MEDO E TERROR
NA LITERATURA INFANTO-JUVENIL BRASILEIRA

Rosa Gens (UFRJ)

Pé ante pé

Já há algum tempo, vemo-nos invadidos por um sentimento que ultrapassa muros, vidros e mentes, deixando-nos despreparados para a vida. O medo está presente no nosso cotidiano e estende seus braços por todos os setores de atividades em que nos encontremos. Os perigos do mundo são redimensionados e, por vezes, tornam-se desmesurados, atingidos pelo nosso olhar medroso constante. Jean Delumeau nos revela, em sua História do medo no Ocidente, que, nos primeiros tempos, os medos eram oriundos, fundamentalmente, da Natureza. Em nossa época, o grande perigo está no próprio homem.

Dentro dessa perspectiva inquietante, por que dar atenção a narrativas que se centralizam no medo? Basta pensar na presença deste sentimento em nossa civilização e, inicialmente, no movimento de fascinação que crianças e jovens têm apresentado, ao longo dos últimos anos, em relação às obras que se fundamentam no susto e no pavor. Nas três últimas décadas, principalmente, multiplicaram-se livros e filmes que provocam sensações de horror e, mais do que isso, fazem do medo o seu tema básico. Disseminam-se pela indústria cultural e provocam sensações certeiras. Um arrepio, um recuo ao toque, uma sensação de náusea, repulsa e pronto: estamos face ao que não desejávamos e é impossível recuar.

O horror, é certo, nos causa ameaça. Em última instância, ameaça o nosso mundo, que já anda para lá de ameaçador. Não é de espantar que as cidades se envolvam em artefatos,amaneiradas cidadelas medievais,para que se afaste o medo, e, é claro, os bárbaros que possam causá-lo Assim, engenhocas são mentadas para que os civilizados se sintam mais seguros, envoltos em redes ou grades, em circuitos fechados. No entanto, por entre possibilidades de balas perdidas e um assalto a cada esquina, podemos nos dar ao luxo de ficarmos assustados com histórias de vampiros, lobisomens, monstros, fantasmas...

Preocupados que estamos (ou somos), nós, profissionais ligados à leitura, procuramos a cada dia novas formas e maneiras de apresentar e escolher textos. Foi assim que surgiu este trabalho - de constatações em sala de aula e perguntas e descobertas ligadas a caminhos de leitura. Na verdade, une teoria e prática, ao tentar entender alguns dos mecanismos das narrativas embasadas no medo e apresentar alguns textos que levam o leitor a ficar com o coração acelerado, a respiração entrecortada, que lhe causam calafrios e um tremer de pernas. São muitas as reações físicas a situações de medo que aparecem no cotidiano e se espraiam. Por vezes, transformam-se em narrativas, vindo a se constituir em um circuito de textos que vai sendo acionado oralmente e reafirma as reações de susto. No entanto, o estímulo que deflagra o medo pode ser uma narrativa escrita, capaz de manter o leitor em estado de alerta e lançar adrenalina em seu corpo, abalando suas crenças, pensamentos, representações. Em suma, abalando as relações entre razão e o que não é racional.

Sob o domínio do medo

Que condições provocam essa paixão, o medo? E quais seriam os principais elementos das narrativas de terror? Comecemos por ir no rastro de Howard Phillips Lovecraft. Nascido em 1870 e falecido em 1937, escritor e ensaísta, em seu longo ensaio O horror sobrenatural na literatura (Francisco Alves, 1987), formulou uma estética da história do horror sobrenatural. O ensaio surgiu encomendado por um amigo, que pretendia publicá-lo em uma revista especializada (1924), e reveste-se de especial importância por apresentar um estudo de um escritor que é também ficcionista - entre as obras de Lovecraft situa-se A tumba, considerada uma obra-prima da literatura de terror.

O discurso de O horror sobrenatural na literatura se constrói ao arrolar obras e mais obras, como se fosse um catálogo, só que fortemente amarrado, numa unidade orgânica. O autor reconta os livros que leu, unindo-os na sua busca principal, que é a da psicologia do medo. A idéia perseguida ao longo do ensaio é que a emoção mais forte e mais antiga do mundo é o medo, e, dentro dessa emoção, a mais forte seria a do medo do desconhecido. Lovecraft procura mostrar que a atração pelo espectral e pelo macabro exige do leitor uma certa dose de imaginação e capacidade de desligamento da vida cotidiana. E aponta que relativamente poucos são os que se deixam levar por uma sedução pelo desconhecido.

Nas narrativas de horror, para Lovecraft, o mais importante seria o clima, a atmosfera. Assim, o único teste da literatura verdadeira de horror é saber se suscita no leitor um sentimento de profunda apreensão, uma atitude sutil de escuta ofegante. E esse sentimento se perpetua. Os textos de terror são muito, muito antigos. O horror cósmico aparece em narrativas do mais remoto folclore; as cerimônias de conjuração de demônios são comuns em rituais antigos; tipos e personagens sombrios de mitos e lendas passaram por séculos, via tradição oral, e tornaram-se parte da herança permanente da humanidade. Por exemplo, a sombra que aparece e reclama o sepultamento de seus ossos, o demônio enamorado que vem raptar a amada, ainda viva, o homem lobo, o mágico imortal, foram narrados em antigas civilizações, passaram e se fortificaram na Idade Média, para continuarem em nosso tempo.

O horror narrado

São muitas as narrativas que causam medo. Contudo, algumas podem ser entrevistas como matrizes, visto que inauguram uma certa linhagem. Provocam influência e continuam, até hoje, vivas, seja pela leitura, seja pelo recontar, seja por sua inserção em outras formas de discursos. Todas surgiram no século XIX: Frankenstein ou O moderno Prometeu (1816) , de Mary Shelley; O médico e o monstro- o estranho caso do Dr. Jeckyll e Mr. Hyde (1885), de Robert Louis Stevenson, e Drácula (1897) de Bram Stocker. Vale a pena recordar que as obras ensejaram mais de cem filmes e, tanto nos desenhos televisivos como nas histórias em quadrinhos, vemos marcas de seu poder. Também nos RPG e jogos de computador podemos encontrá-las. E não é à toa que comparecem enfeixadas em um único livro publicado pela Ediouro (2002), traduzidas com cuidado por Adriana Lisboa.

Frankenstein apresenta a possibilidade de o ser humano criar vida - em suma, de se acreditar Deus. Fruto da Ciência, a criatura formada pelo Dr. Victor Frankenstein desafia a moral, deixando entrever o questionamento dos limites entre o errado, numa espécie de ética de expansão. A narrativa trata de responsabilidades, entre criadores e criadores, e nada poderia ser mais atual em um época como a nossa,em que a criação de humanos,através da clonagem, tornou-se uma realidade. Drácula aciona a idéia de finitude da humanidade, justamente por apresentar a imortalidade como eixo. O desdobramento obtido a partir do sangue remete ao aspecto sexual, mas o erotismo é velado.. Em O médico e o monstro, o tema da duplicidade comparece e faz com que um médico- perfeito espécime social -acabe por perder seu senso de naturalidade e transforme-se, por meio de uma poção, em um monstro, capaz de crimes brutais. Bem e mal aqui travam uma luta dentro de uma única criatura.Nos protagonistas das três obras, concentra-se, à maneira romântica, o desejo de descobrir a essência do humano, nelas concretizada a partir de imagens e metáforas. Na verdade, podemos até não querer entrar em contato com essas personagens, mas elas persistem em nossa cultura justamente por mostrarem o desconhecido que nos habita.

Sustos e revelações são artifícios dessas obras, e encontram-se também presentes em lendas do folclore brasileiro, em Não olhe atrás da porta, de Lia Neiva, em Pente de Vênus, de Heloísa Seixas, nas lendas urbanas que circulam na Internet e percorrem as cidades, e em muitos outros textos. Tais narrativas exibem-se, muitas vezes, como rituais e distorções de nossos maiores medos, trabalhados, metaforicamente ou não, no tecido textual.

Entre sapos

A oralidade sempre perseguiu os efeitos de suspense, ao tentar manter a atenção dos ouvintes e suspender o fluxo contínuo do narrar pela quebra de expectativa ou aniquilamento de sensações. Pode, também, utilizar recursos de comicidade para destruir a atmosfera pesada do narrado.

Assim acontece em “O sapo com medo d’água”, narrativa coletada por Câmara Cascudo. Nela, o medo do sapo liga-se à sua esperteza, e, a estratégia do protagonista consiste em acionar o contrário, pelo discurso, da expectativa de seus oponentes. Assim, a cada ameaça, sucede-se a sua desconstrução, (“- Vamos jogar o sapo nos espinhos! -Espinhos não furam o meu couro - dizia o sapo. - Vamos queimar o sapo.- Eu no fogo estou em casa!”: CASCUDO, p. 212), até que se chega ao clímax, onde a água - em que o sapo sente-se à vontade, aparece como elemento ameaçador (“-Me bote no fogo! Me bote no fogo! N’água eu me afogo!” (CASCUDO , p. 213) . Quebra de expectativa, esperteza,um discurso às avessas são elementos que contribuem para a apresentação do ter medo/não ter medo.

São várias as narrativas que se organizam a partir da exibição de situações de medo, que depois são mexidas para que se desconstrua a imagem de temor.

De morte

Afinal, qual o grande medo humano? Da morte, é claro. E, dentre as narrativas que a tematizam, uma é especial. O escritor Ricardo Azevedo,em sua obra Meu livro de folclore, apresenta o conto “Gaspar, eu caio”, em que o sobrenatural é explorado e denuncia a capacidade de fabular e fantasiar. Os ossos que vão caindo e formando um esqueleto, que irá lutar com o vitorioso viajante, lembram ao leitor a finitude do seu corpo. Aliás, todos os medos se concentram no medo da morte, cultuada e tema recorrente em histórias folclóricas. Na verdade, o que se deseja é enganá-la, como acontece nos Contos de enganar a morte, também de Ricardo Azevedo. Neles, através da audácia, da perspicácia ou da esperteza, a morte não consegue seu intento. Através das narrativas, a carga simbólica negativa que a morte recebe na tradição ocidental é amenizada por desvio de intenções.

A morte encontra-se também recuperada por Ângela Lago. Como exemplo, a obra De morte!, reescritura do conto folclórico, salpicada de ilustrações de Dürer com interferências. Aqui a Morte também é enganada durante algum tempo, com humor e esperteza. E a escritora prossegue em Sete histórias para sacudir o esqueleto, o que pode correr por sensações de riso ou de pavor por parte do leitor. Afinal,o esqueleto pode ser sacudido pela comicidade ou pela montagem de um contexto que se avizinha e,ao mesmo tempo, distancia-se do conhecimento do leitor, o que cria uma possibilidade de nova percepção de leitura.

Portas e crenças

Tanto em Não olhe atrás da porta como em Histórias de não se crer, a escritora Lia Neiva trabalha com o sólito, o universo corriqueiro, para que sirva de suporte aos elementos que apontam para o estranho. Habilmente mesclados pela autora, em processos de verossimilhança plasmados com eficácia, o usual e o estranho comportam um efeito sobre o leitor. A via é a do simbólico, e do prosaico cotidiano, do espaço conhecido e ameno irrompe,de chofre,a impressão de estranheza, desequilibrando a ordem aparentemente cristalizada dos seres ficcionais.Tudo é familiar, e, ao mesmo tempo, inquietante. Dentro desse movimento de sentido, os efeitos inesperados, em alguns contos, levam à revelação e à angústia. A tensão, como efeito do discurso, é a pedra de toque das narrativas. O prazer estético tradicional, que se marca por um sentimento positivo, de belo ou sublime, aqui desvia-se, sugerindo um prazer diferente - o de decifrar,aliado ao empreendimento de penetrar no sentido humano. No primeiro conto de Histórias de não se crer, ”Um gole de chá”, a ação nos é revelada por intermédio de um bule, em primeira pessoa; que começa por avizinhar-se do estranhamento. “Há muita coisa nesta vida que vai além da nossa compreensão: bruxarias, por exemplo.” (p. 12). Insólito, fantástico, a inquietante estranheza que foi um conceito largamente estudado por Freud - que mostrou que ,em alemão, o estranho, o sinistro se opõe ao que é íntimo, do lar. Da insinuação de que algo está errado advém o grande medo -do desconhecido.

Do mínimo ao máximo; de Heloísa em Heloísa

A literatura de terror, bem como a policial, não encontra grande desenvolvimento no Brasil. Embora tenhamos um imaginário pleno de mitos e lendas calcadas em situações assustadoras, quando se trata de literatura, principalmente a destinada a adultos, são poucos os empreendimentos no gênero.

Torna-se, portanto, de suma importância a presença de duas escritoras no panorama literário atual: Heloísa Prieto e Heloísa Seixas. A primeira, seja através da organização de antologias, seja através da coleta de mitos e lendas, ou de escrita singular, envereda pelos caminhos do sobrenatural e discute a humanidade a partir do que sai dela. Sua última obra, Rotas fantásticas (FTD, 2003), reúne dez relatos, meticulosamente construídos, tomando por base lendas urbanas que circulam no país. A apresentação gráfica as recobre de mistério e possibilita um reorganizar de sentido pelos leitores, visto que os textos se apresentam como componentes de um fichário, à maneira policial, que deve ser preenchido com indagações. Figuras que povoam o cotidiano dos brasileiros irrompem nos textos. E, nestes novos tempos, a internet dissemina as narrativas, como a ”Loira do banheiro” e paga-lhes o tributo de autenticidade.

A outra Heloísa, a Seixas, recuperou textos de esquecidos escritores de terror e trouxe-os a leitores atuais, entre eles os de Ambrose Bierce e Algernon Blackwood. Paralelamente, cria os seus textos, publicados em livro (Pente de Vênus) ou nas páginas da revista domingo, do Jornal do Brasil. Os textos no espaço do jornal, que se condensam em mínimas palavras, permitem a inserção do inexplicado. O leitor, ao se defrontar com eles, tem outras possibilidades de espreitar o mundo. E em Pente de Vênus, reconhece-se Ann Radcliffe e Edgar Allan Poe. Fundamentalmente, seus contos são recheados de fantasmas, que muitas vezes não são exteriores, mas espectro do próprio viver na dimensão feminina.

Curiosidade e esquiva

O verdadeiro autor de histórias de terror, qualquer que seja a sua dimensão, explora os limites do que as pessoas são capazes de fazer e as fronteiras do que são capazes de experienciar. Assim ele se aventura nos domínios do caos psicológico, desertos emocionais, traumas psíquicos, abismos abertos pela imaginação, histeria e loucura, todos os elementos que ficariam na divisa do bárbaro. As narrativas de terror muitas vezes apresentam imagens e figuras de caos e sofrimento, como se tematizassem várias espécies de “inferno”, tomando a palavra como exemplo de uma condição humana extrema.

Trabalhemos um pouco com as palavras “horror” e “terror”. O horror deriva do latim horrere: fazer o cabelo se arrepiar. Ou seja, horripilar: horrorizar, eriçar os cabelos, arrepiar. Vem do latim eclesiástico horripilare. O que causa o eriçamento dos cabelos.Já terror viria do latim terrorem, do tema de terrere, espaventar, causar grande medo.Assim, numa abordagem etimológica superficial, poderíamos aventar a hipótese de que o horror é uma reação física, enquanto o terror seria uma reação provocada pelo sobrenatural, pelo desconhecido, a ameaça desconhecida.. De qualquer forma, as narrativas de horror de terror ( ou horror) parecem surgir com a tentativa de encontrar adequados símbolos e descrições para forças, medos e energias primitivas relacionadas à morte, à vida após a morte, punição, mal, violência e destruição.

Convenhamos que, na época em que vivemos, tornou-se difícil encontrar quem não tenha participado de uma experiência de horror. E, caso tenha a sorte de não a ter vivenciado, pelo menos com ela defrontou-se na mídia, haja vista a profusão de imagens violentas que inundam nosso cotidiano via meios de comunicação. Assim ,enquanto sentamos num sofá, cadeira ou poltrona para ver televisão, confortavelmente recostados, entram em nosso lar imagens de guerras, terremotos, assassinatos, em meio a anúncios de máquinas de lavar, iogurtes e carros. Também ao abrirmos os jornais encontramos o mesmo panorama.

Basta lembrar acidentes de carros, em que motoristas quase batem ao tentar olhar o que aconteceu. Podemos ler neste gesto curiosidade ou até mesmo solidariedade humana, mas sabemos que não é bem isto que os move. E nem adianta afirmar que esse é uma reação que visualiza a realidade como ficção. Qualquer que seja o ângulo de abordagem, continua a ser fundamental a idéia de procura pelo desconhecido, e busca pela sensação de susto e repulsa. E, ainda além, constata-se que as pessoas se sentem fascinadas pelo que lhes causa repulsa.

Olhar o acidente e, ao mesmo tempo, desviar o olhar. Ou, como as crianças, espalmar a mão aberta sobre o rosto e ver entre os dedos, negando e procurando a visão. Stephen King nos revela, em seu prefácio ao volume Sombras na noite, que o leitor de terror é justamente aquele que não consegue desviar o olhar do acidente. E, ainda, observa que existem narrativas que mostram o próprio acidente, em detalhes (o que pode ser percebido, por certos críticos, como mau gosto) e outras que apenas exibem as ferragens retorcidas, deixando ao leitor a tarefa de imaginar o que aconteceu. Entre as trevas e o demoníaco, entre rastros e sombras, pulsa o desejo do conhecimento, de desvendar o mistério, de subjugar o mundo, de entender a existência. E multiplicam-se leitores que as desejam.

BIBLIOGRAFIA

AZEVEDO, Ricardo. Contos de enganar a morte. São Paulo: Ática, 2003.

------. Meu livro de folclore. São Paulo: Ática, 1999.

CASCUDO, Câmara. Contos tradicionais do Brasil. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999.

DELUMEAU, Jean. História do medo no Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

KING, Stephen. Sombras da noite. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1984.

LAGO, Ângela.De morte! Belo Horizonte: RHJ, 1992.

------. Sete histórias para sacudir o esqueleto. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2002.

LOVECRAFT, Howard P. O horror sobrenatural na literatura. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1978.

NEIVA, Lia. Histórias de não se crer. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1987.

------. Não olhe atrás da porta. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1989.

PRIETO, Heloísa. Rotas Fantásticas. São Paulo: FTD, 2003.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos .Rio de Janeiro: Record, 2001.

------. Pente de Vênus. Porto Alegre: Sulina,1995.

MEDO E TERROR
NA LITERATURA INFANTO-JUVENIL BRASILEIRA

Rosa Gens (UFRJ)

Pé ante pé

Já há algum tempo, vemo-nos invadidos por um sentimento que ultrapassa muros, vidros e mentes, deixando-nos despreparados para a vida. O medo está presente no nosso cotidiano e estende seus braços por todos os setores de atividades em que nos encontremos. Os perigos do mundo são redimensionados e, por vezes, tornam-se desmesurados, atingidos pelo nosso olhar medroso constante. Jean Delumeau nos revela, em sua História do medo no Ocidente, que, nos primeiros tempos, os medos eram oriundos, fundamentalmente, da Natureza. Em nossa época, o grande perigo está no próprio homem.

Dentro dessa perspectiva inquietante, por que dar atenção a narrativas que se centralizam no medo? Basta pensar na presença deste sentimento em nossa civilização e, inicialmente, no movimento de fascinação que crianças e jovens têm apresentado, ao longo dos últimos anos, em relação às obras que se fundamentam no susto e no pavor. Nas três últimas décadas, principalmente, multiplicaram-se livros e filmes que provocam sensações de horror e, mais do que isso, fazem do medo o seu tema básico. Disseminam-se pela indústria cultural e provocam sensações certeiras. Um arrepio, um recuo ao toque, uma sensação de náusea, repulsa e pronto: estamos face ao que não desejávamos e é impossível recuar.

O horror, é certo, nos causa ameaça. Em última instância, ameaça o nosso mundo, que já anda para lá de ameaçador. Não é de espantar que as cidades se envolvam em artefatos,amaneiradas cidadelas medievais,para que se afaste o medo, e, é claro, os bárbaros que possam causá-lo Assim, engenhocas são mentadas para que os civilizados se sintam mais seguros, envoltos em redes ou grades, em circuitos fechados. No entanto, por entre possibilidades de balas perdidas e um assalto a cada esquina, podemos nos dar ao luxo de ficarmos assustados com histórias de vampiros, lobisomens, monstros, fantasmas...

Preocupados que estamos (ou somos), nós, profissionais ligados à leitura, procuramos a cada dia novas formas e maneiras de apresentar e escolher textos. Foi assim que surgiu este trabalho - de constatações em sala de aula e perguntas e descobertas ligadas a caminhos de leitura. Na verdade, une teoria e prática, ao tentar entender alguns dos mecanismos das narrativas embasadas no medo e apresentar alguns textos que levam o leitor a ficar com o coração acelerado, a respiração entrecortada, que lhe causam calafrios e um tremer de pernas. São muitas as reações físicas a situações de medo que aparecem no cotidiano e se espraiam. Por vezes, transformam-se em narrativas, vindo a se constituir em um circuito de textos que vai sendo acionado oralmente e reafirma as reações de susto. No entanto, o estímulo que deflagra o medo pode ser uma narrativa escrita, capaz de manter o leitor em estado de alerta e lançar adrenalina em seu corpo, abalando suas crenças, pensamentos, representações. Em suma, abalando as relações entre razão e o que não é racional.

Sob o domínio do medo

Que condições provocam essa paixão, o medo? E quais seriam os principais elementos das narrativas de terror? Comecemos por ir no rastro de Howard Phillips Lovecraft. Nascido em 1870 e falecido em 1937, escritor e ensaísta, em seu longo ensaio O horror sobrenatural na literatura (Francisco Alves, 1987), formulou uma estética da história do horror sobrenatural. O ensaio surgiu encomendado por um amigo, que pretendia publicá-lo em uma revista especializada (1924), e reveste-se de especial importância por apresentar um estudo de um escritor que é também ficcionista - entre as obras de Lovecraft situa-se A tumba, considerada uma obra-prima da literatura de terror.

O discurso de O horror sobrenatural na literatura se constrói ao arrolar obras e mais obras, como se fosse um catálogo, só que fortemente amarrado, numa unidade orgânica. O autor reconta os livros que leu, unindo-os na sua busca principal, que é a da psicologia do medo. A idéia perseguida ao longo do ensaio é que a emoção mais forte e mais antiga do mundo é o medo, e, dentro dessa emoção, a mais forte seria a do medo do desconhecido. Lovecraft procura mostrar que a atração pelo espectral e pelo macabro exige do leitor uma certa dose de imaginação e capacidade de desligamento da vida cotidiana. E aponta que relativamente poucos são os que se deixam levar por uma sedução pelo desconhecido.

Nas narrativas de horror, para Lovecraft, o mais importante seria o clima, a atmosfera. Assim, o único teste da literatura verdadeira de horror é saber se suscita no leitor um sentimento de profunda apreensão, uma atitude sutil de escuta ofegante. E esse sentimento se perpetua. Os textos de terror são muito, muito antigos. O horror cósmico aparece em narrativas do mais remoto folclore; as cerimônias de conjuração de demônios são comuns em rituais antigos; tipos e personagens sombrios de mitos e lendas passaram por séculos, via tradição oral, e tornaram-se parte da herança permanente da humanidade. Por exemplo, a sombra que aparece e reclama o sepultamento de seus ossos, o demônio enamorado que vem raptar a amada, ainda viva, o homem lobo, o mágico imortal, foram narrados em antigas civilizações, passaram e se fortificaram na Idade Média, para continuarem em nosso tempo.

O horror narrado

São muitas as narrativas que causam medo. Contudo, algumas podem ser entrevistas como matrizes, visto que inauguram uma certa linhagem. Provocam influência e continuam, até hoje, vivas, seja pela leitura, seja pelo recontar, seja por sua inserção em outras formas de discursos. Todas surgiram no século XIX: Frankenstein ou O moderno Prometeu (1816) , de Mary Shelley; O médico e o monstro- o estranho caso do Dr. Jeckyll e Mr. Hyde (1885), de Robert Louis Stevenson, e Drácula (1897) de Bram Stocker. Vale a pena recordar que as obras ensejaram mais de cem filmes e, tanto nos desenhos televisivos como nas histórias em quadrinhos, vemos marcas de seu poder. Também nos RPG e jogos de computador podemos encontrá-las. E não é à toa que comparecem enfeixadas em um único livro publicado pela Ediouro (2002), traduzidas com cuidado por Adriana Lisboa.

Frankenstein apresenta a possibilidade de o ser humano criar vida - em suma, de se acreditar Deus. Fruto da Ciência, a criatura formada pelo Dr. Victor Frankenstein desafia a moral, deixando entrever o questionamento dos limites entre o errado, numa espécie de ética de expansão. A narrativa trata de responsabilidades, entre criadores e criadores, e nada poderia ser mais atual em um época como a nossa,em que a criação de humanos,através da clonagem, tornou-se uma realidade. Drácula aciona a idéia de finitude da humanidade, justamente por apresentar a imortalidade como eixo. O desdobramento obtido a partir do sangue remete ao aspecto sexual, mas o erotismo é velado.. Em O médico e o monstro, o tema da duplicidade comparece e faz com que um médico- perfeito espécime social -acabe por perder seu senso de naturalidade e transforme-se, por meio de uma poção, em um monstro, capaz de crimes brutais. Bem e mal aqui travam uma luta dentro de uma única criatura.Nos protagonistas das três obras, concentra-se, à maneira romântica, o desejo de descobrir a essência do humano, nelas concretizada a partir de imagens e metáforas. Na verdade, podemos até não querer entrar em contato com essas personagens, mas elas persistem em nossa cultura justamente por mostrarem o desconhecido que nos habita.

Sustos e revelações são artifícios dessas obras, e encontram-se também presentes em lendas do folclore brasileiro, em Não olhe atrás da porta, de Lia Neiva, em Pente de Vênus, de Heloísa Seixas, nas lendas urbanas que circulam na Internet e percorrem as cidades, e em muitos outros textos. Tais narrativas exibem-se, muitas vezes, como rituais e distorções de nossos maiores medos, trabalhados, metaforicamente ou não, no tecido textual.

Entre sapos

A oralidade sempre perseguiu os efeitos de suspense, ao tentar manter a atenção dos ouvintes e suspender o fluxo contínuo do narrar pela quebra de expectativa ou aniquilamento de sensações. Pode, também, utilizar recursos de comicidade para destruir a atmosfera pesada do narrado.

Assim acontece em “O sapo com medo d’água”, narrativa coletada por Câmara Cascudo. Nela, o medo do sapo liga-se à sua esperteza, e, a estratégia do protagonista consiste em acionar o contrário, pelo discurso, da expectativa de seus oponentes. Assim, a cada ameaça, sucede-se a sua desconstrução, (“- Vamos jogar o sapo nos espinhos! -Espinhos não furam o meu couro - dizia o sapo. - Vamos queimar o sapo.- Eu no fogo estou em casa!”: CASCUDO, p. 212), até que se chega ao clímax, onde a água - em que o sapo sente-se à vontade, aparece como elemento ameaçador (“-Me bote no fogo! Me bote no fogo! N’água eu me afogo!” (CASCUDO , p. 213) . Quebra de expectativa, esperteza,um discurso às avessas são elementos que contribuem para a apresentação do ter medo/não ter medo.

São várias as narrativas que se organizam a partir da exibição de situações de medo, que depois são mexidas para que se desconstrua a imagem de temor.

De morte

Afinal, qual o grande medo humano? Da morte, é claro. E, dentre as narrativas que a tematizam, uma é especial. O escritor Ricardo Azevedo,em sua obra Meu livro de folclore, apresenta o conto “Gaspar, eu caio”, em que o sobrenatural é explorado e denuncia a capacidade de fabular e fantasiar. Os ossos que vão caindo e formando um esqueleto, que irá lutar com o vitorioso viajante, lembram ao leitor a finitude do seu corpo. Aliás, todos os medos se concentram no medo da morte, cultuada e tema recorrente em histórias folclóricas. Na verdade, o que se deseja é enganá-la, como acontece nos Contos de enganar a morte, também de Ricardo Azevedo. Neles, através da audácia, da perspicácia ou da esperteza, a morte não consegue seu intento. Através das narrativas, a carga simbólica negativa que a morte recebe na tradição ocidental é amenizada por desvio de intenções.

A morte encontra-se também recuperada por Ângela Lago. Como exemplo, a obra De morte!, reescritura do conto folclórico, salpicada de ilustrações de Dürer com interferências. Aqui a Morte também é enganada durante algum tempo, com humor e esperteza. E a escritora prossegue em Sete histórias para sacudir o esqueleto, o que pode correr por sensações de riso ou de pavor por parte do leitor. Afinal,o esqueleto pode ser sacudido pela comicidade ou pela montagem de um contexto que se avizinha e,ao mesmo tempo, distancia-se do conhecimento do leitor, o que cria uma possibilidade de nova percepção de leitura.

Portas e crenças

Tanto em Não olhe atrás da porta como em Histórias de não se crer, a escritora Lia Neiva trabalha com o sólito, o universo corriqueiro, para que sirva de suporte aos elementos que apontam para o estranho. Habilmente mesclados pela autora, em processos de verossimilhança plasmados com eficácia, o usual e o estranho comportam um efeito sobre o leitor. A via é a do simbólico, e do prosaico cotidiano, do espaço conhecido e ameno irrompe,de chofre,a impressão de estranheza, desequilibrando a ordem aparentemente cristalizada dos seres ficcionais.Tudo é familiar, e, ao mesmo tempo, inquietante. Dentro desse movimento de sentido, os efeitos inesperados, em alguns contos, levam à revelação e à angústia. A tensão, como efeito do discurso, é a pedra de toque das narrativas. O prazer estético tradicional, que se marca por um sentimento positivo, de belo ou sublime, aqui desvia-se, sugerindo um prazer diferente - o de decifrar,aliado ao empreendimento de penetrar no sentido humano. No primeiro conto de Histórias de não se crer, ”Um gole de chá”, a ação nos é revelada por intermédio de um bule, em primeira pessoa; que começa por avizinhar-se do estranhamento. “Há muita coisa nesta vida que vai além da nossa compreensão: bruxarias, por exemplo.” (p. 12). Insólito, fantástico, a inquietante estranheza que foi um conceito largamente estudado por Freud - que mostrou que ,em alemão, o estranho, o sinistro se opõe ao que é íntimo, do lar. Da insinuação de que algo está errado advém o grande medo -do desconhecido.

Do mínimo ao máximo; de Heloísa em Heloísa

A literatura de terror, bem como a policial, não encontra grande desenvolvimento no Brasil. Embora tenhamos um imaginário pleno de mitos e lendas calcadas em situações assustadoras, quando se trata de literatura, principalmente a destinada a adultos, são poucos os empreendimentos no gênero.

Torna-se, portanto, de suma importância a presença de duas escritoras no panorama literário atual: Heloísa Prieto e Heloísa Seixas. A primeira, seja através da organização de antologias, seja através da coleta de mitos e lendas, ou de escrita singular, envereda pelos caminhos do sobrenatural e discute a humanidade a partir do que sai dela. Sua última obra, Rotas fantásticas (FTD, 2003), reúne dez relatos, meticulosamente construídos, tomando por base lendas urbanas que circulam no país. A apresentação gráfica as recobre de mistério e possibilita um reorganizar de sentido pelos leitores, visto que os textos se apresentam como componentes de um fichário, à maneira policial, que deve ser preenchido com indagações. Figuras que povoam o cotidiano dos brasileiros irrompem nos textos. E, nestes novos tempos, a internet dissemina as narrativas, como a ”Loira do banheiro” e paga-lhes o tributo de autenticidade.

A outra Heloísa, a Seixas, recuperou textos de esquecidos escritores de terror e trouxe-os a leitores atuais, entre eles os de Ambrose Bierce e Algernon Blackwood. Paralelamente, cria os seus textos, publicados em livro (Pente de Vênus) ou nas páginas da revista domingo, do Jornal do Brasil. Os textos no espaço do jornal, que se condensam em mínimas palavras, permitem a inserção do inexplicado. O leitor, ao se defrontar com eles, tem outras possibilidades de espreitar o mundo. E em Pente de Vênus, reconhece-se Ann Radcliffe e Edgar Allan Poe. Fundamentalmente, seus contos são recheados de fantasmas, que muitas vezes não são exteriores, mas espectro do próprio viver na dimensão feminina.

Curiosidade e esquiva

O verdadeiro autor de histórias de terror, qualquer que seja a sua dimensão, explora os limites do que as pessoas são capazes de fazer e as fronteiras do que são capazes de experienciar. Assim ele se aventura nos domínios do caos psicológico, desertos emocionais, traumas psíquicos, abismos abertos pela imaginação, histeria e loucura, todos os elementos que ficariam na divisa do bárbaro. As narrativas de terror muitas vezes apresentam imagens e figuras de caos e sofrimento, como se tematizassem várias espécies de “inferno”, tomando a palavra como exemplo de uma condição humana extrema.

Trabalhemos um pouco com as palavras “horror” e “terror”. O horror deriva do latim horrere: fazer o cabelo se arrepiar. Ou seja, horripilar: horrorizar, eriçar os cabelos, arrepiar. Vem do latim eclesiástico horripilare. O que causa o eriçamento dos cabelos.Já terror viria do latim terrorem, do tema de terrere, espaventar, causar grande medo.Assim, numa abordagem etimológica superficial, poderíamos aventar a hipótese de que o horror é uma reação física, enquanto o terror seria uma reação provocada pelo sobrenatural, pelo desconhecido, a ameaça desconhecida.. De qualquer forma, as narrativas de horror de terror ( ou horror) parecem surgir com a tentativa de encontrar adequados símbolos e descrições para forças, medos e energias primitivas relacionadas à morte, à vida após a morte, punição, mal, violência e destruição.

Convenhamos que, na época em que vivemos, tornou-se difícil encontrar quem não tenha participado de uma experiência de horror. E, caso tenha a sorte de não a ter vivenciado, pelo menos com ela defrontou-se na mídia, haja vista a profusão de imagens violentas que inundam nosso cotidiano via meios de comunicação. Assim ,enquanto sentamos num sofá, cadeira ou poltrona para ver televisão, confortavelmente recostados, entram em nosso lar imagens de guerras, terremotos, assassinatos, em meio a anúncios de máquinas de lavar, iogurtes e carros. Também ao abrirmos os jornais encontramos o mesmo panorama.

Basta lembrar acidentes de carros, em que motoristas quase batem ao tentar olhar o que aconteceu. Podemos ler neste gesto curiosidade ou até mesmo solidariedade humana, mas sabemos que não é bem isto que os move. E nem adianta afirmar que esse é uma reação que visualiza a realidade como ficção. Qualquer que seja o ângulo de abordagem, continua a ser fundamental a idéia de procura pelo desconhecido, e busca pela sensação de susto e repulsa. E, ainda além, constata-se que as pessoas se sentem fascinadas pelo que lhes causa repulsa.

Olhar o acidente e, ao mesmo tempo, desviar o olhar. Ou, como as crianças, espalmar a mão aberta sobre o rosto e ver entre os dedos, negando e procurando a visão. Stephen King nos revela, em seu prefácio ao volume Sombras na noite, que o leitor de terror é justamente aquele que não consegue desviar o olhar do acidente. E, ainda, observa que existem narrativas que mostram o próprio acidente, em detalhes (o que pode ser percebido, por certos críticos, como mau gosto) e outras que apenas exibem as ferragens retorcidas, deixando ao leitor a tarefa de imaginar o que aconteceu. Entre as trevas e o demoníaco, entre rastros e sombras, pulsa o desejo do conhecimento, de desvendar o mistério, de subjugar o mundo, de entender a existência. E multiplicam-se leitores que as desejam.

BIBLIOGRAFIA

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------. Meu livro de folclore. São Paulo: Ática, 1999.

CASCUDO, Câmara. Contos tradicionais do Brasil. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999.

DELUMEAU, Jean. História do medo no Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

KING, Stephen. Sombras da noite. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1984.

LAGO, Ângela.De morte! Belo Horizonte: RHJ, 1992.

------. Sete histórias para sacudir o esqueleto. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2002.

LOVECRAFT, Howard P. O horror sobrenatural na literatura. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1978.

NEIVA, Lia. Histórias de não se crer. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1987.

------. Não olhe atrás da porta. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1989.

PRIETO, Heloísa. Rotas Fantásticas. São Paulo: FTD, 2003.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos .Rio de Janeiro: Record, 2001.

------. Pente de Vênus. Porto Alegre: Sulina,1995.