A afirmação do sexo forte
A linguagem da revista masculina

Almerindo Cardoso Simões Junior.(UFF)

Introdução

Os estudos em relação as diferenças comportamentais entre os sexos remontam desde a antiguidade. Os antigos filósofos gregos são citados como estudiosos desse tipo de questão lingüística. Da Idade Média até o início do século passado , vários trabalhos foram escritos, porém voltados para línguas estrangeiras. A linguagem da mulher era sempre colocada como um “dialeto” ou “sub linguagem”, se comparada a linguagem do homem. Eram ao mesmo tempo consideradas conservadoras, repletas de arcaísmos lingüísticos, mas concomitantemente apresentavam inovações.

Em língua portuguesa os primeiros tratados envolvendo as diferenças lingüísticas entre os sexos datam de década de 20 do século passado, boa parte delas calcadas em visões distorcidas da sociedade da época, além de fora do contexto da língua portuguesa no Brasil. Com a evolução feminina e o grande destaque obtido pela mulher em nossa sociedade no decorrer do último século, a “lingüística feminista” tomou corpo e voz. É cada vez maior o número de pesquisas e publicações a respeito da linguagem da mulher sob vários aspectos. Buscamos então a corrente inversa: o que foi feito da linguagem masculina? Como ela é abordada? E melhor: Como a mídia usa os próprios recursos da(s) linguagem(ns) masculina(s) para chegar a seu objeto? Que imagens são suscitadas nesses leitores? Como se dá todo este processo?

Dentro de uma perspectiva ainda embrionária, analisamos alguns exemplares da revista VIP, destinada ao público masculino e que traz assuntos de interesse do homem de hoje como moda, comportamento, sexo, piadas várias e mulheres em fotos sensuais.

Usando os princípios teóricos de Charaudeau e Maingueneau, traçaremos um panorama do contrato comunicativo e veremos como a mídia usa de inúmeros artifícios para fazer com que esse leitor se sinta um super herói.

O princípio da diferença

Uma das questões levantadas por estudiosos é quando começam a aparecer as primeiras diferenças na linguagem das crianças, surgindo então a distinção entre os sexos. Segundo pesquisadores, por volta de 6 a 7 anos, as crianças já começam a buscar uma entoação diferencial, segundo percebem na fala dos adultos. Também, segundo dados, as meninas preocupam-se com formas mais padronizadas, buscando assim o prestígio de uma classe que foi durante séculos considerada “inferior” ou “secundária”. Os homens, ao contrário, buscam demonstrar a solidariedade através de uma forma não padrão.

Há de se destacar também o fato de que pais e mães já se comunicam de forma diferente com os filhos a partir da mais tenra idade. Em termos de comportamento social, as meninas parecem ser mais cooperativas e menos competitivas. Já os meninos, talvez devido a função social dada e cobrada do homem através dos séculos, tomam mais decisões. Não que as meninas não decidam ou ordenem. Quando brincam com crianças mais jovens, ou ocupam papéis de liderança como mãe ou professora, também dão ordens e tem posturas dominantes. Em todas estas abordagens é imprescindível que se leve em conta os contexto social e histórico dos papéis homem x mulher.

Ao analisarmos a questão da linguagem no âmbito escolar, podemos perceber que o processo de escolarização acaba atuando de maneira mais incisiva sobre as mulheres do que sobre os homens. A mulher é mais propensa a aceitar a linguagem normativa da escola, assimilando melhor modelos lingüísticos considerados como padrão.

Adquirir essa linguagem considerada padrão também é uma forma de adquirir prestígio, uma forma de valorização e de colocação em posição de igualdade com o considerado sexo forte.

A quem a revista VIP quer alcançar?
O contrato de comunicação de Charaudeau

Antes da analisarmos quais são os objetivos da Revista VIP , a que tipo de público ela se destina e como se dá esta construção da valorização do homem, faz-se necessário percorrer os meandros teóricos, entendendo como ocorre o processo comunicativo de formação e transmissão dessa mensagem, bem como o contexto em que é transmitida.

Um dos primeiros aspectos retratados por Charaudeau (1996) é o fato de que as novas tendências no estudos de análise do discurso consideram impossível conceber a língua como algo fragmentado, estruturado em micro partes, sendo tomadas como aspectos isolados . É fundamental vê-la como processo de interação, algo que torna a relação significativa entre emissor e destinatário, transformado-os em parceiros. É como se assinassem um contrato: Um contrato de comunicação.

Segundo Monnerat (2003) esse contrato de comunicação instaura um ato de comunicação social que “é um ato de troca que se instaura entre dois parceiros” e

...só é válido se os dois parceiros se submetem mentalmente a certas condições discursivas que lhes permitam identificar-se como verdadeiros parceiros de troca, ao mesmo tempo em que reconhecem a validade do ato de comunicação.

Vejamos como se dá esse processo de “parceria de troca” na revista VIP

BOAS VINDAS

De cara nova, a VIP ficou mais bonita, mais bem organizada e com muito mais fotos das gatas mais desejadas do país. Esse foi o motivo que me fez assinar a revista e com certeza me fará renovar minha assinatura. Rodrigo Paixão- Junho 2003 - p. 20

A VIP dá ao leitor “mais fotos das gatas mais desejadas do país” e, o mesmo , em troca, mantém sua fidelidade assinando a revista e mantendo o desejo de renovar a assinatura.

PRIMEIRA CLASSE

Sou leitor assíduo da VIP e gostaria de parabenizá-los pela sucessiva melhora na qualidade das matérias. A revista se tornou minha companhia mais freqüente nas diversas viagens que realizo pelo nosso país. Se as empresas aéreas se queixam da minha fidelidade, para a VIP sou o companheiro que toda mulher desejaria: totalmente fiel! Com a VIP, sempre viajo de primeira classe. Flavio Leite - Julho 2003 - p. 20

Mais uma vez o exemplo da parceria. A VIP melhora a qualidade de suas matérias e o leitor, em troca, torna-se leitor fiel da revista, fazendo-a sua companheira inseparável.

Conseqüentemente, o leitor confere à revista, conforme visto na seção cartas dos leitores, uma credibilidade. Eles a reconhecem como um sujeito comunicante, um veículo de informação e entretenimento, que satisfaz sua necessidade de uma leitura amena, sem informações demasiado complexas ou específicas. Esta credibilidade então, confirma o direito à palavra, confirmando a legitimidade da revista. É construída sobre competências, numa demonstração do SABER FAZER, na “capacidade de capitalizar uma autoridade de fato”. (Charaudeau:1996)

Voltando aos conceitos de Charaudeau, este determina que há dois grandes circuitos que envolvem o ato da linguagem: O circuito externo, baseado num saber que repousa sobre a organização do real, discriminado como lugar do fazer e o circuito interno ,instituído sobre um saber que repousa sobre as representações lingüísticas das práticas sociais, lugar de organização do discurso.

Vejamos como fica esquematizado este quadro:

Circuito Externo (Seres do Fazer)
Eu c - Sujeito comunicante (quem publica)
Tu i - Sujeito interpretante (quem consome)

Circuito Interno (Seres do Dizer )
Eu a - Sujeito anunciador (quem anuncia)
Tu d - Sujeito destinatário (quem utiliza eventualmente)

ENFIM, O PRAZER DE SER HOMEM.

Como corpus para nossa análise , tomamos as edições da Revista VIP, publicada pela editora Abril, vendidas em bancas de jornal de maio a agosto de 2003. O material é de excelente qualidade, chamando a atenção do leitor o esmero com que são escolhidos os anúncios, as cores, as reportagens e as modelos e/ou atrizes que figuram em suas capas (geralmente pedidas por leitores).

Sob vários aspectos, a começar pelo slogan, a revista VIP afirma o privilégio de ser macho e viril. O homem é um ser destinado ao prazer - o prazer de ser homem - o que o tira do lugar comum. Ele é bem sucedido, se dá bem com as mulheres, veste roupas da moda, tem um corpo bem trabalhado, sabe se defender, é versátil na cozinha, tem bom desempenho sexual, é bem resolvido.

O próprio título da revista - VIP , é abreviatura da expressão inglesa “very important person”, já qualifica esse leitor como alguém com um diferencial. Ele é refinado, “ousa se cuidar “, como anunciado pelo gel de limpeza facial nívea (agosto/2003), além de ser um homem bem tratado pela vida, até porque ler VIP é um sinal de que a vida o trata de forma diferenciada (editorial-junho 2003).

O homem que busca a companhia desta publicação tem bom poder aquisitivo, provavelmente pertencendo a classe média ou média alta. O preço ($7.90) não se encaixa no padrão das revistas populares. Outro fator que chama atenção para a classe social são os anúncios veiculados na revista: perfumes (Boticário, Dolce & Gabbana, Polo), produtos para barbear e pós barba (Nivea), Celulares (Siemens Mobile, Motorola, Samsung), os mais variados anúncios de carros (Ford Ranger, Citroën, Chevrolet 1.8 Flex Power) roupas (Armani) , dentre outros. Observemos que estes anúncios não são de itens populares ou com preço acessível a maior parte da população, não sendo considerados artigos de primeira necessidade, confirmando, assim o público alvo da revista.

Outros atrativos chamam a atenção deste leitor tão distinto: as fotos sensuais de belas mulheres são extremamente bem feitas, sem serem vulgares. Boa parte das modelos estão na mídia atualmente, em novelas ou outras formas de aparição televisiva, confirmando a enorme credibilidade da tv enquanto criadora de mitos.

Afligem a este leitor as preocupações típicas do homem moderno de sua condição: usar os produtos mais sofisticados, andar sempre elegante, saber escolher um excelente vinho, estar com o corpo em boa forma, cuidar da pele e impressionar as mulheres (inclusive no aspecto sexual). Não são mencionadas preocupações com salários, desemprego ou com a crise econômico-social que assola ao país. Presume-se então, um leitor urbano, bem empregado, cansado das notícias desfavoráveis do mundo dos negócios. Este homem busca, em suas horas de lazer, uma leitura amena e prazerosa, que ao mesmo tempo aborde dilemas típicos do homem moderno de forma sutil. Isso é confirmado ao observarmos as seções de piadas, “conheça o inimigo” - onde se faz um confronto bem humorado com as publicações femininas, e testes diversos (“O jogo da namorada ideal - Você está com a garota certa? Aposte e descubra” ou ainda “Que tipo de mané é você ?”).

Após esse breve panorama introdutório, dividiremos a análise de revista em quatro enfoques, ao mesmo tempo distintos e entrelaçados, já que são eles que formam a publicação como um todo.

As Capas

Predominou na escolha das capas mulheres que estavam em destaque no mídia no mês de publicação da revista: Uma participante de “reality show”, uma modelo e duas atrizes.

Maio 2003 - A escolhida foi Sabrina, participante do “Big Brother Brazil 3”, programa que estava em exibição na época. Ao que parece a intenção foi despertar no leitor o fetiche que um programa como esse cria no público, em especial pela questão do “voyerismo”. O fundo da capa neutro, realça bem a figura da mulher na capa.

Junho 2003 - A modelo escolhida foi Daniella Sarahyba. A imagem realçada é a da ninfeta, a menina transformando-se em mulher, algo bastante sugestivo para os leitores da revista, provavelmente homens na casa dos trinta anos, já bem estabelecidos financeiramente.

Julho 2003 - A atriz escolhida é Carol Castro, que faz uma polêmica personagem na novela de horário nobre da principal emissora de televisão do país: ela é a vilã que tenta roubar o namorado de uma das mocinhas da estória. Surge , nesse contexto, então, a imagem do proibido, do pecaminoso. O próprio fundo da capa , em tons de rosa forte, quase vermelho remete o leitor a isso, o que também reforça a sensualidade da atriz, já bem explorada na novela.

Agosto2003 - A atriz escolhida é Fernanda Paes Leme, também na mídia atualmente, em novela de média repercussão nacional. É o retorno à visão da garota que desabrochou, que tornou-se mais adulta, até pelo fato da atriz estar antes ligada a um seriado juvenil e agora em uma novela, fazendo o papel de uma jovem dinâmica, mãe solteira, que tenta seduzir um jovem viúvo.

Não podemos deixar de mencionar o considerável número de frases nominais, característica da língua falada, mostrando a proximidade da linguagem escrita da revista com a oralidade. Também são curtas, incisivas, diretas, estrategicamente criadas para seduzir e persuadir.

Os tempos verbais predominantes são o presente simples, denotando as “verdades universais” propagadas pela revista. Além deste , temos ainda o passado simples, geralmente no sentido de narrar alguma experiência que deve ser compartilhada e copiada pelos leitores, tendo como lógica então o uso excessivo de imperativos, indicando algo que o sujeito interpretante deve realmente fazer, a fim de ser bem sucedido ou conseguir um “status” anunciado anteriormente para a prática de tal ação.

Os editoriais

A linguagem do diretor de redação, Felipe Zobaran, é direta o objetiva, procurando se aproximar o máximo possível do seu sujeito interpretante:

Estou sentado na cadeira de diretor de redação da VIP e a vista daqui não é nada má, garanto a você. Estou muito bem cercado. Se giro a cadeira, vejo Sabrina, a musa instantânea, no seu primeiro ensaio caliente para uma revista. Delícia. Giro de novo e é só prazer, acredite.

Este é o mundo de VIP. E meu trabalho é tratar muito bem dele. Como se fosse você, meu caro, sentado nessa cadeira.

Observemos então os seguintes itens:

Os períodos são curtos e 57,44% são do tipo simples. Como já mencionado anteriormente, o leitor de VIP quer algo leve, que o faça esquecer da rotina cansativa do dia-a-dia;

As orações coordenadas predominam (61,53%), promovendo um encadeamento de valores sintáticos idênticos. Esse paralelismo nas orações coordenadas mantém um editorial de leitura leve, linear;

Trabalhar na direção desta revista, preparar todo este cenário para o leitor é algo extremamente prazeroso. Não são comentadas as dificuldades encontradas para se manter em circulação uma revista deste porte (manutenção do ethos). Todos os leitores sentem-se um pouco diretores de redação;

A linguagem é intimista, às vezes, podendo ser até considerada vulgar , própria do mundo masculino. O leitor é o convidado especial para sentar-se na cadeira do chefe e desfrutar do mundo exclusivo de VIP.

Para Maingueneau (2002:87) “Todo discurso, por sua manifestação mesma, pretende convencer instituindo a cena de enunciação que o legitima”. É essa a função primeira dos editoriais da revista: sustentar a própria cena enunciativa.

Em outra edição (junho 2003) , temos:

Como a vida tem tratado você? Provavelmente bem, imagino. Se você lê a VIP, meio caminho andado. Mas talvez a pergunta mais importante seja outra: como você tem tratado a vida?

(...)

(...) Saber viver. Organizar o próprio tempo, priorizar atividades e, acima de tudo, saber quando não fazer nada. Como li noutro dia, é preciso ficar sem fazer nada para se fazer alguma coisa. Uma questão de equilíbrio

Os anúncios

Como já mencionados anteriormente, são todos destinados a um público de excelente poder aquisitivo, mostrando produtos os mais modernos e sofisticados , com grande enfoque na própria mercadoria.

Carros, perfumes, calçados, roupas , produtos de beleza, jóias, celulares, “lap tops”, tudo isso faz parte do universo de anúncios veiculados em VIP

Vários recursos e/ou estratégias são usados para chamar a atenção dos leitores desta revista, como analisa Monnerat (2003): a retórica, a persuasão, a sugestão, o uso da ideologia (em especial para se manter a do homem latino ), além da própria propagação não do que o público precisa ouvir ou comprar ou ver, mas do que ele quer, por quaisquer que sejam as motivações.

O objetivo do anúncio é sempre seduzir. Ainda segundo Monnerat (2003:30)

Como o publicitário sabe que não está face-a-face como o destinatário e que tampouco poderá forçá-lo à compra, deve procurar conquistá-lo mediante a fabricação de uma imagem de sujeito-destinatário suficientemente sedutora e persuasiva, de tal sorte que o interlocutor possa se identificar com ela: VOCÊ i = VOCÊ d (Tui=Tud).

Vários são os recursos estilísticos usados para fortalecer o contrato comunicativo no anúncio publicitário. Muitos deles já foram mencionados aqui, pois também são notados nas capas e nos editorais da revista. As motivações são trabalhadas no inconsciente, buscando provocar no sujeito interpretante ou destinatário atitudes. Sentimentos, os mais íntimos são trazidos à tona, a fim de que a pessoa faça o certo: aquilo que o anúncio publicitário delimita.

Mitos, como o da beleza e da sedução são criados. Anúncios como o de uma conhecida rede de produtos de beleza, estampa um belo ator ao lado do nome do perfume e uma frase de impacto: “Classic - Os deuses são clássicos”. (Agosto 2003). Outro exemplo é o do sucesso relacionado ao bem vestir, num anúncio em que sequer o nome do produto é mencionado, mas todos os focos são direcionados a ele, graças à linguagem : “Alguns homens de sucesso guardam seus segredos a sete chaves. Outros guardam no armário”. (Agosto 2003).

Sempre jovens e bem vestidos, os modelos escolhidos reforçam a cultura da beleza e da jovialidade, É a manutenção da ideologia e do maravilhoso criado pela mídia.

As mulheres

Como em toda a publicação de cunho masculino, grande é a importância dada também a mulher. Como já mencionado em 3.1, nas capas, são sempre apresentadas as mais sedutoras, assim como em seções dentro da revista. Mas a mulher também é vista como fonte de problemas (Garotas Superproblemáticas : aprenda a reconhecer e a lidar com oito tipos diferentes de surtadas - Agosto 2003) , companheira compreensiva (É bonito ser feio - julho 2003), ou alvo de mandingas, mostrando que apesar de sua pretensa “superioridade”, o homem se sente muitas vezes um solitário (Escrito nas estrelas - Sete mandingas exclusivas para você arrumar mulher - Junho 2003).

O mais surpreendente, porém, foi um artigo publicado na edição de maio, intitulado “O barato de ser submissa”, onde a colunista Kika Salvi faz uma apologia a submissão feminina ao chamado sexo forte.

A auto-suficiência da mulher é a maior praga já inventada pelo feminismo. Esse troço de fazer carreira, ganhar dinheiro, competir no mercado de trabalho, pagar as próprias contas e colecionar especializações para disfarçar nosso profundo sentimento de desamparo, tudo isso é uma grande lástima para a alma feminina.

(...)

Acolher e confortar. E inspirar. E apaziguar. E amar e ser amada. E procriar. Eis o sonho da mulher, atemporal e transcendente. (...). Não queremos ser escravas ou subjugadas pela força. Queremos apenas, ter a força como suporte, como troca do que é belo e necessário à existência, que é a complementação do que é incompleto. Queremos proteção.

Interessa-nos o fato de uma mulher reafirmar o discurso tão propagado pelo homem latino, após décadas de luta feminista. Seria realmente o retorno a uma submissão social imposta às mulheres por séculos ou uma submissão ao discurso publicista da revista?

Nesta publicação as modelos são valorizadas, geralmente, pelo âmbito da beleza, sendo classificadas com os mais fantásticos e elogiosos adjetivos. As comuns, namoradas ou amantes dos leitores, são as superproblemáticas, neuróticas ou inimigas - como na seção “O espírito das coisas”, reforçando a eterna idéia da competição. As chamadas também são repletas de trocadilhos, como na capa de agosto , onde aparece a frase de chamada “Tá na mão” e a modelo segura um dos seios.

A revista reforça então, toda a imagem do homem como “o sexo forte”: é um homem pleno, bem sucedido, jovem, inteligente , detentor de um ótimo padrão de vida ainda se dá muito bem com as mulheres. Os problemas não o atingem. É a típica imagem do super herói moderno e feliz.

CONCLUSÃO

Traçar o caminho contrário ao da maioria das pessoas é difícil, mas sempre gratificante. Temos uma grande variedade de trabalhos ressaltando as revistas femininas sob diversos aspectos. Partindo desta hipótese, por que não abordar uma revista masculina, que tratasse de comportamento, cultura, moda e outros aspectos que interessam ao homem atual?

Por um lado observamos que a cultura no macho latino ainda está bem enraizada em nosso meio. A linguagem usa termos bem próximos do que se pode ouvir na roda de amigos ou em outros momentos de descontração. O foco é sempre o mesmo: a mulher, de preferência jovem, bonita e na mídia.

Outros assuntos? Carros, relógios, os mais recentes celulares e computadores. Com algo a mais: Agora o homem se cuida. Atenção ao uso do terno, que meia combina com qual sapato, o perfume ideal, cuidados após barba, malhação após o excesso do fim de semana e até plásticas foram assuntos abordados nos números analisados. No século XXI, o homem ousa se cuidar.

Um fator interessante, porém, é que essa literatura não atinge o homem comum, a grande massa da população masculina brasileira, o que não acontece com a revista feminina. O homem brasileiro, no geral, permanece ignorante em relação às pequenas mudanças de comportamento anunciadas na Revista VIP.

Em meio a crise econômico-social, o desemprego, o arrocho salarial , a violência, o homem ainda tenta se firmar como sexo forte, pelo menos em suas horas de lazer, no uso de uma linguagem mais descontraída e debochada. Esse homem, leitor de VIP, também têm demonstrado acentuada preocupação com o comportamental, com o social, com o humano. O resultado de tudo isso? Só o tempo e os próximos números da VIP poderão nos dizer.

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