A influência da oralidade
na atividade de produção textual escrita

Ana Paula Pena de Souza Reis (UBM)
Fernanda Paola de Souza da Silveira (UBM)
Sílvia Helena Ferreira (UBM)

INTRODUÇÃO

Este trabalho, resultado parcial de atividade de Iniciação Científica, realizada no Centro Universitário de Barra Mansa, tem como tema a análise das marcas de oralidade presentes no texto escrito por alunos da 5ª série do Ensino Fundamental da Escola Estadual Luiz Gonzaga de Mattos.

Nosso objetivo é observar quais características de oralidade são mais empregadas inadequadamente no texto escrito desses alunos. De posse dessa noção, pretendemos também sugerir algumas atividades que possam ser trabalhadas, a fim de que os alunos entendam que há textos especificamente escritos, outros essencialmente falados e aqueles que coadunam características de oralidade e escrita, uma vez que, de acordo com Marcuschi (2001), no sistema lingüístico existe um contínuo tipológico e não duas modalidades completamente distintas.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Primeiramente é necessário observar que, na escola, se professor quer que seu aluno escreva bons textos, deve prepará-lo para isso. Essa preparação não pode ser apenas com atividades de descrição lingüística, conforme afirma Ramos (1997).Na verdade é necessário que se trabalhem atividades de elaboração textual, as quais devem partir de situações de fala, para gradativamente, alcançar a produção escrita.

Importa também que o trabalho seja desenvolvido com a utilização de diferentes gêneros discursivos, escolhendo-se aqueles mais recorrentes nos meios sociais dos alunos. Sendo assim, pode-se, em princípio, trabalhar com fábulas, histórias em quadrinhos, resumo de novelas, propagandas, anúncios, cartas, bilhetes, receitas, entre outros.

Tudo isso, enfim, deve partir de uma nova visão do professor, que precisará decidir se quer que o aluno saiba produzir textos adequados às diferentes situações que enfrentará durante sua vida ou se deseja que ele saiba apenas descrever a língua.

Para que o aluno se torne um escritor efetivo, um passo importante é modificar a idéia de norma culta que ele possui. Isso deverá ser feito a partir da interação professor/aluno, proporcionando situações de uso dessa variedade, pois “é usando que se aprende a usar”. Esse trabalho é possível, uma vez que existem situações naturais de uso de tal modalidade, com na simulação de um jornal televisivo, por exemplo. Sabemos que os noticiários são fontes da língua padrão no Brasil.

Com essa intenção, também poderão ser feitas atividades de comparação entre uma mesma notícia anunciada em telejornais diferentes, despertando no aluno o senso crítico como usuário da língua e como telespectador. Este tipo de atividade possibilita a participação de todos os alunos, até mesmo do analfabeto funcional, pois a leitura ficaria apenas como complemento. Quando o aluno produz textos escritos, a partir dessas atividades, ele, conseqüentemente, apresenta menos dificuldade de organização, além de demonstrar a aquisição de informações contextualizadas que terão utilidades no dia-a-dia.

Esta harmonia nas atividades que envolvem texto escrito e texto falado é oriunda do fato de ambos apresentarem um processo em comum: o texto falado segue o processo de construção-reconstrução desconstituição, isto serve de instrumento para avaliar e revisar textos escritos.

Uma outra atividade possível é aquela que visa à observação da relação entre pausa e mudança de linha. Essa estratégia permite fragmentar o texto falado em seqüências curtas e, ainda, distingo-lo da configuração típica do texto escrito. Ramos (1997) aconselha começar os estudos por transcrições já prontas e pedir a identificação dos traços de oralidade. O processo, que inicia com as transcrições de textos falados e termina com o registro desses nos moldes da escrita, inclui diferentes etapas, como eliminação das marcas de hesitação, introdução de pontuação, eliminação das repetições, introdução de parágrafos, reconstrução das estruturas trincadas etc. Esse tipo de exercício levará o aluno a desenvolver a habilidade de fazer revisões além de levá-lo a tomar conhecimento das exigências do texto escrito.

Em seguida, serão observadas as marcas da oralidade mais freqüentes nas produções escritas de alunos da 5a. série analisada.

Observou-se muita evidência na estratégia da repetição, a qual corresponde a uma estratégia conversacional de manutenção do turno. Nos textos dos alunos, entretanto, essa atividade denota falta de vocabulário ou desconhecimento dos recursos disponíveis na língua para se evitar a repetição e realizar, ao mesmo tempo, a coesão textual, conforme aborda Koch (2003).

(1)

O barba ázul tinha muito dinheiro ele tinha casa tinha um carrosceu e vivi muito bem.

(2)

Mas ela estava muito curioza e abril, e lá ela encontrou as outras mulheres de barba ázul. Ela foi olhar na do porão e viu que barba ázul estava voutando para casa. Rapdamente ela trancou o porão e voutou para a sala e sem mostrar medo ela recebeu seu marido com muita alegria.

(3)

Um dia ele fez um robo Pinoquiu que era um robo de tecnologia e não um robo de madeira.

Outra recorrência nos textos é a ausência de pontuação. Os textos evidenciam o desconhecimento da utilidade da pontuação, resultando num reflexo de fala, uma vez que na fala os pontos são evidenciadas pelas paradas, mas não com marcas lingüísticas.

(4)

Era uma vez um senhor de idade que se chamava gepeco ele é muito inteligente até que construir um pinguim chamado sr. Estubou com o passar do tempo gepeco construiu um pinóquio e nesse robo também colocou inteligência tecnologica 3000 gepedo todo feliz já foi logo ensinando à pinóquio as coisas boas da vida dizendo que um homem muito ruim que seu nome era prefeito ele era muito rico e com sua riquesa construiu um parque só para crianças humanas.

(5)

Barba ázul viu que a chave estava estranha e tentou agarrar a mulher mas não conseguil e ela subil as escadas da torre e viu que seus irmãos estava hegando e barba ázul ficou inprecionado e tentou fugir mas tonou um escurresgão e caiu e a escada abaixo.

Verificou-se, também, o emprego de marcadores conversacionais, elementos típicos da fala, que podem exercer funções diferenciadas de acordo com a situação em que se configuram. Vemos no fragmento (6), que a falta de domínio das estratégias discursivas de segmentação e coesão textual, faz com que os alunos empreguem recorrentemente a conjunção “e”, que acaba se configurando como um marcador conversacional de continuidade discursiva.

(6)

Barba ázul viu que a chave estava estranha e tentou agarrar a mulher mas não conseguil e ela subil as escadas da torre e viu que seus irmãos estava chegando e barba ázul ficou inprecionado e tentou fugir mas tonou um escurresgão e caiu e a escada abaixo.

Em (7), o marcador conversacional “” também é utilizado como recurso para dar continuidade ao texto, o que se deveria fazer com uma conjunção.

(7)

No dia seguinte gepedro falou para seu filho ir a escola ma apareceu uma fada madrinha e falou para o pinoquio não falar mentiras porque ele tem auta tecnologia e um coração puro.

Em (8), o recurso empregado para estabelecer a coesão textual é o emprego do marcador “então”. Esse recurso também tem a intenção de promover a organização do texto, evidenciando continuidade dos fatos.

(8)

Gipedo com tanta felizidade colocou Pinóquio na escola. Pinóquio todo feliz partiu pra lá e conheceu uma menina muito severa até mesmo cruel, esta menina dize para o Pinóquio que ele não poderia estuda por ele ser robô então Pinóquio já foi logo dizendo para ela – poço estuda sim sou criança feito você então eu tenho direito à estudar.

Pinóquio então entrou no colégio e lá conheceu pessoas boas e ruins como a filha do prefeito.

É fácil, ainda, notarmos os “erros” de ortografia, os quais se devem ao fato de aluno escrever de uma maneira muito próxima daquela como fala. Dessa forma, pode-se dizer que existe uma escrita “quase fonética”, pois se trata da representação exata do som que ele ouve ao pronunciar algumas palavras que escreve.

(9)

... senta vez ele tinha que parti para uma cidade. ele entregou sua chave na mão de um homem e dize? A chave pequena era de abi o poram e não podia abi.

(10)

Chamou e comesou a corre rolou de uma incada e foi luta com o irmão de sua homem.

Em relação à repetição, o professor pode utilizar uma transcrição, na qual a repetição seja recorrente e pedir aos alunos que retextualizem esse texto colocando-o no discurso indireto e eliminando as repetições.

De acordo com Marcuschi (1986), os marcadores conversacionais designam não só elementos verbais, mas também prosódicos e não lingüísticos que desempenham uma função interacional qualquer na fala. Em relação a eles, o professor pode trabalhar com a fábula que é um gênero que contém diálogos, ou seja, os marcadores conversacionais são mais presentes. Pode-se r dar uma fábula que contenha as características descritas acima e pedir para os alunos encontrarem e eliminarem os marcadores conversacionais, passando a fábula para a 3ª pessoa do singular, eliminando o discurso direto.

Quanto à pontuação, os erros são bastante freqüentes e acarretam problemas na compreensão do texto. Cabe ao professor levar o aluno a entender que o uso inadequado da pontuação pode prejudicar o sentido do texto. Uma sugestão seria pedir a um aluno que lesse a transcrição de um texto falado e que os demais alunos pontuassem de acordo com a leitura feita por esse. Pode-se, também, trabalhar com um conto. O professor colocaria uma gravação para os alunos ouvirem e, em seguida, daria o texto escrito, solicitando que eles realizassem a pontuação adequada. É importante ressaltar que não é possível trabalhar todos os pontos ao mesmo tempo, ao contrário, essa aprendizagem deve ocorrer de maneira gradativa.

CONCLUSÃO

Essa análise, ainda primária em relação ao projeto em desenvolvimento, leva-nos à conclusão que as marcas de oralidade, mais recorrentes no texto escrito, são a repetição, a ausência de pontuação, uma escrita próxima da transcrição fonética e o uso de marcadores conversacionais típicos da fala.

Diante disso, pôde-se enfocar a possibilidade do professor realizar atividades em que o aluno perceba que existem textos que são tipicamente escritos, aqueles que são tipicamente falados e outros que se configuram por meio da utilização de características de escrita e de fala.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FÁVERO, Leonor Lopes; ANDRADE, Maria Lúcia C.V.O. e AQUINO, Zilda G.O. Oralidade e escrita: perspectivas para o ensino de língua materna. São Paulo: Cortez, 1999.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Análise da Conversação. São Paulo: Ática, 1986.

––––––. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001.

RAMOS, Jânia M. O espaço da oralidade na sala de aula. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

 

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