PERSPECTIVA DE ATUALIZAÇÃO LINGÜÍSTICA

EM VITA NUOVA DE DANTE ALIGHIERI

Alcebíades Martins Arêas (UERJ)

Délia Cambeiro (UERJ)

 

LABORATÓRIO LITERÁRIO

O diálogo imprescindível com a Teoria Literária

Para que a análise e a apreensão de um texto literário não se transformem num jogo de xadrez precisam ser encaminhadas por uma base teórica, para que se chegue através da discussão objetiva à subjetividade da obra.

Como professora de Literatura Italiana, sempre preocupada com a philia dialógica, harmônica e includente, referimo-nos ao método - do grego methodos: ‘caminho para chegar a um fim’- a ser adotado na investigação do texto, objetivando sempre desvencilhá-lo de qualquer enfoque minimizador do processo simbólico, o que nos levaria a lugar nenhum. Além da Teoria Literária, no caso específico de Literatura Italiana medieval, o estudo de particulares fenômenos do antigo italiano precisa também ser auxiliado, dentre outras ciências, pela Lingüística, pela Gramática Histórica, pela Filologia e pela Teoria da Tradução. Esta última, porém, em seu enfoque intratextual, ou seja, na atualização da estrutura gramatical e do léxico da época.

Ao longo do curso de Literatura Italiana medieval, preocuparam-nos problemas de ordem metodológica durante o estudo de Vita Nuova de Dante Alighieri, devido a causas externas ao texto e ligadas à vida particular do célebre escritor florentino já bem divulgadas por manuais, pois atraíam a atenção do alunado de forma surpreendente. De fato, Vita Nuova insinua em seu interior detalhes do amor do poeta por Beatriz Portinari - o que para tantos é um enigma - e isso desvia o olhar investigador da importância poética da obra para o atalho do dado biográfico.

Muito já se explorou da biografia de autores, não se estabelecendo diferença entre criação poética e experiência particular. Sabemos que situações referentes à realidade imediata podem contribuir para a compreensão de certas vivências experimentadas e traduzidas em arte por um poeta. Porém, seria danoso à percepção estética se a obra literária - de âmbito universal e atemporal - fosse referendada pela vida particular do escritor, de cunho claramente limitado. Mas, essa tentação de centralizar a leitura do fenômeno literário no autor não é restrito a quem se inicia nas disciplinas literárias.

Convém lembrar e enfatizar, como o fazemos sempre durante as aulas, que a História e a Crítica Literárias ganharam forma moderna no século XIX com o Romantismo que sucedeu ao método dogmático do XVIII e desenvolveu outra concepção do homem, modificando o pensamento abstrato e imutável da ordem clássica. No século XIX, firmou-se o nome de Sainte-Beuve (1804-1868) com o chamado método biográfico que consistia na tentativa de aliar elementos da vida do autor - o gênio produtor do texto - à obra. Para aquele crítico francês, literatura e homem eram um corpo indiviso, portanto autor e texto estavam intimamente ligados, sendo quase impossível desvincularem-se criticamente. Assim, a biografia ganhou um valor especial, concentrando-se sobre a figura do escritor o foco crítico. Tal crítica propunha, evidentemente a partir dos textos, traços característicos da individualidade do artista, tentando integrá-lo a um determinado grupo, de acordo com caracteres psicológicos e morais. Fica evidente que esse método de investigação literária adotava uma explicação causalista e genética dos fenômenos psicológicos observados e descritos na obra.

Durante o curso, os estudantes da Literatura Italiana I são orientados para que desenvolvam reflexões sobre tal período da crítica, aqui citado apenas com valor de esclarecimento prático. O que pretendemos, seja ao iniciar o curso seja neste primeiro segmento do trabalho é separar o joio do “achismo” e o trigo da Teoria Literária, ou melhor, queremos elucidar que, mesmo quando o texto evoque informações pessoais do autor, assinalando com certa evidência para sua biografia, isto não deve jamais nortear a análise simbólica da obra. O factual não pode determinar, em se tratando de Literatura, o caminho crítico a ser empreendido, pois dados biográficos não impõem valor à obra. Eles podem, eventualmente, ilustrá-la, nunca explicá-la, já que o juízo e critério de valor da obra concentram-se na ultrapassagem do dado imediato, do factual ou do anedótico - tal termo entendido como algo curioso.

Ressaltamos, ainda, a diferença entre história pessoal e texto literário e sua ligação com a Teoria Literária. A primeira se ocupa de um pretérito reconstituível através de vestígios ainda subsistentes através de documentos e testemunhos de vária ordem que os ilustre, mas esse passado situa-se irremediavelmente num tempo transcorrido, impossível de se renovar. Já o texto literário, mesmo pertencendo ao passado, um passado distante, coberto de preconceitos históricos e tão mal estudado como, por exemplo, a Idade Média, possui uma essência dinâmica, viva, pois é plurissignificativo e acima de tudo atemporal.

Os conhecimentos mostram-se diversos pelo fato de a crítica literária visar a elementos supra-individuais. Certas “coincidências”, portanto, podem funcionar apenas como curiosidades, fatos interessantes e curiosos, como já assinalamos, jamais como método de análise da obra, confirmando que tal escritor criou tal obra por ter passado por esta ou aquela vivência. Se isso fosse atestado de competência artística, todos nós seríamos poetas.

 

Uma brevíssima visada biográfica.

Não pretendemos repetir neste artigo estudos do passado que priorizavam tais normas de abordagem da obra, gostaríamos apenas de lançar uma visada desinteressada sobre dados particulares do autor da Divina Comédia.

Confirmam seus biógrafos que o florentino Dante (diminutivo de Durante) Alighieri (1265-1321) adquiriu desde jovem sólida formação cultural e particular interesse pela poesia. Teve Brunetto Latini como guia do intelecto e do espírito e como amigo o não menos famoso poeta Guido Cavalcanti (1255-1300), considerado o mais original dos poetas do dolce stil novo depois de Dante. Porém, o detalhe que mais desperta curiosidade e fascínio sobre sua vida é, sem dúvida, sua paixão por Beatrice ou Bice Portinari, mulher de Simone dei Bardi, mais tarde, personagem da Commedia e que o poeta tem como guia para chegar ao Paraíso.

Para alguns, Dante teria idealizado a mulher amada segundo princípios do stil novo descrevendo-a como um espírito celeste enviado à Terra para purificá-lo e aproximá-lo de Deus. Segundo comentários biográficos, com a prematura morte de Beatriz, o poeta caiu em profundo desconforto espiritual encontrando apoio no estudo da filosofia e na participação política que lhe causou longo e definitivo afastamento de Firenze. Percorreu em exílio várias casas senhoriais italianas, entre elas a de Cangrande della Scala, a quem dedicou o Inferno, morrendo o poeta em Ravena.

Além da célebre Divina Commedia, destacam-se ainda dentre suas obras: Convivio, De vulgari eloquentia, Monarchia, Rime, Epistole, Egloghe e Vita nuova, sobre a qual refletiremos neste trabalho em termos literários e de história da língua.

 

Vita Nuova: experiência amorosa e poética.

De fato, a obra Vita nuova insinua passagens do amor platônico de Dante por Beatriz, mas que se eternizou em poesia considerada como a mais alta experiência poética do dolce stil novo. Além disso, ao transformar o mundo particular em arte, o poeta universalizou o tema do amor, transformando-o em matéria de reflexão atemporal da existência humana.

Por vários anos, muito já se discutiu a respeito da obra objetivando-se esclarecer se, de fato, Beatriz existiu ou se foi uma criação intelectual resultante de idéias stilnovísticas plenas de simbólicas figuras imateriais. Questionou-se, ainda, a possibilidade de a obra comportar fatos reais, porém interpretados em instância poética do amor ascético próprio daquela escola em vigor. Figura histórica ou não o resultado dessa imaginação tem como fonte um estado de poesia latente no mundo particular do escritor, não nos interessando a verossimilhança mas a possibilidade artística do estado em que se imaginava ser e estar.

Outra possibilidade apontada é a de Vita nuova simbolizar a iniciação do jovem poeta e intelectual. Hoje, entretanto, concluem os pesquisadores que a obra sugere a transfiguração poética de experiências reais, trabalhadas porém com a mais alta conclusão da psicologia amorosa stilnovística, sendo ponto de partida da evolução espiritual e artística de Dante.

Criação da juventude do poeta florentino, a obra constitui-se de 42 capítulos em prosa e em versos, estrutura já existente na tradição medieval e que remonta a De consolatione philosophiae de Boecio. O título simboliza a vida renovada, iluminada e purificada pelo amor princípio encontrado na poesia provençal. Em verdade, Dante não pretendia narrar sua biografia da juventude nem fazer uma crônica de vida ou obra memorialista, mas sim, reevocar da memória a miraculosa experiência que marcou definitivamente seu interior e que lhe proporcionou matéria suficientemente profunda para o fazer poético. Por isso, certamente, escolheu e dispôs na estrutura da obra as composições líricas que se referem àquela experiência encantadora. Nela está, velada em poesia, a misteriosa história do amor de Dante por Beatriz, iniciada quando ele tinha 9 anos e concluída com a morte da amada.

A prosa descreve a singular experiência comentando e aprofundando o sentido dos poemas escritos precedentemente e que aparecem intercalados em meio aos relatos. Constitui, enfim, a explanação ou comentário dos versos e, ao mesmo tempo, desenha a trama em que se organizam, de modo a constituírem uma “história”. Devemos ressaltar que, na obra, a prosa não possui apenas valor explicativo ou narrativo, não “conta” uma história - o que dissiparia a atmosfera lírica da composição. Ela é o fio condutor, faz parte de uma ambiência lírica preponderante, compondo um todo harmônico e indiviso.

Se o leitor virtual ou o estudante quiser amalgamar a vida com a obra de Dante poderá acompanhar a descoberta poética do ilustre florentino entendendo que a composição dos poemas é provocada pelo sentimento de êxtase causado pelo reencontro e pela saudação da amada após 9 anos sem vê-la. Ainda sobre o mesmo ângulo de interpretação, e recorrendo ao capítulo XXIII em que aparece o nome de Beatriz, podemos intuir que, talvez o temor de ela ser reconhecida, vulgarizando sua imagem intocável, maculando o sagrado contido naquele sentimento singular, tenha inspirado o poeta a desviar a atenção do objeto histórico de seu sentimento. Assim, Beatriz torna-se um objeto lírico nomeado la donna dello schermo, ou seja, “a mulher da tela”.

Tomado de profundo amor, após esse breve reencontro, dirige à amada sua devotada admiração e exprime, em versos, contrastantes sentimentos plenos de amor e de perplexidade. É interessante ressaltar os subterfúgios utilizados no argumento poético para velar o objeto causador de poesia, já comentados anteriormente. Para impedir que outros pudessem reconhecê-lo “finge” ter-se inamorado primeiro de uma mulher que parte da cidade - a primeira donna dello schermo - e em seguida de uma outra, chamada também de la donna dello schermo.

Para que a compreensão da obra fique isenta de qualquer “contaminação” biográfica, o leitor virtual e/ou o estudante de Literatura medieval Italiana devem-se pautar pela idéia de que o sentimento experimentado em relação àquela mulher certamente levou o poeta à indagação e à busca de maior clareza para descobrir a verdadeira espécie e essência do amor. Nesse processo de descoberta interior, Dante autor, através da inspiração poética, derrama a descoberta amorosa na instância lírica do Eu poético. Parece procurar nele mesmo os motivos de sua felicidade interior e traduz em versos o milagre operado por Beatriz em seu espírito.

A morte da donna dello schermo, sua musa inspiradora, é prenunciada por um delírio, causando profundo estado de desespero ao Eu lírico. Aparece-lhe em sonho o objeto amado, lastimando-se do esquecimento a que foi relegado. Dominado pela presença da desejada figura, entretanto, após uma visão encantatória, o Eu lírico decide falar de sua dama apenas da forma mais digna possível.

Situando cronologicamente a obra, os pesquisadores calculam que Vita nuova tenha sido escrita por volta de 1292 ou pouco depois. As poesias foram compostas de 1283 a 1292 e os especialistas reconhecem nos primeiros sonetos de Dante a trilha do amigo Guido Cavalcanti, porém, com a canção “Donne che avete intelletto d’amore” já se aproxima de Guido Guinizelli (1230-1276) il padre degli stilnovisti. Com isso, não se configura apenas uma mudança de orientação, nem a imitação sem criatividade, ao contrário, insinua-se uma dinâmica experiência espiritual e uma evolução poética mais autêntica e original.

A partir desse novo aspecto, também o tema do amor se resolve em atmosfera de beatitude e de graça, em motivo de salvação e de redenção. Os poemas assumem uma doce ambiência estética de lauda, que na Itália do século XIII era uma representação dramática ligada ao ritual litúrgico católico, conferindo ao lírico objeto de amor contornos de anjo enviado para a salvação de quem tiver a graça de conhecê-lo. Permite tal composição torná-la a mediadora entre o mundo do espírito e o material, o símbolo supremo de uma felicidade sobre-humana, digna de alçá-lo às dimensões paradisíacas.

Esperamos que esta breve introdução oriente o estudante de Literatura Italiana em todos os outros níveis de estudo da Literatura Italiana e não só para o texto do período medieval.

A seguir, nossa reflexão sobre o diálogo entre Teoria Literária e Literatura italiana é complementada por uma análise lingüística, histórica e filológica da Língua Italiana medieval do professor coordenador do projeto de atualização lingüística de textos antigos italianos das origens ao século XIII.

 

LABORATÓRIO FILOLÓGICO

Apresentação do texto original

Appresso ciò per pochi dì avvenne che in alcuna parte de la mia persona mi giunse una dolorosa infermitate onde io continuamente soffersi per nove dì amarissima pena; la quale mi condusse a tanta debolezza, che me convenia stare come coloro li quali non si possono muovere. Io dico che ne lo nono giorno, sentendome dolere quasi intollerabilmente, a me giunse uno pensero lo quale era de la mia donna. E quando ei pensato alquanto di lei, ed io ritornai pensando a la mia debilitata vita; e veggendo come leggiero era lo suo durare, ancora che sana fosse, sì cominciai a piangere fra me stesso di tanta miseria. Onde, sospirando forte, dicea fra me medesimo: "Di necessitade convene che la gentilissima Beatrice alcuna volta si muoia. E però mi giunse uno sì forte smarrimento, che chiusi li occhi e cominciai a travagliare sì come farnetica persona ed a imaginare in questo modo: che ne lo incominciamento de lo errare che fece la mia fantasia, apparvero a me certi visi di donne scapigliate, che mi diceano: "Tu pur morrai"; e poi, dopo queste donne, m'apparvero certi visi diversi e orribili a vedere, li quali mi diceano: "Tu se' morto". Così cominciando ad errare la mia fantasia, venni a quello ch'io non sapea ove io mi fosse; e vedere mi parea donne andare scapigliate piangendo per via, maravigliosamente triste; e pareami vedere lo sole oscurare, sì che le stelle si mostravano di colore ch'elle mi faceano giudicare che piangessero; e pareami che li uccelli volando per l'aria cadessero morti, e che fossero grandissimi tremuoti. E maravigliandomi in cotale fantasia, e paventando assai, imaginai alcuno amico che mi venisse a dire: "Or non sai? La tua mirabile donna è partita di questo secolo". Allora cominciai a piangere molto pietosamente; e non solamente piangea ne la imaginazione, ma piangea com li occhi, baganandoli di vere lagrime. Io imaginava di guardare verso lo cielo, e pareami vedere moltitudine d'angeli li quali tornassero in suso, ed aveano dinanzi da loro una nubuletta bianchissima. A me parea che questi angeli cantassero gloriosamente, e le parole del loro canto mi parea udire che fossero queste: Osanna in excelsis; e altro non mi parea udire. Allora mi parea che lo cuore, ove era tanto amore, mi dicesse: "Vero è che morta giace la nostra donna". E per questo mi parea andare per vedere lo corpo ne lo quale era stata quella nobilissima e beata anima; e fue sì forte la erronea fantasia, che mi mostrò questa donna morta: e preami che donne la covrissero, cioè la sua testa, com uno bianco velo; e pareami che la sua faccia avesse tanto aspetto d'umilitade, che parea che dicesse: "Io sono a vedere lo principio de la pace". In questa imaginazione mi giunse tanta umilitade per vedere lei, che io chiamava la Morte, e dicea: "Dolcissima Morte, vieni a me, e non m'essere villana, però che tu dei essere gentile, in tal parte se' stata! Or vieni a me, che molto ti desidero; e tu lo vedi, ché io porto già lo tuo colore". E quando io avea veduto compiere tutti li dolorosi mestieri che a le corpora de li morti s'usano di fare, mi parea tornare ne la mia camera, e quivi mi parea guardare verso lo cielo; e sì forte era la mia imaginazione, che piangendo incominciai a dire com verace voce: "Oi anima bellissima, come è beato colui che ti vede!". E dicendo io queste parole con doloroso singulto di pianto, e chiamando la Morte che venisse a me, una donna giovane e gentile, la quale era lungo lo mio letto, credendo che lo mio piangere e le mie parole fossero solamente per lo dolore de la mia infermitade, con grande paura cominciò a piangere. Onde altre donne che per la camera erano s'accorsero di me, che io piangea, per lo pianto che vedeano fare a questa; onde faccendo lei partire da me, la quale era meco di propinquissima sanguinitade congiunta, elle si trassero verso me per isvegliarmi, credendo che io sognasse, e diceanmi: "Non dormire più", e "Non ti sconfortare". E parlandomi così, si mi cessò la forte fantasia entro in quello punto ch'io volea dicere: "O Beatrice, benedetta sie tu", e già detto avea "O Beatrice", quando riscotendomi apersi li occhi, e vidi che io era ingannato. E com tutto che io chiamasse questo nome, la mia voce era sì rotta dal singulto del piangere, che queste donne non mi pottero intendere, secondo il mio parere; e avvegna che io vergognasse molto, tuttavia per alcuno ammonimento d'Amore mi rivolsi a loro. E quando mi videro, cominciaro a dire: "Questi pare morto", e a dire tra loro: "Proccuriamo di confortarlo"; onde molte parole mi diceano da confortarmi, e talora mi domandavano di che io avesse avuto paura. Onde io, essendo alquanto riconfortato, e conosciuto lo fallace imaginare, rispuosi a loro: "Io vi diroe quello ch'in hoe avuto". Allora, cominciandomi dal principio infino a la fine, dissi loro quello che veduto avea, tacendo lo nome di questa gentilissima. Onde poi, sanato di questa infermitade, propuosi di dire parole di questo che m'era addivenuto, però che mi parea che fosse amorosa cosa da udire: e però ne dissi questa canzone: Donna pietosa e di novella etate, ordinata sì come manifesta la infrascritta divisione.

Donna pietosa e di novella etate,

adorna assai di gentilezza umane,

ch'era là 'v'io chiamava spesso Morte,

veggendo li occhi miei pien di pietate,

e ascoltando le parole vane,

si mosse com paura a pianger forte.

E altre donne, che si fuoro accorte

di me per quella che meco piangia,

fecer lei partir via,

e appressarsi per farmi sentire.

Qual dicea: "Non dormire",

e qual dicea: "Perché sì ti sconfortate?".

allor lassai la nova fantasia,

chiamando il nome de la donna mia.

Era voce mia sì dolorosa

e rotta sì da l'angoscia del pianto,

ch'io solo intesi il nome nel mio core;

e com tutta la vista vergognosa

ch'era nel viso mio giunta cotanto,

mi fece verso lor volgere Amore.

Elli era tale a veder mio colore,

che facea ragionar di morte altrui:

"Deh, consoliam costui

pregava l'una l'altra umilemente:

e dicevan sovente:

"Che vedestù, che tu non hai valore ?"

E quando un poco confortato fui,

Io dissi: "Donne, dicerollo a vui.

Mentr'io pensava la mia frale vita,

E vedea 'l suo durar com'è leggiero,

piansemi Amor nel core, ove dimora:

per che l'anima mia fu sì smarrita,

che sospirando dicea nel pensero:

- Ben converrà che la mia donna mora. -

Io presi tanto smarrimento allora,

ch'io chiusi li occhi vilmente gravati,

e furon sì smagati

li spirti miei, che ciascun giva errando;

e poscia imaginando,

di caunoscenza e di verità fora,

visi di donne m'apparver crucciati,

che mi dicean pur: - Morra' ti, morra' ti. -

Poi vidi cose dubitose molte,

nel vano imaginare ov'io entrai;

ed esser mi parea non so in qual loco,

e veder donne andar per via disciolte,

qual lagrimando, e qual traendo guai,

che di tristizia saettavan foco.

Poi mi parve vedere a poco a poco

Turbar lo ssole e apparir la stella,

e pianger elli ed ella;

cader li augelli volando per l'are,

e la terra tremare;

ed omo apparve scolorito e fioco,

dicendomi: - Che fai? non sai novella?

Morta è la donna tua, ch'era sì bella. -

Levava li occhi miei bagnati in pianti,

e vrdea, che parean pioggia di manna,

li angeli che tornavan suso in cielo,

e una nuvoletta avean davanti,

dopo la qual gridavn tutti: Osanna;

e s'altro avesser detto, a voi dire' lo.

Allor diceva Amor: - Più nol ti celo;

vieni a veder nostra donne che giace. -

Lo imaginar fallace

mi condusse a veder madonna morta;

e quand'io l'avea scorta,

vedea che donne la covrian d'un velo;

ed avea seco umilità verace,

che parea che dicesse: - Io sono in pace. -

Io divenia nel dolor sì umile,

veggendo in lei tanta umiltà formata,

ch'io dicea: - Morte, assai dolce ti tegno;

tu dei ormai esser cosa gentile,

poi che tu se' ne la mia donna stata,

e dei aver pietate e non disdegno.

Vedi che sì desideroso vegno

d'esser de' tuoi, ch'io ti somiglio in fede.

Vieni, ché 'l cor te chiede. -

Poi mi partia, consumato ogne duolo;

e quand'io era solo,

dicea, guardando verso l'alto regno:

- Beato, anima bella, chi te vede! -

Voi mi chiamaste allor, vostra merzede".

Questa canzone ha due parti: ne la prima dico, parlando a indiffinita persona, come io fui levato d'una vana fantasia da certe donne, e come promisi loro di dirla; ne la seconda dico come io dissi a loro. La seconda comincia quivi: Mentr'io pensava. La prima parte si divide in due: ne la prima dico quello che certe donne, e che una sola, dissero e fecero per la mia fantasia quanto è dianzi che io fossi tornato in verace condizione; ne la seconda dico quello che queste donne dissero poi che io lasciai questo farneticare; e comincia questa parte quivi: Era la voce mia. Poscia quando dico: Mentr'io pensava, dico come io dissi loro questa mia imaginazione. Ed intorno a ciò foe due parti: ne la prima dico per ordine questa imaginazione; ne la seconda, decendo a che ora mi chiamaro, le ringrazio chiusamente; e comincia quivi questa parte: Voi mi chiamaste.

ALIGHIERI, Dante. Vita Nuova. Milano : Feltrinelli, cap. XXIII, p. 115-124, 1993.

 

Atualização lingüística do texto original

Appresso ciò per pochi dì avvenne che in alcuna parte della mia persona mi giunse una dolorosa infermità che mi ha fatto soffrire continuamente per nove dì amarissima pena. Questa infermità mi condusse a tanta debolezza che sono stato costretto a non muovermi. Io dico che nel nono giorno, sentivo un dolore quasi intollerabile e allora mi giunse un pensiero che la cusa di questa malattia potesse essere la mia donna. E pensando molto a lei e alla mia debilitata vita, vide quanto leggero il suo durare, anche se fosse sana, e così cominciai a piangere fra me stesso di tanta miseria. Allora, sospirando forte, dicevo fra me medesimo: "Sarebbe inevitabile che la gentilissima Beatrice un giorno o l'altro morisse". E però mi giunse un smarrimento così forte che chiusi gli occhi e cominciai a soffrire come farnetica persona ed a immaginare in questo modo: che nell' incominciamento dell 'errare che fece la mia fantasia apparvero a me certi visi di donne scapigliate che mi dicevano: "Tu pur morrai"; e poi, dopo queste donne, m'apparvero certi visi diversi e orribili a vedere, i quali mi dicevano: "Tu sei morto". Così cominciando ad errare la mia fantasia, successe ch'io non sapevo dove io mi trovassi. Mi sembrava di vedere donne andare scapigliate piangendo per via, meravigliosamente tristi; mi pareva di vedere il sole oscurare, tanto che le stelle si mostravano di un colore che mi facevano giudicare che piangessero; mi pareva che gli uccelli volando per l'aria cadessero morti e che fossero grandissimi terremoti. E meravigliandomi in cotale fantasia, molto spaventato, ebbi la visione di alcuno amico che mi venisse a dire: "Or non sai? La tua mirabile donna è partita di questo secolo". Allora cominciai a piangere molto pietosamente; e non solamente piangeva nella immaginazione ma piangeva con gli occhi, baganandoli di vere lacrime. Io immaginavo di guardare verso il cielo e mi pareva di vedere moltitudine d'angeli i quali tornassero in su, ed avevano dinanzi a loro una nuvoletta bianchissima. A me pareva che questi angeli cantassero gloriosamente, e le parole del loro canto mi pareva udire che fossero queste: Osanna in excelsis; e altro non mi pareva udire. Allora mi pareva che il cuore, in cui c'era tanto amore, mi dicesse: "Vero è che morta giace la nostra donna". E per questo mi pareva di andare per vedere il corpo nel quale era stata quella nobilissima e beata anima, e fu sì forte l' erronea fantasia che mi mostrò questa donna morta. Mi pareva che donne la coprissero, cioè la sua testa, con un bianco velo; e mi pareva che la sua faccia avesse tanto aspetto d'umiltà che pareva che dicesse: "Io sono a vedere il principio della pace". In questa immaginazione mi giunse tanta umiltà per vedere lei che io chiamavo la Morte e dicevo: "Dolcissima Morte, vieni a me, e non m'essere villana, sii gentile, in tal parte sei stata! Or vieni a me, che molto ti desidero; e tu lo vedi, perché io porto già il tuo colore". E quando io avevo veduto compiere tutti i dolorosi mestieri che alle corpora dei morti s'usano di fare, mi pareva di tornare nella mia camera e lì mi pareva di guardare verso il cielo. La mia immaginazione era così forte che, piangendo, cominciai a dire con verace voce: "Oi anima bellissima, come è beato colui che ti vede!". E dicendo io queste parole con doloroso singulto di pianto, e chiamando la Morte che venisse a me, una donna giovane e gentile che era lungo il mio letto, credendo che il mio piangere e le mie parole fossero solamente per il dolore della mia infermità, con grande paura cominciò a piangere. Allora, altre donne che per la camera erano, s'accorsero di me, che io piangevo per il pianto che vedevano fare a questa; faccendo lei partire da me, la quale era di me di propinquissima sanguinità congiunta, esse si trassero verso me per svegliarmi, credendo che io sognasse e mi dicevano: "Non dormire più", e "Non ti sconfortare". E parlandomi così, si mi cessò la forte fantasia fino a quel punto ch'io volevo dire: "O Beatrice, benedetta sii tu", e già detto avevo "O Beatrice", quando riscotendomi apersi gli occhi e vidi che io ero ingannato. E con tutto che io chiamasse questo nome, la mia voce era sì rotta dal singulto del piangere che queste donne non mi poterono intendere, secondo il mio parere; mi vergognai molto, tuttavia per alcuno ammonimento d'Amore mi rivolsi a loro. E quando mi videro, cominciaro a dire: "Questi pare morto", e a dire tra loro: "Cerchiamo di confortarlo"; e , allora, molte parole mi dicevano da confortarmi, e talora mi domandavano di che cosa io avesse avuto paura. Io, essendo alquanto riconfortato, e conosciuto il fallace immaginare, risposi a loro: "Io vi dirò quello che ho avuto". Allora, cominciando dal principio fino alla fine, dissi loro quello che veduto avevo, tacendo il nome di questa gentilissima. Poi, sanato di questa infermità, proposi di dire parole di questo che mi era avvenuto e che mi pareva che fosse amorosa cosa da udire e, allora, ne dissi questa canzone: Donna pietosa e di novella etate, ordinata sì come manifesta la infrascritta divisione.

Donna pietosa e di nuova età,

piena assai di gentilezza umane,

ch'era là dove io chiamavo spesso Morte,

vedendo gli occhi miei pien di pietà,

e ascoltando le parole vane,

si mosse con paura a pianger forte.

E altre donne, che si furono accorte

di me per quella che io piangevo,

fecero lei partir via,

e appressarsi per farmi sentire.

Una diceva: "Non dormire",

e l'altra diceva: "Perché ti sconforti?".

allor lasciai la nuova fantasia,

chiamando il nome della donna mia.

Era voce mia sì dolorosa

e rotta sì dall'angoscia del pianto,

ch'io solo intesi il nome nel mio cuore;

e con tutta la vista vergognosa

ch'era nel viso mio giunta tanto,

mi fece verso lor volgere Amore.

Esso era tale a veder mio colore,

che faceva ragionar di morte altrui:

"Deh, consoliam costui

pregava l'una l'altra umilmente:

e dicevan sovente:

"Che vedesti tu, che tu non hai valore ?"

E quando un poco confortato fui,

Io dissi: "Donne, lo dirò a voi.

Mentr'io pensavo la mia frale vita,

e vedevo il suo durar com'è leggero,

mi piansi Amor nel core, ove dimora:

per cui l'anima mia fu sì smarrita,

che sospirando dicevo nel pensero:

- Ben converrà che la mia donna muoia. -

Io presi tanto smarrimento allora,

ch'io chiusi gli occhi vilmente gravati,

e furon sì smagati

gli spiriti miei, che ciascun giva errando;

e poscia imaginando,

di conoscenza e di verità fuori,

visi di donne m'apparver crucciati,

che mi dicevan pur: - Morrai, morrai. -

Poi vidi cose dubitose molte,

nel vano immaginare dov'io entrai;

ed esser mi pareva non so in qual loco,

e veder donne andar per via disciolte,

qual lacrimando, e qual traendo guai,

che di tristezza saettavan foco.

Poi mi parve vedere a poco a poco

turbar il sole e apparir la stella,

e pianger elli ed ella;

cader gli angeli volando per l'aria,

e la terra tremare;

ed uomo apparve scolorito e fioco,

dicendomi: - Che fai? non sai novella?

Morta è la donna tua, ch'era sì bella. -

Levava gli occhi miei bagnati in pianti,

e vedeva, che pareva pioggia di manna,

gli angeli che tornavan in su in cielo,

e una nuvoletta aveva davanti,

dopo la qual gridavan tutti: Osanna;

e s'altro avessero detto, a voi lo direi.

Allor dicevo Amor: - Non te lo nascondo;

vieni a veder nostra donna che giace. -

Lo immaginar fallace

mi condusse a veder madonna morta;

e quand'io l'aveva scorta,

vedevo che donne la coprivan d'un velo;

ed aveva seco umiltà verace,

che pareva che dicesse: - Io sono in pace. -

Io divenivo nel dolor sì umile,

vedendo in lei tanta umiltà formata,

ch'io dicevo: - Morte, assai dolce ti ritengo;

tu devi ormai esser cosa gentile,

poiché tu sei nella mia donna stata,

e devi aver pietà e non disdegno.

Vedi che sì desideroso vengo

d'esser dei tuoi, ch'io ti somiglio in fede.

Vieni, perché il cuor ti chiede. -

Poi mi partivo, consumato ogni duolo;

e quand'io ero solo,

dicevo, guardando verso l'altro regno:

- Beato, anima bella, chi ti vede! -

Voi mi chiamaste allor, vostra merzede".

Questa canzone ha due parti: nella prima dico, parlando a indefinita persona, come io fui levato d'una vana fantasia da certe donne, e come promisi loro di dirla; nella seconda dico come io dissi a loro. La seconda comincia quivi: Mentr'io pensava. La prima parte si divide in due: nella prima dico quello che certe donne, e che una sola, dissero e fecero per la mia fantasia quanto è dinanzi che io fossi tornato in vera condizione; nella seconda dico quello che queste donne dissero poi che io lasciai questo farneticare; e comincia questa parte quivi: Era la voce mia. Poscia quando dico: Mentr'io pensava, dico come io dissi loro questa mia imaginazione. Ed intorno a ciò foe due parti: nella prima dico per ordine questa immaginazione; nella seconda, dicendo a che ora mi chiamarono, le ringrazio chiusamente; e comincia quivi questa parte: Voi mi chiamaste.

 

Algumas reflexões teóricas sobre o método aplicado na atualização

Trata-se, portanto, de um texto eivado de latinismos e com pontuação assaz complexa, dificultando ao leitor hodierno, e de preferência ao alunado, o acesso inicial, a compreensão linear da obra. Notamos, logo em primeira leitura, que os períodos são longos, permeados de inversões, traços comuns em um texto medieval, exigindo domínio especializado do italiano antigo. As marcas do Latim, notadamente em transição para o Volgare, não se restringem ao campo lexical como se poderia supor à primeira vista, mas estendem-se também em relação à morfossintaxe e à estilística.

No que se refere ao vocabulário, julgamos imprescindível atualizar todas as palavras que poderiam, a partir de um primeiro momento dificultoso, interferir no diálogo de acesso às entrelinhas da obra. Como exemplos destacamos os latinismos infermitade, umilitade e etate atualizados para, respectivamente, infermità, umiltà, e età. Contudo, o público alvo deste trabalho não pode esquecer princípios básicos modernos da interdisciplinaridade dos estudos universitários. Deve guiar-se, principalmente, pelo sentido circular das disciplinas ministradas durante todo o curso de Letras, reempregando a aprendizagem da Latim, a cada instante, na Literatura Italiana medieval.

Quanto aos aspectos morfossintáticos, procuramos uniformizar a estrutura dos verbos de acordo com as regras que regem a Gramática Normativa Italiana atual. Encontram-se no texto medieval muitas oscilações em relação à grafia das palavras, fenômeno inibidor para leitores que ainda estão aprendendo o idioma italiano. Tal é o caso de nossos alunos que, embora já cursando o 50 período, não se encontram familiarizados com a língua escrita do período literário estudado. Portanto, pensando/repensando tal problema atualizamos também os verbos irregulares parea, dicea, rispuosi etc.

Eliminamos ainda o excessivo uso da ênclise, hoje só permitida no imperativo e com verbos em sua forma nominal. Exemplificando temos: pareami, dicerollo, piansemi etc. Procuramos, por questões de elegância da língua atual, enxugar os excessos de pronomes relativos e orações intercaladas em períodos complexos, para que a leitura possa fluir com mais naturalidade. Muitas vezes, fomos obrigados a escrever os períodos, mantendo-nos fiéis à mensagem, mas infiéis à estrutura, com o fito de facilitar a leitura.

A partir de tal premissa, tivemos que repontuar quase todo o texto, elaborar períodos mais curtos, homogeneizar o uso de pronomes, especialmente os pessoais, os artigos definidos e preposições articuladas, muito instáveis no texto medieval.

Quanto ao aspecto semântico, tivemos o cuidado de atualizar vocábulos que, em sua evolução histórica, assumiram outros significados diversos daqueles presentes no texto original. Como exemplo, podemos citar os verbos proccurare e appressare que, atualmente, são de uso mais restrito. Em relação aos traços estilísticos, tentamos manter as escolhas feitas pelo autor sempre que estas não obscurecessem em demasia a leitura.

No tocante ao poema, verificada a marca do dialeto siciliano - certamente por influência da Lírica siciliana - procuramos atualizá-lo sem preocupação com a rima ou métrica, centrando-nos, essencialmente, na mensagem e na compreensão do leitor do século XXI. Em síntese, buscamos uma atualização semântica do texto medieval, visando, sobretudo, agilizar a leitura do texto dantesco, sem deturpar a essência de sua mensagem poética.

Nosso objetivo, reiteramos, foi o de atingir um máximo de leitores e, através de uma leitura menos árdua e hermética, fazer com que nosso público faça as pazes com os grandes clássicos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para a atualização lingüística do texto anteriormente reproduzido e comentado, realizaram-se, primeiramente, estudos de autores especializados em tradutologia. Afirmamos, portanto, que este trabalho tem como base a teoria correlativa e comunicativa de Peter Newmark.

Segundo este teórico, um tradutor deve encontrar o método adequado para traduzir cada tipo específico de texto, relacionando-o com uma teoria funcional da linguagem. Ele considera importante, também, que o tradutor acrescente ao texto traduzido conhecimentos adquiridos durante o processo tradutório. Com relação à obra Vita nuova, encaminhou-se o trabalho sob tal visão teórica.

No texto de partida - ou seja, aquele escrito por Dante - eliminamos qualquer possibilidade de proceder ao que já se convencionou chamar “tradução literal”. Mesmo em se tratando de uma atualização que visa a facilitar o acesso ao texto antigo, mantivemos a fidelidade da mensagem, não a da estrutura. Tal fidelidade foi observada, ainda sob orientação de P. Newmark, nos mesmos padrões da época em que foi escrito. Suas concepções baseiam-se nas funções da linguagem de Bühler adaptadas por R.Jakobson. Portanto, o aspecto cultural foi assegurado e sua funcionalidade procurou ser coerente com o mundo do leitor atual. Com respeito aos preceitos do citado especialista, certamente inspirados nas teses da estética da recepção, optou-se pela tradução semântico-comunicativa, dinamizadora na linguagem moderna da interação entre autor e leitor.

Também C. Nord critica a tentativa de restabelecerem-se no texto traduzido - ou, no caso de Vita nuova, restabelecerem-se no texto atualizado - as mesmas funções presentes no original. Para ele, o texto de partida e o de chegada não possuem, absolutamente, a mesma proposta, pois o horizonte de expectativas de um leitor do século XXI não é, por exemplo, o mesmo daquele da Idade Média.

Com a renovadora proposta desses dois teóricos, rompe-se, assim, a falsa ilusão de simetria que nasce do suposto empenho em manter a função do texto de partida no texto de chegada. Ou seja, o efeito é diverso para os leitores originais e para os da tradução - no caso deste trabalho, devemos repetir, da atualização. Deve-se citar, finalmente, a influência funcionalista que nortearam este artigo, centrada no conceito retórico de skopos, formulado por Hans J.Vermer e definido como o propósito do texto na situação comunicativa em que se inscreve.

Finalizando, reafirma-se a intenção dos autores deste trabalho, professores de Literatura e Língua Italianas da UERJ, de atualizarem-se textos antigos visando à didática, a um skopos de características propedêuticas. Tais objetivos, porém, não excluem - ao contrário, só reforçam - a possibilidade do projeto colaborar para uma pesquisa sobre a teoria da tradução. Ao se repensarem problemas literários e lingüísticos no processo tradutório, abre-se ainda a possibilidade de o professor dispor de um harmônico tecido interdisciplinar iluminando, principalmente, os estudos da Literatura Italiana.

 

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