A INFLUÊNCIA DA LINGUAGEM DOS BATE-PAPOS
DA INTERNET NOS TEXTOS
ARGUMENTATIVO-DISSERTATIVOS ESCOLARES

Kelly Christine Lisboa Diniz (UFES)

 

Na sociedade atual, tanto a oralidade quanto a escrita são imprescindíveis. Trata-se, pois, de não confundir seus papéis e seus contextos de uso, e de não discriminar seus usuários. (Marcuschi)

 

Com o advento da tecnologia digital a utilização da escrita sincrônica e pouco monitorada está cada vez mais generalizada (Marcuschi, 2004: 15, 29). As muitas atividades humanas e a capacidade de variação na comunicação fazem com que o posicionamento de profissionais da linguagem se dê de forma urgente.

Nunca antes se escreveu tanto como se escreve agora, considerando que a tecnologia digital é na sua maior parte escrita e acrescentando a isso o grande número de usuários que segundo estimativas ultrapassou os 318 milhões na rede em todo mundo (Othero, 2002: 12), sendo que no Brasil, segundo o Ibope/ NetRatings, até março de 2006, o número chegou a 13 milhões. Esse número só aumenta a cada dia, pois por meio dessa tecnologia houve uma rapidez nos serviços, além de um encurtamento das distâncias. No entanto, os conceitos tradicionais de escrita neste suporte, Internet, imprimem e comandam usos próprios, usos que vêm sendo discutidos atualmente, sobre o quanto repercutirão na educação futura.

As mudanças históricas são fato e não podemos dissociá-las das mudanças que se efetuam, igualmente, nos gêneros do discurso (Bakhtin, 2000: 285). Assim, não nos cabe simplesmente ignorar os textos que estão sendo produzidos em massa considerando que o uso da língua deve vir antes de suas regras (Marcuschi, 2001: 9), ainda que a produção e a circulação de textos na Internet tragam, certamente, alguns desafios para a educação formal. Por esta razão, é necessário, primeiramente, que os educadores estejam atentos às transmutações dos gêneros textuais e como trabalhar com esses gêneros emergentes.

Os ambientes da Internet são muitos e eles abrigam e condicionam os gêneros produzidos nesse suporte; os bate-papos, por sua vez, estão presentes no ambiente “chat sincrônico” que são salas de bate-papos virtuais entre várias pessoas simultaneamente ou em ambientes reservados. Nesse ambiente, há uma heterogeneidade de formatos e um contato entre culturas variadas, além de vários recursos multimídia que auxiliam a interação.

Uma das formas mais utilizadas de bate-papos virtuais atualmente são as mensagens instantâneas, ou os programas de troca de mensagens.

Para representar e/ ou simular as propriedades da fala face a face o ambiente virtual possui muitos elementos visuais como: caixa de fotografia ou de imagem; som, como o áudio, música e linguagem através de uma integração de recursos semiológicos conhecidos como emoticons (carinhas que transmitem estados de espírito) e os winks que fazem o papel da representação do estado de espírito da pessoa, bem como algumas atitudes que possivelmente tomaria o usuário em uma interação face a face.

Devido à rapidez da escrita para a comunicação e à simultaneidade nas digitações, as mensagens possuem um texto informal próprio e de fraca monitoração da linguagem. É também comum que os usuários deste programa se conheçam e assim se estabeleça uma comunicação mais pessoal e livre de formalidade.

Diante desse quadro, é urgente o tratamento dos gêneros textuais nas escolas como apelo à busca de atenção conciliada com a base de interesse desse aluno também tão emergente quanto à tecnologia digital.

Os profissionais da educação, sobretudo os que trabalham com a língua, a linguagem e os textos, assim como também os profissionais de todos os âmbitos que necessitam das ferramentas que a norma culta escrita oferece, devem rever suas posturas ante o advento de uma mudança, que deixou de ser simplesmente tecnológica, para ser, ao mesmo tempo, social, o uso da Internet como principal meio de comunicação.

É importante ressaltar que os nossos comportamentos e nossa fala são moldados de acordo com as mudanças históricas. Em função dessas discussões sobre o uso cada vez maior dos bate-papos, que postura adotar frente a essa tendência? Este é o questionamento que pretendemos analisar ao longo deste trabalho.

O problema está em como os profissionais da educação estão concebendo a linguagem da Internet: como meio de interação ou como anomalia? A inclusão digital ainda não abrange a realidade de todos os brasileiros, pois dos 13 milhões internautas no Brasil, relatados anteriormente, 85% fazem parte da classe A.

Por sua vez, se o aluno que utiliza essa linguagem com tanta freqüência e normalidade não for induzido a discernir o necessário a fim de respeitar e manusear as diversas modalidades textuais de acordo com a ambientação, ou seja, o suporte e tipologia, o resultado esperado, certamente, será que eles usem a linguagem a qual estão mais habituados e familiarizados; no caso analisado, a linguagem da Internet, tão criticada.

Não é propósito nesse trabalho buscar uma separação entre a oralidade e a escrita, uma vez que essas se encontram, como já defendem autores contemporâneos como Marcuschi, em um continuum seja tipológico ou da realidade cognitiva e social (Marcuschi, 2001: 27), pois superam posições rígidas que as concebam como formas dicotômicas. Antes, buscou-se, por meio de investigação, apoio teórico-pragmático para trabalhar propostas que façam os profissionais de língua portuguesa, principalmente, debruçarem-se em busca de maneiras de perceberem a língua dentro do processo social e igualmente instigarem os seus alunos a perceberem as muitas facetas da linguagem e de que forma usá-las de modo que não comprometam a comunicação que terão que travar em muitos ambientes ao longo de suas vidas.

A investigação partiu de observações feitas com os gêneros emergentes e sobre o comportamento dos usuários com a escrita a partir da apropriação de tantas tecnologias ao mesmo tempo (chats, torpedo, sistema de Internet banda-larga, dentre outros).

O corpus foi composto de redações argumentativo-dissertativas de alunos de ensino médio e conversas de programas de bate-papo, principalmente o MSN messengers.

 O objetivo da análise desse corpus foi o de verificar como os alunos de ensino médio, que supomos já terem produzido gêneros textuais de várias naturezas, estão se comportando nos muitos ambientes lingüísticos que precisam transitar.

Buscamos nos textos, principalmente, avaliar se a linguagem dos programas de bate-papo estão influenciando na produção de textos que exigem uma escrita formal, como é o caso das redações argumentativas, ou se esta geração que acompanha de perto o desenvolvimento tecnológico vê a língua como um continuum, ou seja, como uma forma de interação social que, portanto, exige adequação necessária a cada ambiente em que é exigida.

 

FALA X ESCRITA

A primeira análise que merece consideração é a dicotomia estabelecida entre oralidade e escrita. A oralidade estaria ligada intimamente à fala que seria uma forma de produção textual-discursiva com fins comunicativos na modalidade oral e geralmente utilizada, segundo Bakhtin (2000: 281), nos gêneros discursivos primários, ou seja, simples, que constituem a comunicação verbal espontânea.

A escrita, por sua vez, seria uma produção textual-discursiva para fins comunicativos que exigem certas especificidades materiais e se manifesta, ainda de acordo com o conceito bakhtiniano, nos gêneros secundários, ou, complexos, isto é, no romance, nos discursos científicos, nos discursos ideológicos, enfim, aparece em uma comunicação cultural mais evoluída.

Durante muito tempo, a tradição oral estabeleceu as relações sócio-comunicativas, os povos transmitiam suas crenças e cultura por meio de ensinamentos de geração para a geração. Com a implantação da escrita na sociedade contemporânea, a escrita passa a ter um status de superioridade com relação à oralidade por mitos criados em torno da escrita de que ela seria o passaporte para a civilização e para o conhecimento, como defendiam alguns estudiosos como Olson (1997: 30). É possível, portanto, afirmar que a linguagem sempre definiu os papéis dos homens na sociedade.

Ong (1998: 11) distingue dois tipos de oralidade: a primária e a secundária, sendo que a primária é referente a uma cultura desprovida dos conhecimentos da escrita; e a secundária é tida como uma oralidade presente em uma cultura que possui, faz uso da escrita e sofre os seus efeitos. A sociedade atual vive a era da oralidade secundária que exige que o cidadão não só se comunique bem, por meio da fala, como também dependa da escrita para estar inserido no contexto social.

A informática, dentro dessa perspectiva dicotomizada das muitas áreas humanas, criou mais algumas barreiras enquanto objeto de comunicação. Pois, além da oralidade e da escrita é necessário o domínio de outros recursos, como, o manuseio do computador. Tudo que não é do nosso domínio, de certa forma, assusta, pois após a estranheza há o passo a passo do aprendizado do desconhecido e das mudanças nos hábitos da vida.

É importante notar que a linguagem tem mais implicações do que simplesmente a fala, a audição ou o ato da escrita, as interferências se dão na forma de pensar, de perceber o mundo e, inclusive, de se situar, deveras e ativamente, nele; por isso a linguagem provocou e provoca tanta ebulição ao longo da história humana.

 

INTERNET E PROGRAMAS DE BATE-PAPO

A Internet, segundo Othero (2002: 11), é uma rede mundial que interliga milhares de computadores compondo uma rede de informações gigantesca. Mas, foi só em 1990 é que ganhou uma maior adesão de centros acadêmicos e instituições de pesquisa. A partir da década de 90 a expansão foi de forma incomensurável, fazendo com que o mercado de servidores e a economia global se modificassem em pouco tempo, graças ao avanço das maneiras de oferecerem os serviços de compra e venda.

Além de todos os avanços, outra revolução que veio com o advento da Internet, foi a mudança nos meios de comunicação. Hoje, é possível que pessoas do mundo inteiro se comuniquem de forma simultânea sem precisar ter grandes custos, como o de uma ligação internacional, a linguagem escrita que passou a ser o veículo de maior aderência em meio aos usuários dessa rede. Os meios mais populares para se efetivarem essa comunicação escrita são os canais e programas de bate-papo, além das mensagens via e-mail, ou seja, um correio eletrônico que substitui o gênero carta pessoal, comercial, dentre outras.

A preocupação maior diante dessa tecnologia é a forma a qual está sendo usada a língua, uma vez que esses programas e salas de bate-papos e os e-mails se tornaram uma verdadeira rotina da vida das pessoas. Por ter um alto caráter de interatividade, a linguagem é pouco, ou nada, monitorada, tornando-se, portanto cheia de gírias e, até mesmo, neologismos. Apesar das mudanças nas formas de interação, cabe aos profissionais que lidam com as questões textuais e lingüísticas investigarem como classificar essa nova e inevitável forma de interação e, conseqüentemente, esse novo tipo de linguagem.

Bakhtin apresenta alguns elementos básicos para que se tenha um gênero do discurso e de acordo com esse posicionamento concebemos as conversas virtuais como um novo gênero do discurso.

O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais –, mas também, e sobretudo, por sua construção composicional. Estes três elementos (conteúdo temático, estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação [...] sendo isso que denominamos gêneros do discurso. (Bakhtin, 2000: 279).

Os enunciados produzidos nos programas de bate-papo constituem-se não somente a um novo gênero textual por seu conteúdo, estilo verbal e construção composicional, como também em um novo estilo da língua, conforme afirmam Pereira e Moura (2006: 81), pois envolvem interlocutores de uma determinada esfera social e humana, no caso, a maioria que adere a esses programas são adolescentes; propiciam condições específicas de comunicação tanto por seu conteúdo, isto é, temas bem diversos e que atendem ao público alvo, como também por seu estilo verbal, o léxico próprio, os recursos semióticos e logográficos. Portanto, as conversas virtuais nos programas de bate-papo apresentam todos os elementos necessários para que se tenha um gênero do discurso.

Nas conversas virtuais dos programas de bate-papo, as fronteiras entre a linguagem oral e a escrita são dissolvidas para formar o todo do discurso. Ao mesmo tempo em que os interlocutores escrevem no suporte, que é a tela do computador, as características da oralidade se articulam em forma de sinais de pontuação, letras maiúsculas para ênfase, emoticons, bem como winks e alfabeto tradicional em cores e fontes diferenciadas para que a interação esteja bem próxima da que ocorre na conversação face a face cotidiana. O certo é que, como o uso passou a ser freqüente entre os adeptos da Internet, os chat rooms estão se modernizando cada vez mais e atraindo, também, mais usuários que buscam serviços diversificados, eficientes e ágeis.

Outro dado que nos permite classificá-la como uma conversa, é que para haver conversação, de acordo com Marcuschi (2005a: 15), precisamos encontrar alguns elementos básicos, são eles: interação entre pelo menos dois falantes; pelo menos uma troca de falantes; presença de uma seqüência de ações coordenadas; identidade temporal e envolvimento em uma interação centrada.

A identidade temporal é o que pareceu ser o critério que menos atenderia às características básicas da conversação, porém encontramos em Marcuschi (2005a: 15): “a identidade temporal é necessária, porque a conversação, mesmo que se dê em espaços diversos, deve ocorrer durante o mesmo tempo.” A interação virtual se dá em tempo real, ou seja, de forma simultânea, ainda que ocorra com pessoas de cidades, estados e até países diferentes, a troca de informações por meio dos programas de bate-papo, só são possíveis se os usuários estiverem ao mesmo tempo na rede. Podemos comprovar isso nos horários da seguinte conversa de programa de bate-papo:

12/06/2005 22:35:01 (b) RAFAEL (B) BRAGACOP diz: oi

12/06/2005 22:35:28 (b) RAFAEL (B) BRAGACOP diz: tudo bem

12/06/2005 22:35:36 * k@k@*_: ) diz: oi

12/06/2005 22:06:09 *k@k@*_ : ) diz: blz

Notamos que o espaço de tempo é de segundos, tempo suficiente para teclar o que se quer dizer, ou prosseguir com outra “janela” de conversa virtual com outros contatos.

Portanto, se os adolescentes fazem parte dessa corrente de usuários em número maior e crescente, as expectativas são as de que eles vejam esse novo estilo da língua como mais atraente por sua dinâmica. Ainda que muitos educadores ainda encarem essas interações como amontoados de informações e abreviações criadas sem o menor critério.

 

CONSIDERAÇÕES SOBRE O SENTIDO DO TEXTO
DOS PROGRAMAS DE BATE-PAPO

Por meio dos organizadores da fala, dos marcadores conversacionais e dos pares adjacentes podemos formular um texto falado de forma coerente. As conversas nos programas de bate-papo são atividades próprias de um ambiente específico que é a Internet, além de não se tratarem de amontoados de palavras soltas e sem significado. 

Ao contrário do que se imaginava há algum tempo, o texto das conversas virtuais só podem ser compreendidos devido à atividade intencional por parte dos interlocutores de formularem textos que ofereçam marcas para que sejam compreendidos. Essa tarefa é que torna a conversação ao mesmo tempo uma atividade de ação e interação.

Quanto à linguagem não-padrão empregada, cheia de neologismos e abreviaturas, também é peculiar ao suporte utilizado e que só causa uma certa estranheza à primeira vista, essa é logo desfeita quando começa a interação e a captação do que exige o meio.

Um fato merece relevância, a fala está dentro do plano do continuum da língua em um pólo diferente do que está a escrita, ainda que os dois fatores da língua não estejam, nesse trabalho, sendo tratados de forma dicotômica e com privilégios, no pólo da fala há textos que são próprios da fala, como é o caso de bilhetes, recados e as conversações dos programas de bate-papo. Enquanto que no pólo da escrita há uma vastidão de textos que obedecem a critérios bem delimitados para textos escritos.

No caso das conversações via Internet, elas possuem um caráter híbrido, considerando a fala e a escrita, por essa razão temos regras maleáveis, para que não comprometam o estabelecimento do sentido no texto. Não podemos esperar que a coerência e a coesão de textos falados se dêem da mesma forma que nos textos escritos formais, uma vez que se espera de uma conversação formas mais dinâmicas e menos formuladas.

 

DISCUSSÃO DO PARALELO: TEXTO ARGUMENTATIVO
E LINGUAGEM DE BATE-PAPO

Primeiramente foram analisados formalmente 150 textos buscando a ocorrência de marcas de oralidade que se aproximassem ao máximo das praticadas nos programas de bate-papo da Internet. Nessa investigação percebemos vários problemas de ordem estrutural que na maioria das vezes comprometiam a coerência global do texto.

Diante desse quadro, os profissionais de várias áreas da educação foram procurados, ainda que não tenham sido abordados de maneira formal com questionários escritos, para que expressassem suas opiniões a respeito da produção textual dos alunos de ensino médio, que são induzidos pela maior parte das instituições de ensino a estarem preparados para processos seletivos, como o vestibular.

Indagados a respeito dos impactos da linguagem da Internet na produção de textos dos alunos, especificamente, de ensino médio, os professores foram unânimes em afirmar que não notavam a presença da linguagem de bate-papo, propriamente dita, nos textos formais exigidos. Ainda salientaram que a presença da oralidade nos textos é anterior à explosão do uso de Messenger por parte dos adolescentes. Como já frisado, a oralidade é anterior à escrita, portanto, apesar da linguagem ter que cumprir vários papéis, ora formais, ora informais, não é de se estranhar que em algum momento esses papéis se entrecruzem.

Cabe ressaltar que todos esses profissionais buscados, uma média 20, possuem domínio bom a excelente quanto ao uso da Internet. Também lembrando que esses profissionais foram procurados com base nos dados estatísticos relatados aqui outrora de que 85% dos usuários da Internet estão na classe A no Brasil. Dessa forma, a pesquisa só se tornaria viável caso fossemos ao encontro desses usuários, que, na maioria dos casos, são adolescentes e estudam em estabelecimentos de ensino particular, onde os profissionais da educação estão em contínuo processo de atualização de conteúdo e de metodologias, além de serem cobrados com rigor para estarem atentos às deficiências maiores na assimilação de conteúdo por parte dos alunos.

Nos textos argumentativo-dissertativos de alunos de ensino médio analisados, podemos constatar que a coerência sintática apresenta problemas na maioria dos casos. A maior incidência de problemas sintáticos está na concordância sujeito – verbo e na pontuação, que muitas vezes compromete a compreensão local. Quanto à ortografia, esperávamos encontrar marcas dos neologismos dos programas Messenger, no entanto, as incidências foram quase nulas.

Das 150 textos avaliados, cerca de 90 textos apresentaram problemas de várias ordens e que não estão necessariamente ligados ao uso intenso de gêneros emergentes – e-mail, messengers, salas de bate-papos. Contudo, ainda é cedo para concluirmos que o uso da Internet não está influenciando os meios textuais escolares.

Fica visível, na pesquisa com os textos, que está havendo uma perda vocabular gradativa na tentativa desses alunos de desenvolverem alguma idéia lógica, além da repetição de opiniões deixar a impressão de que há um molde a ser seguido e esse ser padrão.

A crítica a respeito de acontecimentos políticos, sociais, financeiros e culturais dentro de um texto argumentativo deveria servir como aliada na constituição de uma boa redação, se feita com bom tom e com argumentos aceitáveis e bem fundados. No entanto, o que aparece na maioria dos casos são textos vazios ou cópias fiéis de comentários recentes sobre determinado assunto proposto pela mídia de massa.

Para visualizarmos melhor o problema, tomemos como exemplo de 2 das 22 redações abordando o tema: Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor (FEBEM). Identificaremos os textos por meio de R- redação. É mister ressaltar que manterei com fidelidade as passagens transcritas dos textos selecionados.

R 1 – Crianças e adolescentes que vivem no abandonam, miséria e sem nenhuma estrutura familiar, tornam-se marginais e assim vão parar na FEBEM. Em um ambiente com condições desumanas, superlotações, maus tratos e violência num local que mistura crianças e jovens que cometerem delitos leves com os mais perigosos que cometeram homicídios, só faz a revolta aumentar e muitas vezes o jovem saí pior do que entrou. [...] A falta de atenção e copetência na qual está submetida, ainda estamos longe de uma solução.

R 2 – O problema que ainda atinge os jovens da FEBEM está ligado as condições que passaram durante a infância. Na maioria das vezes pobres e sem condições de concorrer no mercado de trabalho com outros, eles encontram uma forma de sobreviver através da bandidagem, roubo e tráfico de drogas.[...] Com isso, acabam sendo presos, em cadeias com péssimas condições, superlotadas. E além disso, sujeitos a serem violentados. Essa condição causaria revolta em qualquer um. O fato é que eles entram nas prisões revoltados e saem mais ainda.[...]. As rebeliões, portanto, continuarão à acontecer, devido as péssimas condições em que os jovens são tratados. Assim, ficam cada vez mais revoltados, agravando a situação social em que o país se encontra.

Observando esses exemplos de alguns dos melhores textos desse tema FEBEM, em muitos momentos acreditamos haver uma padronização na idéias e nas críticas. Os alunos não são capazes de fugir do senso comum, ou por falta de conhecimento do assunto, por um afastamento da realidade, ou pelo temor de uma banca de vestibular.

As marcas de oralidade mais comuns encontradas nos textos foram palavras de uso cotidiano por parte de todos os falantes, palavras ou estruturas verbais como: ta (estar), bem (marca de oralidade), te (ter). Percebemos muitos erros de acentuação e com o uso do verbo no infinitivo, que mesmo em redações consideradas muito boas aparecem. Erros ortográficos, de concordância e pontuação também são outras constantes, ora pela desatenção causada pelo nervosismo de ser avaliado pelo seu texto, ora por uma falta de vocabulário satisfatório e apreensão do conteúdo esperado ao grau escolar que já atingiram.

A linguagem chamada de internetês por muitos estudiosos pode ter contaminado os textos quando os programas de bate-papos eram novidades e viraram mania entre os adolescentes. No entanto, o que se pode perceber é que não chegaram a provocar uma revolução na escrita.

Portanto, a produção de textos e de discursos inclui a apresentação de muitos processos, fazendo com que seja imprescindível a abordagem das várias atividades humanas de linguagem, inclusive a linguagem utilizada no mundo “real” dos adolescentes desta geração, a linguagem dos bate-papos da Internet. Na medida em que esses adolescentes forem entendendo a heterogeneidade dos usos da língua e as implicações dela em âmbito social, sentirão igual responsabilidade em estarem atentos em adequar da melhor forma suas escritas, de modo que se apresentem bem no meio em que atuam por meio do texto oral e escrito.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKTHIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita- atividades de retextualização. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 2001.

––––––. Análise da conversação. 5ª ed. São Paulo: Ática, 2005a.

––––––; XAVIER, Antonio Carlos (orgs.). Hipertexto e gêneros digitais. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004.

OLSON, David R. O mundo no papel: as implicaçoes conceituais e cognitivas da leitura e da escrita. São Paulo: Ática, 1997.

ONG, Walter. Oralidade e cultura escrita: a tecnologização da palavra. Tradução Enid Abreu. Campinas: Papirus, 1998.

OTHERO, Gabriel Ávila. A língua portuguesa nas salas de bate-papo: uma visão lingüística de nosso idioma na era digital. Novo Hamburgo: Edição do Autor, 2002.

PEREIRA, Ana Paula M. S.; MOURA, Mirtes Zoe da Silva. A produção discursiva nas salas de bate-papo: formas e características processuais. In: FREITAS, Maria Teresa de Assunção; COSTA, Sérgio Roberto (orgs.). Leitura e escrita de adolescentes na Internet e na escola. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.