Produção e disputas de sentido
nos discursos do PT

João Benvindo de Moura (UFPI)

 

INTRODUÇÃO

O discurso ideológico dos partidos políticos, mesmo já tendo sido objeto de estudo de diversificadas áreas do conhecimento, particularmente na área das ciências sociais, é sempre um tema atual e de vultosa riqueza, uma vez que comporta manifestações diversas inerentes à atividade humana, à produtividade da língua, à organização da sociedade, às estratégias de persuasão, refletindo o talento na captação e expressão das idéias, das contradições, das ambigüidades e instabilidades próprias da humanidade em todos os tempos.

Neste trabalho analisamos os discursos políticos do PT – Partido dos Trabalhadores, através de documentos oficiais do partido. A escolha de trabalhar com os discursos do PT deve-se ao fato de os mesmos terem se tornado relevantes e polêmicos na política nacional das últimas três décadas.

 

A Análise de discursos

Não se pode dizer que os discursos se confundem com a fala. Os discursos são frutos do reconhecimento de que a linguagem tem uma dualidade constitutiva (língua e fala) e que a compreensão do fenômeno da linguagem não deve ser buscada apenas na língua, sistema ideologicamente neutro. Em outras palavras, ao mesmo tempo em que a linguagem é uma entidade formal, constituindo um sistema, é também atravessada por entradas subjetivas e sociais. Os discursos são, pois, lugares de investimentos sociais, históricos, ideológicos, psíquicos, por meio de sujeitos interagindo em situações concretas.

Segundo Pinto (1999), as análises de discurso que se praticam hoje se nutrem de duas tradições: a análise do discurso francesa, de um lado, e a pragmática, a etnometodologia e outras propostas psicossociológicas de abordagem de textos anglo-americanas, de outro, que nem sempre se entendem muito bem, por causa de suas diferenças epistemológicas. As duas correntes, ao se nomearem preferem empregar discurso como um termo encapsulador, no singular, embora se separem radicalmente quanto à maneira como definem o conceito. O autor discorda desse rótulo que não estaria contemplando a pluralidade das idéias e propõe a utilização do termo no plural, prática que também adotaremos neste trabalho. “Prefiro usar discursos no plural, não só para dar conta da idéia da sua multiplicidade, como também para fugir das grandes categorias abstratas à maneira do estruturalismo, onde o conceito originariamente se forjou”. (Pinto, 1999: 16).

Os discursos, em última análise, são uma "prática" (prática regulamentada dando conta de um certo número de enunciados), entendendo-a como a existência objetiva e material de certas regras às quais o sujeito tem de obedecer quando participa dos "discursos". As normas dessa prática são "regras" ou "regularidades".

 

A Teoria dos Discursos Sociais

A teoria dos discursos sociais trabalha com os processos de constituição do discurso, que pode ser definido como o lugar do trabalho social de produção do sentido. O discurso não é um objeto, não se limita às possibilidades de articulação de conceitos isolados da língua, não é o reflexo de uma situação. Antes, configura-se como uma prática: a prática discursiva.

Observando as afirmações acima, pode-se perceber que os discursos dependem das redes de memória e das condições históricas de produção, mas “cada ato discursivo é único e desestabiliza em certa medida tais coerções, entre outras razões, pela ação que nele exerce o sujeito” (Araújo, 2000: 122). Daí a Semiologia ter, como sua outra vertente, uma teoria do sujeito, mais precisamente a teoria da enunciação, formulada originalmente por Benveniste.

Passemos, portanto, aos postulados da Teoria dos Discursos Sociais.


 

A heterogeneidade enunciativa

A natureza do sujeito, cuja unicidade e autonomia discursiva a Semiologia põe em causa, constitui a questão central deste postulado. Contra a idéia ainda dominante de que a pessoa que fala é totalmente responsável pelas representações do seu discurso, a Semiologia propõe uma outra, a de que o discurso é composto por diversas vozes, cujos consciência e controle escapam em parte ao locutor e que se manifestam em cada ato enunciativo. A essa característica discursiva Bakhtin denominou polifonia: cada fala, cada enunciação, é palco de expressão de uma multiplicidade de vozes, algumas arregimentadas intencionalmente pelo locutor e outras das quais ele não se dá conta.

Segundo Brait (1999), o sujeito de Bakhtin é um sujeito histórico, social, ideológico, mas também corpo. É um sujeito construído na linguagem, construído pelo “outro”. Em Bakhtin, o sujeito tem um projeto de fala que não depende só de sua intenção, mas depende do “outro” (primeiro é o “outro” com quem fala; depois o “outro”, ideológico porque é tecido por outros discursos do contexto) e, ao mesmo tempo, o sujeito é corpo (são as outras vozes que o constituem).

 

A semiose infinita

A essência do postulado da semiose infinita reside exatamente nas considerações de Foucault sobre o enunciado. Segundo Peirce (1977), a semiosis consiste numa rede infinita de remissivas de representações na mente dos indivíduos: cada significante remete para outro(s) singificante(s), não se chegando a um sentido estável, a não ser muito provisoriamente. Essa concepção de como se dá a produção de sentido recusa não só aquelas outras, que supõem o significado imanente aos objetos (inclusive os lingüísticos), mas também as que estabelecem um sujeito transcendental, causa, explicação e sentido último de todos os fenômenos sociais (por exemplo, a História, o Inconsciente, a Estrutura, o Sistema, Deus, a Luta de Classes, etc.).


 

A economia política do significante

A Teoria dos Discursos Sociais, enquanto disciplina plural e receptiva, acolhendo ao longo de sua constituição aportes de diversas ciências e teorias e retrabalhando suas premissas sob a perspectiva da produção do sentido, incorporou o ensinamento da Antropologia de que os fenômenos culturais funcionam sob uma lógica de mercado – a lógica da produção, circulação e consumo dos seus produtos.

Transportando esta noção para o plano dos discursos – o domínio simbólico -, afirma que o espaço da comunicação constitui um mercado simbólico, que opera segundo as regras de qualquer outro mercado: é só através do processo de produção, circulação e consumo que os objetos adquirem a condição de significante. É esta premissa e seus desdobramentos que formam o postulado da economia política do significante e é também uma tese central na proposta teórico-metodológica de Verón.

 

A trajetória do PT

O Partido dos Trabalhadores surgiu no final da década de 70, concretizando uma das idéias mais radicais que emergiam no bojo do processo de redemocratização, qual seja, a de criação de um partido político a partir das lideranças vinculadas aos movimentos populares, com o objetivo de representar efetivamente os interesses da classe trabalhadora na arena política.

Do ponto de vista das relações do PT com o Estado brasileiro, podemos identificar três grandes períodos na história do PT: de 1979 a 1989 quando predomina um padrão anti-sistêmico de proposições em relação ao Estado brasileiro; de 1989 a 2002 quando o PT, já com uma importante inserção institucional, se vê tensionado entre a acomodação ao Estado e as mudanças contidas no chamado modo petista de governar, em particular o orçamento participativo; de 2002 em diante, quando as dimensões de adaptação ao Estado e ao sistema político tornaram-se amplamente predominantes (Guimarães, 2004: 111). Esta periodização sumária serve de roteiro para acompanhar o impasse da elaboração programática do PT em relação ao Estado brasileiro.


 

O PT e a construção
de sua identidade partidária

A identidade anti-sistêmica

De um conjunto formado anteriormente por 20 documentos foram selecionados quatro para análise textual: O Manifesto de Fundação (1980); O Socialismo Petista (1990); Um outro Brasil é possível (2001) e Conjuntura, tática e política de alianças (2006). O critério de escolha foi a representatividade de cada documento dentro de cada um dos ciclos da história do partido apontados no capítulo anterior. Também prevalece a intenção de permitir uma comparação dentro da mesma instância institucional.

O manifesto do PT foi aprovado na reunião nacional de fundação do partido em 10.02.80. São apenas três laudas com uma pequena introdução e três itens denominados: Nascendo das lutas sociais; Por um partido de massas e Pela participação política dos trabalhadores. Um texto por demais compacto se comparado, por exemplo, com o Manifesto do Partido Comunista alemão escrito em 1848 por Marx e Engels que tem aproximadamente 30 laudas.

Os enunciados do Manifesto do PT dialogam constantemente com outros textos como o próprio Manifesto do Partido Comunista alemão, discursos de outros partidos de esquerda do Brasil, como PCB, PSB, além de discursos dos movimentos sociais aqui existentes. Foucault (1996: 110) afirma que “um enunciado tem sempre margens povoadas de outros enunciados”

Na Introdução do manifesto, o emissor deixa claro que ele é o sujeito da enunciação, apresenta-se como responsável pelo texto que se segue, ao mesmo tempo em que afirma seu papel indispensável no cenário que ele mesmo construiu: falta democracia no Brasil e os trabalhadores são explorados. O PT é uma resposta a tudo isso. O efeito de veracidade desse contexto é buscado através de estratégias delocutivas, como a indeterminação gramatical e as formas passivas de ação:

(sd 1)

É conhecido o fato de que a democracia é uma conquista...; Nos últimos tempos têm surgido...; Tem sido despertado um enorme interesse da classe trabalhadora... (PT-REC, 1998).

Subitamente, o emissor entra em cena, assumindo o papel de quem pode ajudar a resolver o problema identificado: vai ser criado um partido. Este, por um momento, assume vida própria e protagoniza a mudança de formas gramaticais:

(sd 2)

O PT pretende ser uma real expressão política...; Por isso apresenta... (PT-REC, 1998).

Finalizando, o emissor reassume seu lugar:

(sd 3)

... acreditamos ser possível... (PT-REC, 1998).

Ao longo do texto, o sujeito da enunciação continua presente de modo inequívoco. Emprega a 1ª pessoa do plural, que se refere sempre aos emissores e nunca ao conjunto identificado emissor-receptor.

(sd 4)

Somos um Partido dos Trabalhadores, não um partido para iludir os trabalhadores. (PT-REC, 1998).

Na intenção de arregimentar outras vozes para respaldar seu discurso, o emissor lança mão de expressões populares que funcionam como enunciadores ajudando a respaldar a produção de sentido desejada. Segundo Charaudeau (2006) a legitimidade social é importante porque é a que dá a toda instância de palavra uma autoridade de dizer, desde que reconhecida por outros sujeitos.

(sd 5)

A grande maioria de nossa população trabalhadora, das cidades e dos campos, tem sido sempre relegada à condição de ‘brasileiros de segunda classe’. (PT-REC, 1998)

 

A identidade socialista

O documento “O socialismo petista” publicado durante o 7o Encontro Nacional contém 7 páginas e 13 subitens. No primeiro parágrafo expõe seu objetivo de reafirmar a postura do partido sobre o assunto, sintetizar o acúmulo partidário nesse sentido, identificar seus desafios histórico-doutrinários e propor um amplo debate ao PT e à sociedade brasileira.

O sujeito da enunciação aparece na maior parte do texto na 3a pessoa do singular, alternando-se, porém, em alguns trechos, para a 1a pessoa do plural numa tentativa de aproximar-se cada vez mais do destinatário. Segundo Woodward (In: Silva, 2000), os discursos e os sistemas de representação constróem os lugares a partir dos quais os indivíduos podem se posicionar e a partir dos quais podem falar.

(sd 6)

O PT já nasceu com propósitos radicalmente democráticos. Surgimos combatendo a ditadura militar e a opressão burguesa... (PT-REC, 1998: 429).

Tenta legitimar-se como fiel escudeiro dos valores éticos brasileiros através de sua trajetória existencial de lutas em defesa da sociedade e da democracia. Isto deverá credenciá-lo para falar com autoridade sobre o tipo de socialismo que defende.

(sd 7)

Crescemos denunciando a transição conservadora e construindo as bases da soberania popular. Em dez anos de existência, o PT sempre esteve na vanguarda das lutas pela democratização da sociedade brasileira. (PT-REC, 1998: 429).

O sujeito explicita a sua visão de democracia que seria distinta da compreensão de democracia das elites. Fica patente a necessidade de auto afirmar-se pela diferença.

(sd 8)

Aprendemos na própria carne que a burguesia não tem verdadeiro compromisso histórico com a democracia. A relação das elites dominantes com a democracia é puramente tática, elas se socorrem da via democrática, quando, pragmaticamente, lhes convém. (PT-REC, 1998: 429).

Outro argumento para legitimar o discurso de democracia interna é o pluralismo ideológico-cultural. O sujeito se auto-intitula como “uma síntese de culturas libertárias, unidade na diversidade” ao mesmo tempo em que assegura não privilegiar nenhuma dessas matizes isoladamente.

(sd 9)

Confluíram para a criação do PT, diferentes correntes de pensamento: o cristianismo social, marxismos vários, socialismos não-marxistas, democratismos radicais, doutrinas laicas de revolução comportamental, etc. O ideário do partido não expressa, unilateralmente nenhum desses caudais. O PT não possui filosofia oficial. (PT-REC, 1998: 430).

Os discursos veementes na defesa do socialismo democrático são construídos a partir de frases de efeito e comparações. O sujeito não admite um meio termo em relação ao modelo de socialismo defendido pelo partido cuja ênfase à democracia é primordial.

(sd 10)

Denunciamos com idêntica indignação o assassinato premeditado de centenas de trabalhadores rurais no Brasil e os crimes contra a humanidade cometidos em Bucareste ou na Praça da Paz Celestial. O socialismo, para o PT, ou será radicalmente democrático ou não será socialismo. (PT-REC, 1998: 432).

O sujeito reproduz os questionamentos supostamente feitos pela sociedade brasileira em relação ao socialismo do PT. O efeito de sentido pretendido é a interação, o conhecimento de causa, a sintonia com as bases. Não se trata de um partido de gabinetes. A resposta a tais questões não é algo privativo ao partido. Não se trata de um passe de mágica nem o sujeito imagina-se “salvador da pátria”. Responder a tais indagações “é uma tarefa que não depende só do PT, mas deve engajar todas as energias libertárias disponíveis em nossa sociedade”. (PT-REC, 1998: 433).

(sd 11)

Mas qual socialismo? Qual sociedade, por qual Estado lutamos com tamanho empenho para construir? Como deverá ser organizada a sua estrutura produtiva e com quais instituições políticas contará? Como serão conjurados, no plano da política prática, os fantasmas ardilosos do autoritarismo? (PT-REC, 1998: 433).

Por fim, no documento em análise, a expressão “controle da propriedade pelo Estado” registrada nos documentos do 4o Encontro Nacional, é substituída por “propriedade social dos meios de produção” seguida de uma explicação categórica: não é o Estado que vai geri-la. Há uma tentativa explícita de distanciar-se do modelo do Leste Europeu como forma de desvincular-se daquilo que está sendo abolido e criticado pelo mundo todo. O sujeito esforça-se em construir uma identidade moderna, sem ligações com os erros cometidos por partidos e movimentos diversos em outras partes do mundo.

(sd 12)

O socialismo que almejamos, deverá organizar-se a partir da propriedade social dos meios de produção. Propriedade social que não se confunda com propriedade estatal, gerida pelas formas (individual, cooperativa, estatal, etc.) que a própria sociedade, democraticamente, decidir. Democracia econômica que supere tanto a lógica perversa do mercado capitalista quanto o intolerável planejamento autocrático estatal de tantas economias ditas socialistas. (PT-REC, 1998: 434-435).

 

A “crise de identidade”

Considerando as idéias de Verón (1980) expostas do item 1 sobre o poder nos discursos, este parece ser o mais importante discurso já produzido pelo PT, uma vez que, serviu de base para o Programa de Governo elaborado em 2002, norteou a campanha publicitária do partido, permeou os discursos de todos os candidatos da agremiação e, depois de três tentativas frustradas, levou Lula à presidência da república. É bem verdade que outros fatores conjunturais também colaboraram decisivamente para tal.

Podemos dizer que o processo de circulação dos sentidos sociais contidos nesse documento alcançou os objetivos para os quais foi produzido, ou seja, foi consumido pela sociedade brasileira a partir de um processo seletivo onde a mesma pôde estabelecer uma comparação com outros discursos igualmente ofertados no mesmo período. Percebe-se, portanto, que a noção de poder de um discurso não pode designar outra coisa senão os efeitos desse discurso no interior de um tecido determinado de relações sociais.

O documento caracteriza-se em suas primeiras linhas por um ataque frontal à política de FHC. Os números apresentados apontam um fracasso em todos os setores. Percebendo na candidatura do PSDB o seu principal opositor o partido aponta suas baterias para o governo FHC. Estrategicamente o discurso não faz nenhuma referência aos governos dos ex-presidentes José Sarney e Itamar Franco, extremamente criticados pelo PT no passado. As responsabilidades por todas as mazelas sociais do país são imputadas restritivamente ao governo FHC: “O que se desfez ou se deixou de fazer em oito anos não será compensado em 8 dias” (Carta ao Povo Brasileiro, Lula, 22.06.02).

(sd 13)

Depois de quase sete anos, FHC e seu condomínio partidário conservador legam ao país a estagnação e desnacionalização da economia, aumento da dependência externa, degradação da infra-estrutura, aumento da desigualdade social e elevado nível de desemprego. (PT, 2001: 5).

Auto intitulando-se como a maior reserva moral e política brasileira, o PT critica a relação viciada entre o executivo e o legislativo no governo FHC onde o primeiro negocia o apoio do segundo em troca de benesses, conforme se verifica no trecho abaixo.

(sd 14)

O governo FHC faliu também moralmente. As denúncias de corrupção foram se acumulando e, para contê-las, o governo transformou a relação com o Legislativo num balcão de negócios. (PT, 2001: 2).

O documento “Conjuntura, tática e política de alianças” contém 15 páginas, 134 parágrafos numerados, uma introdução e 7 subitens intitulados: A conjuntura internacional, conjuntura nacional, as eleições de 2004, as finanças de um partido de trabalhadores, a corrupção nos governos tucanos, elementos da tática e política de alianças e, por último, a oposição tenta retomar o cerco.

No texto interno, tenta reforçar a “estratégia desviante” de falar de outro lugar, pondo em cena os discursos militantes de oposição. Apesar de ter o Partido Liberal como aliado, representado, inclusive na pessoa do vice-presidente da república, há uma crítica constante ao neoliberalismo.

(sd 15)

Temos dois grandes desafios: a) superar, através de reformas estruturais, a tragédia social produzida pela crise do modelo nacional-desenvolvimentista e pela ambição do receituário neoliberal; b) superar a hegemonia neoliberal... (PT, 2006: 2-3).

A 1a pessoa do plural é usada em quase todo o documento, como estratégia de identificação e homogeneização dos atores sociais envolvidos, partido e governo.

(sd 16)

Defendemos a reeleição de Lula pelo que fizemos, pelo que ainda precisamos fazer, pelo que isto significará para os povos da América Latina e do mundo. (PT, 2006: 2).

O sujeito reafirma sua identidade socialista, porém, confessa que seus discursos e ações não mais representam um pensamento único, mas são o produto de uma união de forças, de alianças diversas o que por vezes produz resultados que independem de sua vontade.

(sd 17)

Enquanto partido socialista, o PT almeja que esta superação (do neoliberalismo) se dê num sentido anti-capitalista. Mas a luta contra o neoliberalismo assume múltiplas formas e assume ritmos ditados não por nossa vontade, mas sim pela correlação de forças em âmbito nacional e internacional. (PT, 2006: 3).

Os discursos tentam produzir um efeito de sentido de humildade, diferente daqueles de 2002 onde o mesmo apresentava-se como “o todo-poderoso”. Lembra que conquistou a presidência, mas não possui a hegemonia do poder o que dificulta suas ações.

(sd 18)

Basta lembrar, por exemplo, que as forças vinculadas ao neoliberalismo receberam quase 40% dos votos nas eleições presidenciais, elegendo a maioria dos governadores, senadores, deputados e prefeitos, além de manter enorme poder econômico e influência sobre os meios de comunicação. (PT, 2006: 5).

 

Conclusão

Os documentos institucionais do PT analisados representam, no âmbito de sua construção, a materialização das ideologias dos seus construtores, práticas, técnicas, teorias que povoam a mente de intelectuais diversos e se manifestam em suas produções. Tais documentos foram redigidos pela corrente política que detém o poder no partido em cada momento. Isto evidencia o partido como sujeito clivado, como função social, lugar que é ocupado por posições diferentes ou divergentes. Máscaras que se apresentam como representação do PT. Mais do que isto, formações ideológicas que buscam materializar seus objetivos através de uma formação discursiva que disputa sentidos e validade no mercado simbólico.


 

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