ESTRUTURA DA ORAÇÃO

Luci Mary (UERJ)

Sílvio Elia em seu artigo intitulado Para uma teoria sintática da Revista Confluência afirma que oração é a frase sintaticamente articulada e contínua: “as orações são as expressões mais perfeitas que pensamos ou sentimos.”

A Estrutura da oração se configura como um dos assuntos fundamentais do estudo de uma língua pelos conceitos que abrangem grande parte da gramática.

É importante salientar que este tema possui inúmeras pesquisas, tanto de gramáticos quanto de lingüistas, daí a crescente necessidade de conhecermos algumas posições que firmaram como divisor de água.

Além de conceituarmos, há necessidade de contrapor o pensamento daqueles que mudaram os rumos de nosso ensino, bem como dos que partiram dessas fontes de pesquisa.

Podemos dizer que a oração é a menor unidade do discurso e que o seu sentido se caracteriza pela entoação.

De acordo com o professor Evanildo Bechara, a oração pode ser constituída por uma seqüência de vocábulos ou por um só vocábulo. Como exemplo, podemos citar: Dormimos ou Fogo. No último exemplo, Bechara difere de outros gramáticos. Para ele, é uma oração de estrutura menor, mas não menos importante. “O lingüista francês Brünot chama de “indicações” esse tipo de oração. Para Celso Cunha e Rocha Lima, é apenas uma frase. Segundo Rocha Lima oração é a frase que se biparte em sujeito e predicado. Ainda segundo este gramático em Quero que você leia este livro há duas orações, mas apenas uma frase. Podemos mencionar os seguintes tipos de oração:

a) declarativa – com entoação assertiva. As aulas começaram;

b) interrogativa – com entoação interrogativa. Quem tocou a campainha?

c) imperativa – com entoação de ordem . Seja você mesmo!

d) exclamativa – com entoação exclamativa. Que surpresa!

Citemos agora os termos essenciais da oração: sujeito e predicado que também são conhecidos como termos oracionais. Segundo um comentário feito pela professora Nícia de Andrade Verdini Clare, há uma certa incoerência em relação ao sujeito ser um termo essencial, pois há oração sem sujeito. Outros gramáticos confirmam essa tese.

Em relação ao sujeito, sabemos que há definições que não são válidas na prática. Vejamos: Celso Cunha em seu livro Gramática da língua portuguesa declara: “O sujeito é o termo sobre o qual se faz uma declaração”. Logo adiante, encontramos a seguinte afirmação:

“Algumas vezes o verbo não se refere a uma pessoa determinada, ou por se desconhecer quem executa a ação, ou por não haver interesse no seu conhecimento. Dizemos então que o sujeito é indeterminado.”

Nesta afirmação, podemos ver uma definição incompleta, pois se refere ao sujeito como o termo que pratica a ação, o que nem sempre ocorre. No caso da voz passiva, o sujeito desempenha a função de paciente da voz verbal.

O mais importante é identificar o sujeito de uma oração; depois é preciso aprender a definição de sujeito.

No livro Para uma nova gramática do português, de Mário Perini, uma definição de sujeito que parece ser mais adequada a todos os casos:

Sujeito é o termo com o qual o verbo concorda.”

Após as definições citadas, podemos comentar sobre o núcleo do sujeito, que é a palavra mais importante de todas as que compõem o sujeito. Em As crianças calmas foram premiadas o núcleo é uma palavra de natureza substantiva: substantivo, pronome substantivo ou qualquer termo substantivado.

De acordo com a gramática tradicional comentaremos a classificação do sujeito. O sujeito pode ser simples quando só tem um núcleo. Composto quando apresenta mais de um núcleo. Nem sempre é necessário explicitar o sujeito de uma oração com isso, às vezes ele é indicado pela desinência verbal.

Segundo Bechara, modernamente diz-se que não há elipse nestes casos em que a referência ao sujeito é dada pela desinência verbal. Bechara só considera a existência de elipse em casos em que o sujeito apareceu em oração anterior. No exemplo “A empregada que D. Alice me arranjou traz-me o café e as refeições na cama é (discreta e alheia), ” a empregada é um sujeito oculto por elipse. Mattoso Câmara tem a mesma posição. Já Adriano da Gama Kury considera elipse nos dois casos.

O sujeito também pode ser indeterminado e conforme Bechara observa, o sujeito indeterminado não quer dizer que não o conhecemos, mas sim, que não nos interessa torná-lo patente. Podemos citar os seguintes casos:

1º caso: Verbo na 3ª pessoa do plural sem referência a pessoas determinadas.

2º caso: Verbo não transitivo direto na 3ª pessoa singular + pronome se (símbolo de indeterminação do sujeito)

Há também oração sem sujeito ou sujeito inexistente. Os casos principais são: 1 – com verbos impessoais que indicam fenômenos da natureza; 2 – verbo haver no sentido de existência; 3 – verbo haver no sentido de tempo; 4 – verbos ser, estar, fazer e ir com idéia de tempo.

O professor Evanildo Bechara nos textos dos escritores clássicos, referindo-se à sintaxe popular, diz que há casos de emprego do pronome ele junto a verbos impessoais, tal como o francês utiliza o il. Por exemplo: Que ele há nesse lugar um hiato isso não direi que não (Rui Barbosa).

É interessante observarmos também que, enquanto Evanildo Bechara considera incorreto o uso de ter por haver, o mestre Sílvio Elia encara como brasileirismo, colocando como ressalva o emprego literário de ter por haver, aproximando a língua escrita do falar coloquial.

Em linguagem poética, os verbos que indicam fenômenos da natureza podem aparecer pessoalmente. No exemplo: Choveram bênçãos dos céus. No dia seguinte, amanheci de cama.

Ao estudarmos o predicado começamos desde já, a questionar a sua definição que é tudo aquilo que se declara do sujeito. Sabemos que nem sempre isso acontece, pois às vezes a declaração contida no predicado não se refere a nenhum sujeito.

Para classificar um predicado precisamos conhecer a predicação verbal. E a classificação do verbo depende da situação em que se acha empregado na oração. Só pelo contexto podemos saber se um verbo é transitivo ou de ligação.

O predicado pode ser verbal quando o seu núcleo é um verbo transitivo ou intransitivo e nominal quando o seu núcleo é um nome. Ocorre predicado nominal com verbo de ligação. Já o predicado verbo-nominal possui dois núcleos: um verbo e um nome. Nesse caso pode haver um predicativo do sujeito ou do objeto. O predicativo geralmente é um substantivo, adjetivo ou pronome. Mas o substantivo ou pronome podem vir preposicionados. De acordo com a NGB os verbos de ligação indicam: estado permanente, estado passageiro, continuidade de estado, mudança de estado ou aparência. O predicativo pode vir repetido por ênfase.

No estudo dos termos integrantes da oração há verbos que precisam de uma expressão para completar o seu sentido. A expressão que completa o sentido das palavras que não se bastam a si mesma se chama complemento.

O complemento do verbo transitivo direto é o objeto direto. O objeto direto pode ser representado pelos pronomes oblíquos o, a, os, as. Segundo Rocha Lima o objeto direto pode ser preposicionado, pleonástico, objeto direto interno, objeto direto reflexivo e objeto direto recíproco.

No caso do objeto direto preposicionado, a preposição é mero recurso estilístico e sua explicação está em pôr em evidência à pessoa quem a ação se dirige e a pessoa que recebe a ação expressa pelo verbo. Por exemplo: Amo a meus pais.

Já Antenor Nascentes nos chama a atenção para a preposição que, depois de certos verbos, mas serve para lhes acrescentar um novo matiz de significação do que reger o complemento desses mesmos verbos. Por exemplo, arrancar da espada (o posvérbio acentua a idéia do uso do objeto).

Dizemos que o objeto indireto é o complemento do verbo transitivo indireto, que exige uma preposição necessária, que não pode ser retirada sem prejuízo do sentido da frase.

Os pronomes oblíquos me, te, lhe, nos, vos pode representar um objeto direto se não vem precedido de preposição. Por exemplo: Você me disse que viria. O pronome lhe quase sempre tem a função de objeto indireto.

A NGB inclui, entre os objetos indiretos, os complementos partitivos e os complementos de relação. Dessa forma, uma oração pode ter dois objetos indiretos.

Bechara nos mostra casos que há na NGB ao considerarmos como adjuntos adverbiais os complementos circunstanciais de verbos transitivos adverbiais. Por exemplo: Irei à cidade.

A maioria dos autores concorda que o verdadeiro objeto indireto é introduzido pelas preposições a e para, podendo ser substituído por lhe.

O predicativo do objeto também faz parte dos termos essenciais da oração segundo Celso Cunha. É próprio do predicado verbo-nominal. Por exemplo. Chamaram-no de tolo. Quero-o para padrinho.

Um outro termo que faz parte dos sintagmas suboracionais é o complemento nominal que é um termo que gera uma certa confusão com objeto indireto e às vezes com o adjunto adnominal. Porém, não podemos esquecer que o complemento nominal é o termo que integra a significação transitiva de um nome. Há outras denominações dadas ao termo: objeto nominal, adjunto restritivo, complemento restritivo e complemento terminativo.

Sabemos que o complemento nominal vem sempre regido de preposição e que o seu núcleo é sempre um termo em função substantiva.

Não há necessidade de confusão entre o complemento nominal e o objeto indireto, pois há uma distinção marcante entre os dois termos. Podemos observar por meio das seguintes frases:

Tenho necessidade de apoio.

CN

Necessito de apoio.

OI

Outro termo essencial é o agente da passiva. É o termo da oração que denota quem praticou a ação sobre o sujeito paciente. O agente da passiva é iniciado pelas preposições por e de. No português antigo, a voz passiva pronominal tinha agente da passiva.Segundo as gramáticas, o adjunto adnominal é o termo de valor adjetivo que serve para explicar ou delimitar o significado de um substantivo, qualquer que seja a função deste. É representado por artigo, pronome adjetivo, numeral, adjetivo, locução adjetiva e oração adjetiva. Normalmente, é confundido com o complemento nominal. Porém, ao ler a oração é preciso observar o papel de agente ou paciente. A um só núcleo de um substantivo podem subordinar-se vários adjuntos adnominais. Por exemplo: Meu bom amigo de infância.

Às vezes o adjunto adnominal se liga ao substantivo por meio da preposição de principalmente se o adjunto for pobre, triste, infeliz e outros.

Em geral não se separa o núcleo de seu adjunto adnominal por vírgula. Mas, quando o núcleo é designação de obra literária seguida do nome do autor, a vírgula ajuda o entendimento. Por exemplo: “... e a Ilha Maldita, de Bernardo Guimarães...”

Um outro termo discutível é o adjunto adverbial que modifica o verbo, imprimindo-lhe uma circunstância, ou intensifica o sentido do verbo, de um adjetivo ou de outro advérbio. É difícil enumerarmos todos os tipos de adjuntos adverbiais. Só o contexto pode nos dar a sua classificação.

Pode ocorrer, ainda, o inverso: diferentes preposições encabeçam adjunto adverbial de um mesmo tipo. Tal ocorre com o adjunto adverbial de lugar. Alguns autores o denominam assim simplesmente; outros, porém, preferem subordiná-lo, chamando-o de adjunto adverbial de lugar onde, donde, para onde, aonde, por onde, conforme a idéia que exprimam, o que, na prática, se reconhece pela preposição. A diversidade na apresentação dos tipos de adjuntos adverbiais pode ser notada nas nossas gramáticas. Se tomarmos quatro autores principais, veremos não serem coincidentes os tipos de adjuntos adverbiais apresentados.

Por exemplo: Evanildo Bechara, no livro Lições de português pela análise sintática – dezessete tipos de adjunto adverbial;

Celso Cunha no livro Gramática do português contemporâneo – quatorze tipos de advérbios;

Rocha Lima na Gramática normativa da língua portuguesa – vinte tipos de adjunto.

Walmírio Macedo, Análise Sintática em Nova Dimensão – doze tipos.

Claudio Cezar Henriques, Sintaxe portuguesa para a linguagem culta contemporânea-32 tipos

Vemos a necessidade do professor ser bastante prudente ao ensinar adjunto adverbial, procurando apresentar os tipos mais comuns, discutindo as subdivisões que aparecem no texto estimulando a fértil capacidade imaginativa a criar todo e qualquer tipo de adjunto adverbial valorizando sempre o sentido.

Por ser complexo, vejamos o exemplo Não quero mais sair, onde o uso do adjunto adverbial de tempo é contestado por Mário Barreto que vê no sentido de cessação, imitação do francês. Segundo Sousa da Silveira, este falar é românico e está correto.

Verificamos que os adjuntos adverbiais comuns nas gramáticas citadas acima são: causa, companhia, lugar, dúvida, fim, modo, negação, tempo e instrumento.

Finalmente, chegamos ao aposto, que é a palavra ou expressão que explica, desenvolve, esclarece ou resume outro termo da oração, de valor substantivo.

O aposto pode ser explicativo ou identificativo; enumerativo; comparativo; recapitulativo; resumitivo e especificativo.

De acordo com o professor Evanildo Bechara às vezes os pronomes demonstrativos servem de aposto, quando há o interesse de reforçar o sujeito.

O professor Bechara não considera o aposto comparativo, porém considera o aposto distributivo. Há também o aposto circunstancial, que designa uma circunstância qualquer referente ao nome. No caso de certos apostos circunstanciais há autores que preferem completar o predicativo com o verbo de ligação e o conectivo e analisar como uma oração subordinada adverbial. É o caso de Mário Barreto.

Nesse aspecto ainda para Celso Cunha, não há aposto e sim predicativo. Por exemplo: Rico, desdenhava dos humildes.

No caso do aposto especificativo, há autores que classificam a expressão iniciada por de como adjunto adnominal; outros classificam o de como palavra de realce e o restante como aposto. Citemos: A cidade de Lisboa.

Segundo Bechara, o aposto também pode referir-se a uma oração inteira: Depois da prova, José estava radiante, sinal de seu sucesso.

Aqui iremos comentar o vocativo, que é um termo independente, porque pode referir-se a um termo da oração, sem que a ele esteja subordinado. É uma expressão de natureza exclamativa, através da qual chamamos ou pomos em evidência a pessoa a quem nos dirigimos. Por exemplo: José, venha cá!

Na escrita, o vocativo normalmente vem isolado por vírgula ou seguido de ponto de exclamação.

Conforme foi desenvolvido, o assunto Estrutura da oração é extenso e intenso.Não podemos também deixar de lado a contribuição da Lingüística, ciência que estuda a linguagem e que bem nos evidencia a mescla de categorias com que a gramática trabalha nas definições, ora de natureza gramatical, ora semântica e com predomínio do registro da língua literária, desconsiderando muitas vezes, outros usos da língua. Esta crítica também não deve ser tão arbitrária de nossa parte, pois sabemos o quanto uma se vale e se alimenta da outra com fins idênticos: o conhecimento de nossa língua e seus usos.

Muitas vezes esquecemos a máxima do professor Evanildo Bechara, que sintetiza o objetivo tanto do estudioso quanto do usuário da língua: “Ser poliglota de sua própria língua.”

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AZEREDO, José Carlos de. Iniciação à sintaxe do português. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.

BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. Rio de janeiro: Lucerna, 1999.

CARONE, Flávia de Barros. Morfossintaxe. São Paulo: Ática, 1995.

HENRIQUES, Cláudio Cezar. Sintaxe portuguesa para a linguagem contemporânea. Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1997.

MACEDO, Walmírio. Elementos para uma estrutura da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Presença, 1987.

RIBEIRO, Manoel Pinto. Nova gramática aplicada da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Metáfora. 1998.

 

 

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