PODER E DEVER: EXPRESSÃO DA MODALIDADE

Monica Alvarez Gomes das Neves (UFRJ)

O presente trabalho inscreve-se na linha de pesquisa da Lingüística Cognitiva, segundo estudos de Lakoff (1987), Talmy (1987), Fauconnier (1994, 1997, 1999), Fauconnier & Turner (1998), Sweetser (1990), Salomão (1990), dentre outros.

O corpus analisado constitui-se de manchetes e títulos de matérias retirados de jornais populares do Brasil (Extra, O Dia) e de Portugal (Diário Popular, Diário de Notícias).

Esta pesquisa tem por objetivo estudar como a modalidade, enquanto mecanismo de imposição de forças e remoção de barreiras (Talmy, 1981, 1987), opera com exposição/preservação da face e gerencia a interação verbal (Miranda, 2000), segundo a hipótese sócio-cognitiva proposta por Salomão (1994, 1995, 1998).

O estudo da modalidade, neste trabalho, focalizará os modais poder e dever e seus níveis: possibilidade e permissão de um lado e, de outro, certeza e obrigação.

Poucos manuais de gramática em Língua Portuguesa destacam uma seção para o estudo da modalidade, como Mateus et alii (1983), elaborado por Faria, em Portugal e Bechara (1999), no Brasil.

Apesar de pouco estudada, a modalidade é um ponto importante da gramática. Sua importância para a língua portuguesa situa-se tanto no fato de ela compor uma categoria gramatical, como aspecto (conforme entende Costa, 1997), por exemplo, quanto no fato de desempenhar um significado pragmático, discursivo.

Ambos poder e dever apresentam essa polissemia (como entende Sweetser, 1990), partindo de um significado raiz para os domínios deôntico e epistêmico, como se pode observar nos exemplos (1) e (2), em que o primeiro apresenta leitura deôntica com remoção de barreira, e o segundo, interpretação epistêmica, também com remoção de barreira:

“Maçãs podem prevenir câncer”.

“Pó pode deixar seqüelas”.

Assim, através das leituras deôntica e epistêmica, os falantes estabelecem seus contatos e os encaminham: a leitura deôntica de poder em (1) encaminha a interação para a atualização da informação antes não conhecida ( a maçã previne câncer) na medida em que há a certeza de que o fato pode ser realizado, há habilidade para tal; a leitura epistêmica em (2) encaminha para a possibilidade de que crianças contaminadas por pó químico fiquem com seqüelas a partir dessa contaminação.

Espera-se que, segundo a orientação da Lingüística Cognitiva de a experiência ser o ponto de partida para a linguagem e esta ser corporificada, este estudo seja contribuição para a compreensão de que:

“processos mentais envolvem imposição de força e remoção de barreira, assim como no mundo real de interações físicas e sociais”(Sweetser, 1990);

o domínio deôntico é o suporte para a existência do domínio epistêmico.

É importante ressaltar que, no estudo do corpus, há contextos de usos específicos em relação às duas modalidades: a do Português Europeu e a do Português Brasileiro.

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