais de ensino, e não um recurso adicional. Como exemplo disto, temos a declaração de uma menina de 10 anos no artigo citado anteriormente, onde, falando sobre os livros, disse: “eles são um complemento do que encontro na Internet”.

No entanto, parece que os benefícios da Internet são muitos e, mais do que isso, seus efeitos são intensos e irreversíveis. Portanto, devemos procurar meios e estratégias para utilizá-la na educação de modo aproveitar ao máximo estes benefícios.

Dentro do meu trabalho, o que fiz foi deixar os alunos livres para “navegar” em sites de notícias e de entretenimento, observando o comportamento deles e como reagiam aos links e ao movimento de tantas informações. Em seguida, pedi que elaborassem textos fazendo análises críticas sobre o que haviam pesquisado.

 

Bibliografia

BELCHIOR, Margarida et alli. As novas tecnologias da informação no 1º ciclo do ensino básico. Lisboa : Gabinete de Estudos e Planejamento, Ministério da Educação, 1993.

OLIVEIRA, Ramon de. Informática educativa: Dos planos e discursos à sala de aula. Campinas : Papirus, 1997.

FERNANDES, Manoel. Lição ou lazer? In: Veja. Rio de Jan eiro: Abril, 2000..