Uma esperança sobre o futuro
do ensino de inglês como segunda língua

Renata de Souza Gomes (UFRJ)

Devido a razões políticas e históricas, o ensino de inglês como segunda língua vem se expandindo por todo o mundo desde os anos do Pós-Guerra. O ensino de inglês modificou-se de acordo com a velocidade de informações produzidas por pesquisadores das áreas de pesquisa em aquisição de segunda língua, Sociologia, Análise Crítica do discurso (Fairclough, 1992) e estudos sobre as identidades sociais.

Transformações na sociedade a Globalização fazem com que ensinar inglês exija muito mais que somente conhecer a língua e a metodologia ou até mesmo ser uma profissional 'dinâmico' . Será crucial para o professor de inglês, para o verdadeiro profissional, entender os princípios da metodologia com a qual ele/ela trabalha, bem como entender os princípios da mesma dentro do contexto econômico, político e social no qual ele/ela está inserido. Além disso será necessário que o professor esteja cada vez mais em contato com teorias e pesquisas para que ele se torne um profissional crítico e autônomo para desenvolver suas próprias investigações e fazer um bom trabalho.

Por estas razões, o objetivo deste trabalho é apresentar um breve histórico do ensino de inglês como segunda língua e suas ideologias. Serão discutidas as razões para tantas mudanças.

Finalmente, haverá uma discussão sobre a identidade do professor de inglês. Qual é em geral o perfil deste profissional? Quem é o professor de inglês atualmente? Quais serão os futuros requisitos para um professor de inglês e porque ele precisará estudar e produzir teorias sobre o ensino?

O contexto sala-de-aula
na visão da Lingüística Aplicada

Escrever sobre pesquisas que abarcam a formação de professores e estudos sobre a sala de aula de língua estrangeira e materna implica em escrever sobre a Lingüística Aplicada. O termo 'Lingüística Aplicada', doravante LA vem sendo disseminado em diversos trabalhos e pesquisas desde a época do pós-guerra na Europa e nos Estados Unidos e mais recentemente no Brasil. Porém, nem sempre quem o ouve é capaz de compreendê-lo com clareza.

Talvez, um ouvinte do termo LA, possa associá-lo a pesquisas de aquisição de segunda língua e se pergunte: este também não é o campo da Lingüística? Mas se ao mesmo tempo ele ouvir a LA sendo associada a pesquisas em Literatura, Tradução, Relação médico-paciente, Inglês instrumental, Análise do discurso, Sociolingüística, etc., este ouvinte certamente poderá chegar à mesma pergunta feita em Moita Lopes (1996: 17), que é: "Afinal, o que é a Lingüística Aplicada?"

Moita Lopes (1996: 17) escreve que nos últimos anos, os encontros de LA no Brasil têm incluído em suas programações sessões que tratam especificamente da natureza da LA. O autor escreve que muitos pesquisadores já consideram esta questão estéril, e que a melhor maneira de identificar a LA, é através do desenvolvimento de pesquisa. No entanto, Moita Lopes julga esta discussão absolutamente necessária, pois nas palavras do autor:

Esta questão, portanto, é inerente à LA como campo de investigação. Esta temática tem que ser discutida por nós mesmos, isto é, lingüistas aplicados, e parece colaborar para o fortalecimento e o desenvolvimento da área. (Moita Lopes, 1996: 18)

Talvez, seja realmente por esta tentativa de fortalecimento da área que muitos autores (Weidemann, 1998; Grabe, W e Kaplan, R, 1991, Spillner, B.1995, Celani, M.A.A, 2000, Moita Lopes, 1996) iniciam seus trabalhos levantando questões sobre a natureza da LA, e definindo o campo de atuação de suas pesquisas, ou seja, se a pesquisa se situa no campo da tradução, no ensino de línguas e etc.

Antes de prosseguir com o trabalho, citarei algumas definições de LA com as quais concordo, pois assim o leitor poderá finalmente entender o que é a LA e que relação ela tem a pesquisa em sala de aula. Moita Lopes (1996: 22-23) caracteriza o percurso da LA através de cinco pontos: pesquisa de natureza aplicada em Ciências Sociais, linguagem concebida do ponto de vista processual, natureza interdisciplinar e mediadora, envolve formulação teórica, e utiliza métodos de base positivista e interpretativista.

A LA apresenta pesquisa de natureza aplicada em Ciências Sociais porque se centra na resolução de problemas de uso da linguagem enfrentados pelos participantes do discurso no contexto social. Desta forma, o foco de atenção da LA é centrado na linguagem do ponto de vista processual, isto é na perspectiva do uso/usuário no processo de interação lingüística escrita ou oral.

Uma das características mais fortes da LA é a pesquisa de caráter interdisciplinar e mediador. Dependendo de onde se localiza o problema de uso da linguagem, outras disciplinas são chamadas a colaborar com a LA . Ou como Grabe, W. e Kaplan, R (1991: 3) apontam :

A Lingüística Aplicada, é conhecida amplamente em um campo onde o propósito é resolver problemas reais da linguagem do mundo. Para fazer isso, o campo utiliza uma variedade de outros saberes que derivam de outras disciplinas conhecidas como a antropologia, a teoria educacional, a psicologia, a sociologia etc.

Talvez, o leitor ainda se pergunte porque a LA pode mediar entre o seu conhecimento e o de tantas outras disciplinas. Esclarecendo, então esta possível dúvida e concordando com Celani (2000: 20) a LA tem essa característica porque ela se preocupa com o uso da linguagem. Como, a linguagem, está presente em toda nossa vida e nas relações sociais que mantemos, existem vários problemas possíveis de serem investigados pela LA com ajuda de outras áreas de estudo. Nas palavras de Celani (2000: 19-20):

A LA como área do conhecimento é vista hoje como articuladora de múltiplos domínios do saber, em diálogo constante com vários campos que têm preocupação com a linguagem. É mediadora de mudanças na sua comunicação com a coletividade e com a participação desta. Tendo em vista que a linguagem permeia todos os setores da nossa vida social, política, educacional e econômica, uma vez que é construída pelo contexto social e desempenha papel instrumental na construção dos contextos sociais nos quais vivemos, está implícita a importância da LA no equacionamento de problemas de ordem educacional, social, política e até econômica.

Dentro deste caráter interdisciplinar, algumas das tendências de pesquisa em LA apontadas por Strevens (1991: 18-24) são: ensino e aprendizagem de línguas; a política lingüística como a questão lingüística em países com imigrantes ou conflitos locais de regiões com diferentes dialetos; pesquisa em comunicação verbal, tendo como campo as telecomunicações. O autor também fala em pesquisa em linguagem especial de trabalho, como o uso do inglês para operação de tráfego aéreo por profissionais que não tem o inglês como primeira língua, terapia da fala, lexicografia, tradução e interpretação, e os usos profissionais da linguagem como a relação médico-paciente, ou a 'linguagem do advogado'.

Strevens (1991: 17) ainda aponta para uma lista infinita de disciplinas que podem ser comprometidas com a LA como a Matemática, a Neurologia, a Literatura e a Crítica Literária. Acrescentando possibilidades de pesquisas à lista iniciada por Strevens, Grabe e Kaplan (1991: 4) escrevem também sobre pesquisas de meta-LA, que são pesquisas que discutem a natureza da disciplina. Outras possibilidades de atuação da LA mais recentes estão no campo do letramento e do ensino à distância.

Apesar de toda esta lista de objetos de estudo que são passíveis de serem investigados dentro da LA, a disciplina ainda é freqüentemente associada a pesquisas de ensino e aprendizagem de línguas. Vale ressaltar que a mudança de enfoque sobre as pesquisas em sala-de-aula da Lingüística para a Lingüística Aplicada melhorou sensivelmente as pesquisas pelo fato de trabalhar não só exclusivamente com a linguagem e com os aspectos sociais, mas também com todas as outras disciplinas mediadoras que contribuem para um melhor entendimento sobre o problema a ser pesquisado. Além do fato de que a sala de aula não é estudada mais como uma abstração e sim como algo real e vivido pelo próprio pesquisador.

Talvez, a identificação entre LA e sala de aula se deva ao fato de que a primeira teve sua origem voltada para o contexto de ensino e aprendizagem de línguas. Desde Edinburgh até os dias de hoje, ocorreram várias modificações no ensino de línguas e nas pesquisas sobre aquisição de linguagem Para que discutamos o futuro do ensino de inglês, é preciso que nos lembremos do passado para que se entenda o momento atual e o porquê de um momento futuro.

Um breve histórico da LA como disciplina.

O termo Lingüística Aplicada é usado desde a fundação da primeira escola de LA na Universidade de Edinburgh em 1956 e do Centro de Lingüística Aplicada em Washington em 1957.Embora, Strevens (1991: 14) ressalte que a abordagem da LA nestas duas instituições era diferente. Em Edinburgh, a preocupação era com o ensino e formação de professores. Já nos EUA, a preocupação era de ordem política e neocolonial. Para que a LA fosse institucionalizada, foi criada em 1964, A AILA, Association Internationale de Linguistique Apliquée. E no Brasil, surge em 1990 a Associação de Lingüística Aplicada no Brasil (ALAB).

Muitos autores datam o início da LA por volta da década de 40 e 50. Porém, Back (1970, apud Spillner 1995: 4) diz que as duas datas são falsas. Para Back, há uma série de ocorrências no século XIX e início do século XX. Como não entrarei em detalhes de rigor histórico, basta que o leitor saiba que foi por volta de 1950 que as atividades em LA se intensificaram. Este período, por sua vez, tem uma grande relevância histórica para a LA, já que compreende o período da Segunda Guerra Mundial e o período Pós-Guerra.

A LA, segundo Weidemann (1998: 6) respondeu sucessivas vezes às complexas influências históricas, e pode ser discernida como uma disciplina que já passou por vários ajustes. O impulso e investimento para o desenvolvimento de pesquisas em LA foi dado pelo governo americano. Kehoe (1968: 3) ironiza esta ajuda ao escrever que o interesse do governo era na verdade, utilizar a língua como 'arma política' do neocolonialismo. A linguagem seria uma forma de influenciar as pessoas.

O governo também tinha um interesse mais prático que era fazer com que os soldados estrangeiros fossem treinados para falar inglês para se comunicar com os soldados falantes de língua inglesa como primeira língua. É desta época que surgem palavras que escutamos até hoje, como "treinamento", e "audiolingualismo". Sobre a conotação negativa que "treinamento" assumiu nos dias de hoje, cito Widdowson (1984: 29) que escreve que a palavra "treinamento" não pode ser utilizada para lingüistas aplicados porque estes não são animais ou pessoas treinadas com certas técnicas para atingirem um determinado objetivo.

O método áudio-lingual teve suas bases históricas no treinamento e militarismo da Guerra. Pois, era preciso que se formassem hábitos lingüísticos através de estímulos e respostas. A abordagem áudio-lingual era um reflexo da visão de linguagem que se tinha na época. A linguagem era vista como fragmentos descritos por uma rigorosa análise lingüística. Acreditava-se que o professor de línguas deveria compreender como se concatenavam esses fragmentos lingüísticos a fim de ser um bom profissional.

Esta era do audiolingualismo foi revestida por um grande rigor científico. Os pesquisadores da época dissociaram os estudos de língua da Literatura (Kehoe, 1968: 1).E como aponta Corder (1973: 247) eles também fizeram com que os estudos lingüísticos deixassem de pertencer a estudos humanísticos para alcançarem o status de 'ciência moderna da Lingüística'. É devido a este autoritarismo científico que a abordagem audiolingual perdurou por tanto tempo e resiste até hoje em muitos cursos de línguas na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo.

Anos mais tarde, como a mudança da visão de linguagem como algo estruturado para a visão de linguagem com aspecto funcional situada histórica e socioculturalmente, o audiolingualismo começou a perder espaço.Com esta mudança, o professor não precisava mais dominar teorias lingüísticas para a manipulação de estruturas lingüísticas dentro de sala de aula. Por conseguinte, Strevens (1991: 18) mostra que foi verificado que um professor poderia ter total desconhecimento das teorias de análise lingüística e mesmo assim ele saberia dar aulas, compreender o sistema lingüístico e ser um ótimo profissional.

Com isto, não fazia mais sentido que se falasse em LA como um subsídio teórico da Lingüística, ou que a LA fazia uso de aplicações lingüísticas. Hoje, a Lingüística tem o seu valor reconhecido pela LA como qualquer outra disciplina que possa servir de mediação e subsídio teórico para a LA, e não mais através da visão de Grabe e Kaplan (1991: 283) onde a Lingüística era uma disciplina altamente relevante no "treinamento" de lingüistas aplicados

Quanto ao caráter interdisciplinar da LA, ele só surgiu nos anos 80. Como mudança importante da LA nesta época, temos também o desenvolvimento da abordagem comunicativa de ensino. Com esta nova visão sobre ensino e aprendizagem de línguas, os estudos sobre aquisição de segunda língua foram impulsionados.

Mais recentemente, surgiu nos estudos da LA, a palavra 'interação'. Esta palavra é freqüente tanto nos estudos de sala de aula, quanto nas pesquisas de outros contextos, por entender que é através das interações sociais que aprendemos uma língua, que construímos as nossas identidades, e discutimos sobre um ensino político de línguas e etc.

Talvez, o leitor possa notar que a história da LA perpassa muito mais pelo contexto das pesquisas em sala de aula do que pelo contexto de outras pesquisas. Porém, como afirma Celani (2000: 23):

(...) foi no que se refere ao ensino/aprendizagem de língua estrangeira que a LA sempre teve forte atuação, podendo até afirmar que foi nesta área que ela começou a ter estatuto próprio, firmando-se como área independente do saber, desvinculada da Lingüística, e não como mera aplicação desta.

Spillner (1995: 6)escreve que não se pode negar a força representativa dos estudos de ensino de línguas estrangeiras dentro do total de pesquisas feitas pela LA .Muitos estudos na área de ensino- aprendizagem e também formação de professores (Kramsh, 1996; Brumfit, 1995; Celani, 2000) evidenciam a preocupação dos pesquisadores em investigar a linguagem no contexto escolar. Celani (2000: 21) diz que este trabalho na escola é fundamental, já que é lá que o indivíduo está se preparando para o exercício da cidadania e da vida social.

Weidemann (1998) escreve que a tradição dos estudos de ensino de língua estrangeira dentro da Lingüística Aplicada se constitui dentro de seis gerações. A primeira, impulsionada no Pós-Guerra, foi a era do audiolingualismo. As pesquisas desta geração se baseavam na Análise Contrastiva, onde os erros e a língua materna representavam influências negativas para a aprendizagem.

A segunda geração, foi a geração das aplicações lingüísticas e do estudo da sala de aula por abstração. Nesta segunda geração, a Análise Contrastiva perdurava, porém ela já estava perdendo sua 'força'.

A terceira geração representou a transição audiolingualismo- método comunicativo concomitantemente com estudos interdisciplinares. Nesta geração, surge a Análise do Desempenho. Neste tipo de análise, os erros não são mais vistos como uma barreira à aprendizagem, mas sim como um progresso. Foi nesta geração também que surgiu a palavra 'interação' que foi e vem sendo abordada nos estudos de LA.

A quarta geração representada por nomes como Larsen-Freeman, Ellis, Penny Ür, impulsionou as investigações em sala de aula com observações sobre o processo de aprendizagem e não o produto. Com isto, logo surgiu a quinta geração que descobriu que o aluno não existe só no contexto de sala-de-aula. O aluno é um cidadão e desempenha vários papéis sociais. Por isso a quinta geração se destinou à estudar as identidades sociais dos alunos e professores bem como suas interações. Estas gerações de pesquisadores não se atém ao tempo ou a um período, elas podem co-existir ao mesmo tempo.

Por fim, a sexta geração, tema deste trabalho, é a geração que combina todas as outras, exceto a primeira e segunda geração, e dá mais um passo à frente. A sexta geração argumenta que o ensino de uma segunda língua é uma questão política. Nesta geração, pensamos e repensamos com mais base científica sobre a prática de ensino, a aprendizagem do aluno e a nossa própria identidade como profissionais.

A sexta geração chega com a Análise Crítica do Discurso de Fairclough (1999), em que se tem por objetivo questionar ideologias investidas no discurso que podem ser combatidas através do contra-discurso de uma educação política. A reflexão crítica sobre as ideologias do discurso estimulam reflexões sobre a prática de ensino e até mesmo sobre a formação do professor. A sexta geração de lingüistas aplicados tem por objetivo formar professores reflexivos e não meros reprodutores e receptores de praticas de ensino já institucionalizadas e naturalizadas (Fairclough, 1989).

Creio que a partir do desenvolvimento de senso crítico, caminharemos para uma sétima geração, a geração de professores capazes de dialogar com o lingüista aplicado e desenvolver suas próprias pesquisas. Teremos um professor agente e não um consumidor de teorias. No entanto, a sexta geração ainda é nosso presente. Para que cheguemos a um bom futuro, faz-se necessário que tenhamos profissionais críticos e questionadores das falsas ideologias que entulham nossas salas-de-aula. Escreverei sobre o nosso momento presente, sobre quem parece ser o professor de língua estrangeira e como ele alcançará o posto de pesquisador no futuro.

Por um ensino político: nosso momento presente

Considero 'educação política', aquela que leva o profissional a refletir e agir criticamente com relação à todos os processos e elementos da aula. São vários os caminhos para a reflexão. Pode-se citar alguns deles como a construção de diários do professor, ou a pesquisa colaborativa em que um lingüista aplicado ajuda na formação contínua de alunos que querem ser professores e etc. Estas reflexões envolvem não somente a parte prática, os esquemas de aula, mas também questões políticas e ideológicas . Não é necessário mais que tenhamos um professor conhecedor de jogos, que faz o plano de aula com perfeição, que sabe ensinar com esmero os tempos verbais e etc.

Hoje é preciso que o profissional esteja envolvido em pesquisas por uma série de motivos: promover avanços nos estudos de aquisição, não se deixar dominar por um mercado de trabalho que não valoriza o professor, além de se diferenciar de outros profissionais em um mercado saturado.

É também a partir de observações sobre o cenário do mercado de trabalho atual para o professor, que ele pode começar sua reflexão. Ele/ Ela pode se questionar sobre quem é o profissional de línguas, que perfil ele tem? Por que o professor precisa ser dinâmico? será que o bom professor é aquele que salta e grita fazendo a turma rir? por que em alguns lugares o professor precisa manter uma aparência sempre jovem, de preferência magra e a mais parecida possível com à americana, apesar de nossas raízes afro? Afinal, por que há tanta alienação com relação á figura do professor? Talvez seja a falta de questionamentos e a falta de conhecimento das pesquisas realizadas que levem à toda essa alienação.

Precisamos para um futuro próximo desenvolver pesquisas que ajudem a combater uma série de ideologias que dizem respeito ao professor e ao ensino de línguas. E mais do que desenvolver as pesquisas, é preciso que a sociedade tome conhecimento do que vem sendo feito. No entanto, encontramos uma barreira à realização das pesquisas: a falta de estímulo, tanto financeiro quanto institucional. A maior parte das instituições não está interessada no processo, mas sim no produto que envolve lucros, mais quantidade de alunos e etc. é devido a isto que se pode dizer que o Poder nos dias de hoje não é mais visível a olho nu. Hoje não se pratica mais a censura, em compensação, o Poder exerce seu ato de coação através de estruturas quase que invisíveis no discurso. Creio, portanto, que é impossível ensinar a língua 'do império da globalização', sem que tenhamos um enfoque político sobre a mesma em nossas aulas.

Vários mitos precisam ser derrubados. Mitos ainda da época do audiolingualismo como o mito de que é preciso que o aluno pense em Português e etc. e mitos em relação ao professor. Neste trabalho, porém limito-me a mencionar somente alguns mitos e alienações relacionados à figura do professor no mercado de trabalho e como estas construções negativas podem ser derrubadas através de pesquisas.

Estas reflexões sobre o mercado de trabalho do professor se fazem necessárias á medida que nem todos os cursos de formação de professores se destinam realmente a formar profissionais críticos, além do triste fato de que muitos professores estão perdendo seu espaço para outros profissionais que não são da área. Há muito tempo se observa que qualquer pessoa que tenha morado no exterior, ou que seja falante nativo da língua e em geral desconhecedor do processo educacional estão tendo o direito de ensinar uma língua estrangeira.

Desta forma, o professor vê seu campo de trabalho sendo invadido por todos os tipos de profissionais que resolvem dar aulas para ganhar um dinheiro extra. Não convém aqui criticar estes profissionais, pois sabemos que os tempos de hoje realmente não se apresentam fáceis financeiramente. Contudo, podemos entender esse confronto entre profissionais liberais e professores através da seguinte comparação: estaria o professor habilitado a medicar e a diagnosticar um paciente no lugar de um médico? Certamente que não. Embora o ensino ministrado por um não professor não leve o aluno á morte como no caso do 'professor-médico', o aluno será certamente conduzido à um caminho de aculturação e recepção passiva de ideologias que perpassam o discurso.

Sendo assim, cabe ao professor re-conquistar o seu espaço e mostrar a sua importância para os profissionais de outras áreas e para os donos de instituições de ensino, que nem sempre são educadores, e para o governo a fim de que ele libere verbas e estimule o desenvolvimento de pesquisas na área da Letras, que o professor é insubstituível r que a nossa pesquisa, seja ela na área, da Lingüística, da LA, da Pedagogia etc. possui o mesmo valor que as chamadas pesquisas 'hard' das ciências exatas.

PELA EMANCIPAÇÃO DO PROFESSOR
NOSSO POSSÍVEL FUTURO

Assim como já vimos o tempo passado e presente do ensino de línguas, é chegada a hora de se conhecer o tempo futuro. Este tempo desconhecido não será objeto de especulações e adivinhações. O futuro a que se refere este trabalho é um futuro desejado que foge aos reflexos caóticos de nosso momento atual.

Portanto, um futuro desejável para o professor será o tempo em que ele desenvolva sua consciência crítica e pesquisas que derrubem uma série de ideologias existentes no contexto educacional. Visa-se uma formação de professores onde o profissional seja competente, conhecedor da prática, mas também da teoria. E mais do que isso, objetiva-se para o futuro, professores que produzam sua próprias teorias para superar um mercado de trabalho já saturado de profissionais de língua. A superação do meio de trabalho acontecerá através da qualidade e diferenciação deste profissional através de pesquisas.

Para que este professor proceda às pesquisas, é preciso que ele observe atentamente a sua sala-de-aula e com ajuda de um lingüista aplicado detecte os problemas que nela ocorrem e podem ser estudados.

Cabe então às instituições de cursos de professores atualizarem os seus cursos a fim de promover todas essas mudanças para formação de futuros bons profissionais. Como exemplo, de semente plantada no futuro para ser colhida posteriormente, podemos citar o projeto CLAC da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde através de uma pesquisa colaborativa entre lingüistas aplicados e alunos de graduação do curso de Letras se desenvolve a reflexão crítica e os alunos são estimulados a desenvolver suas próprias pesquisas que são apresentadas em um fórum de discussões.

Vale ressaltar que apesar do fato de que nunca existirá o profissional imbatível e invulnerável, visto que somos todos passíveis de imperfeição e erros, e que apesar do fato de que o Poder das instituições nos controla mais a cada dia que passa, vale a pena enxergar a educação como um ato político. Pois não se trata de uma utopia, mas sim de boa vontade para se estimular pesquisas e promover a educação em nosso espaço social.

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