AS IMPLICAÇÕES
DOS DESVIOS SINTÁTICO-SEMÂNTICOS
NA PRODUÇÃO TEXTUAL

Tadeu Luciano Siqueira Andrade (UNEB)

INTRODUÇÃO

Ao produzirmos um texto, estamos exercitando dois planos importantes no processo de produção textual: o plano conceitual e o plano lingüístico (c.f. VAL 1990). Tais planos garantem ao texto uma melhor compreensão do que foi dito, como também se responsabilizam pela tessitura textual. Assim, podemos dizer que o plano lingüístico e o conceitual estabelecem a coesão e a coerência textuais.

Produzir um texto é realizar um processo de seleção que consiste na organização de palavras que se juntam e formam as orações. Essas se interrelacionam em blocos para formar uma cadeia lingüística superior: o texto.

Se um texto é um processo de seleção (grifo meu), cabe ao autor, organizar, sistematizar e adequar as idéias à modalidade de texto que pretende produzir. Por isso, a seleção vocabular e o uso de nexos lingüísticos deve haver, de forma coerente, para que o texto não fique desprovido de sentido, ambíguo, prolixo ou, até mesmo, incoerente.

Neste sentido, selecionaremos textos escritos e usados na comunicação diária, nos quais analisaremos os processos sintáticos, como também os desvios sintático - semânticos e sua implicação nos processos de produção e compreensão.

OS PROCESSOS SINTÁTICOS

Tradicionalmente, há dois processos sintáticos: a parataxe - coordenação e a hipotaxe - a subordinação. Na produção textual, devemos analisar a coordenação não levando em conta o termo oração independente (c.f. gramática tradicional), e sim consideramos um processo de interdependência semântica. Já que no texto, há uma subordinação de idéias, observamos que, nas orações coordenadas, há uma dependência semântica que estabelece entre elas um elo de subordinação.

Numa visão mais simplificada, assim dizemos: na coordenação, juntamos orações independentes do ponto de vista sintático, mas que se relacionam pelo sentido. É o que Garcia (1980) chama de “falsa coordenação”. Há, portanto, a coordenação gramatical e a subordinação psicológica.

Na subordinação, há um processo de encaixamento de oração, ou seja, uma oração está encaixada na outra, ocorrendo uma dependência, tanto do ponto de vista da sintaxe como da semântica. A relação entre as orações é mais intima, uma vez que entre elas há uma dependência sintático - semântica. Já que entre as orações subordinadas, a relação entre elas é mais complexa, o autor do texto deve ficar atento aos parágrafos, ao uso dos conectivos, a junção de orações para que, por falta de lógica entre elas, o texto não fique incoerente.

Considerando os processos sintáticos na elaboração do texto, ficam algumas reflexões, segundo Decat (1997:111):

1. Qual o papel de cada oração no discurso maior em que se insere?

2. Há insuficiência ou inadequação de análises tradicionais para explicar tais fatos e seus comportamentos na língua?

3. Estudar sentenças isoladas é suficiente para compreender o texto?

4. Devemos falar em subordinação como estrutura do discurso ou como duas orações interligadas no binômio: principal e subordinada? (grifo meu)

Quando falamos em processos sintáticos, logo nos reportamos à coordenação e à subordinação. Mas, em se tratando de produção textual, especialmente na sintaxe do texto, reportamo - nos aos mecanismos lingüísticos, índices formais na estrutura da seqüência lingüística e superficial do texto, que são responsáveis pela tessitura textual (c.f. Travaglia, 1994).

OS ELEMENTOS COESIVOS

Falar em sintaxe implica falar em coesão textual, uma vez que é a através da coesão que se articulam as idéias de um texto. A coesão textual não está apenas no âmbito das orações por si só. Está imbricada nos conectivos, pois, através deles, podemos efetuar as relações de encadeamento no texto. É necessário que o uso destes elementos lingüísticos (pronomes, advérbios, conjunções, numerais e outros elementos lingüísticos), seja coerente, para que não constitua, com o mau uso, uma incoerência local (cf. Travaglia, op. cit). Entendemos por coerência local, as partes do texto, das frases ou das seqüências de frases dentro de uma cadeia lingüística superior, o texto.

A SEMÂNTICA

A semântica é responsável pelo sentido do texto. Não devemos pensar que o significado de uma mensagem se dê apenas no uso das palavras e na sintaxe. Depende também do sentido que o uso de determinada palavra pode estabelecer no texto. Nesse sentido, o uso devido de determinadas expressões e palavras garante ao texto uma melhor compreensão, pois a escolha das palavras deve ocorrer não apenas nas relações sintáticas que ela exercerá na tessitura, mas nas relações de sentido que ela pode exercer na superfície textual.

TEXTOS PARA ANÁLISE

Os textos abaixo apresentam alguns problemas na sua tessitura dentro da sintaxe e da semântica que podem implicar a sua produção e compreensão. Entre os “desvios”, considerados como erros do ponto de vista puramente gramatical, podemos elencar alguns:

1. Uso inadequado dos elementos coesivos;

2. Falta de correlação dos tempos verbais;

3. Uso indevido dos sinais de pontuação;

4. Falta de relação de subordinação de idéias (ausência do encadeamento)

5. Impropriedades léxico - semânticas (palavras inadequadas ao contexto)

6. Ambigüidades: pelo deslocamento de termos, como o mau uso do relativo.

7. O uso inadequado da regência verbal;

8. Falta de paralelismo;

9. Problemas de concordância, regência, colocação etc;

10. Retomada sem o referido expresso.

EXEMPLOS DE TEXTO

1. Aproxima - se uma nova etapa de luta para cada jovem estudante que pretende ser alguém na vida. O Vestibular 2004, independente de qual seja a sua condição, social, financeira ou educacional, será o “vamos ver” na vida de cada um. Todo dia se vê e ouve na mídia sobre o a questão do desemprego. O nível universitário está para a nova geração, está para si, como o primário para os nossos avós. Agora o recém lançado concurso para BNB, PRF, BB entre outros, onde mais de 2 milhões de pessoas. (...) a recém concluída pesquisa do, PNDA - IBGE onde nos traz a duríssima realidade.

2. O Colégio Aquarela homenageia, a todas as mães jacobinenses, pelo seu dia.

3. Em homenagem a Zumbi dos Palmares, à ASARC, Associação de artes cartaz e Jornal expressão, realizaram, com o apoio do PCN - Pastoral da consciência Negra, uma grande manifestação sobre a cultura negra. Canto, dança afro, capoeira samba -de- roda, maculelê etc. a participação de vários poetas, grupo teatral tá na cara, os manos (rap), as crianças da casa de rebeca (dança) as garotas do povoado do Tombador academias de capoeira jacobina arte, ritmo de liberdade, raízes baianas.

4. Se você gosta de filme, vamos te deixar de boca aberta.

5. População participa do dia “D”contra à dengue.

6. Litoral Norte é foco esquistossomose Os trabalhadores, que tomam conta das casas na ausência dos donos (caseiros) costumam defecar à margem dos rios e lagoas e tomar banho nos córregos tem se tornado cada vez mais perigoso nessa região.

7. Bem - vindos a Jacobina

muitos encantos, onde quem a visita mergulha em um mundo onde fundem - se o passado e o presente. Em harmonia com tudo isso, a beleza e o encanto de suas lindas serras e cachoeiras.

8. Punks pedem justiça em enterro.

9. A UBES que já travava este debate em cidades do Brasil, em conjunto com ABES lançará aqui na Bahia esta campanha durante a Jornada de Lutas da UNE, da UBES e da ABES. A jornada se inicia aqui na Bahia no dia 25 de marco, com a primeira passeata em Feira e culmina no seu encerramento no dia 1 de abril.

10. Para o coronel Valter Leite, está comprovado, nos autos do processo, a ligação desses policiais com atividades de segurança e fuga do próprio Ravengar.

11. (...) Ele estava foragido desde que o juiz Cássio José Miranda expediu o mandado de prisão, em outubro do ano passado. Rivailton Barros conta que trabalhava como motoboy da pizzaria Vapt no bairro de Narandiba , quando foi fazer uma cobrança em Lauro de Freitas. Policiais da 7ª COM o prenderam no Engenho Velho da Federação.

12. Jacobina Cidade Universitária um sonho jacobinense, ficar cada vez mais perto da realidade... Na última semana do mês de abril a ONG - jacobina recebeu das mão do Sr. José Ferreira um grande presente, uma área de 12.000 m3 de localização privilegiada, no bairro jacobina II.

13. De camisa azul, Bruno Quintella (19), mostrou - se inconsolável ao lado de Alessandra Wagner e Maria do Carmo, viúva e mãe do repórter. (Caras)

14. A atual Miguel Calmon originou - se da fazenda Canabrava que pertencia ao mestre - de - campo e desbravador das terras, sogro do VI Conde da Ponte, que aqui adquiriu em Seis Marias.

15. No dia 20 de novembro de 1695 morre em Alagoas depois de heróica batalha, Zumbi de Palmares, expoente líder da luta dos escravos por liberdade. Portanto, faz 308 anos que ele morreu lutando pela supressão do racismo e da igualdade dos direitos em nosso País. (...) vai realizar um grande debate no dia 26 de novembro de 2003 em homenagem a Semana da Consciência Negra, cujo o tema é o NEGRO E A QUESTÃO DA EDUCAÇÃO.

16. Faço sua festa, alugamos: painéis, mesas, cadeiras, toalhas etc. bolos, tortas, salgados. 356.6949.

17. Alvísaras para o Luiz Anselmo

Nós, que fomos alunos ou tivemos o prazer de ter filhos que estudaram no primeiro prédio de Jacobina. (...) que educou jovens a mais de seis décadas. E que desejamos a continuidade ao longo do tempo.

18. Há 1,6 milhão de estudantes na rede estadual baiana sofrendo com o descaso do governo do estado que vem fazendo um verdadeiro massacre em cima da população.

(...) Recentemente foi aprovado na Universidade Federal da Bahia (UFBa) uma cota de 45% das vagas para alunos da escola pública, negro e afro-descendente. (....) Por essa e outras questões é necessário que a população saiba que a nossa luta não é somente salarial, mas acima de tudo pela transformação da escola pública. Que não seja apenas um espaço físico e sim tenha qualidade e condições dignas para que assim nossos filhos possam transformar seus sonhos em realidade.

19. Lá cuida de um canal de TV que comprou há alguns meses. E de um templo da Universal onde cabe não mais que 200 fieis e no qual ele mesmo é pastor. (Veja, 30/06/04)

20. (...) Ficou decidido que o condomínio enviara cartas a todos os proprietários e/ ou inquilinos, que o condomínio irá se ausentar de quaisquer responsabilidade sobre as janelas de ferro dos apartamentos cujos estar com as massas ressecadas, isso ficando passivo de acidentes. Nada mais tendo a falar (...) (Ata de reunião/ de um condomínio).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O texto é um bloco em que cujas partes estão interligadas através de depois processos importantes na sua superfície: a coesão e a coerência. Uma não se sobrepõe à outra. Elas andam paralelas. A coesão é responsável pela seqüência e encadeamento das partes do texto, através dos elementos lingüísticos, e a coerência é o sentido que tais elementos expressam no texto.

Considerando o exposto, ao produzirmos um texto, é necessário estabelecermos relações sintático - semânticas , desde a seleção lexical à estruturação dos parágrafos para que possam garantir - lhe clareza e concisão de acordo com o tipo de texto e objetivos propostos.

Dessa forma, o ensino da sintaxe deve partir do texto e para o texto, uma vez que as relações sintáticas ocorrem não apenas em orações soltas, pré - fabricadas com determinados fins, mas também em orações articuladas e interligadas no texto e essas interligação e articulação se dão graças à sintaxe atrelada à semântica. Em outras palavras são os planos conceitual e lingüístico do e no texto.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2000.

BARRETO, Therezinha Maria de Mello. Morfossintaxe do Português. Universidade Federal da Bahia. Fundação de Pesquisa e Extensão. Salvador - 1994.

DECAT, Maria Beatriz Nascimento, Achou o vale-brinde ganhou. In Reflexões sobre a Língua Portuguesa - Ensino e Pesquisa. Regina Lucia Péret Dell’Isola et all. (org) São Paulo: Pontes - UFMG. 1997.

------ et alli. Aspectos da gramática do Português. Campinas: Mercado das Letras. 2001.

FÁVERO, Leonor Lopes. O Processo de Coordenação e Subordinação: uma proposta de revisão. In. Lingüística Aplicada ao Ensino do Português. Elvo Clemente (org). Porto Alegre: Mercado Aberto, 1994.

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KOCH, Ingedore Villaça. Lingüística Aplicada ao Português: Sintaxe. São Paulo: Cortez, 1994.

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TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Texto e Discurso. São Paulo: Cortez, 1994.

VAL, Maria da Graça da Costa. Redação e Textualidade. São Paulo: Martins Fontes, 1997.