Barroco e Arcadismo, vozes contestadoras:
Arcadismo mineiro e Cifra libertária

Camillo Cavalcanti
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Nessa ficção poética, valores e utopias são acionados. Quanto aos valores, os árcades acreditavam na ragion poética, "um racionalismo de base que não exclui, antes estimula, a fantasia"; difundiam o princípio estético de amputar o supérfluo - daí inutilia truncat (mutilar inutilidades); estruturavam um esquema universal de ambientação - daí locus amoenus (lugar ameno). Quanto às utopias, quer-se viver intensamente o dia de hoje, sem preocupações com o amanhã, aliado ao bucolismo - daí carpe diem (desfrutar o dia); pretende-se, igualmente, buscar o sossego de uma vida longe das vaidades burguesas, de um retiro pacato e quase anônimo - daí medianitas (mediania); deseja-se, também, um tempo des-historizado - daí in illo tempore (naquele tempo).

Mais importante do que valores e utopias é a essência do Arcadismo. O pensamento árcade se expressa numa profunda ligação com o Liberalismo, pai do Iluminismo e do Direito Natural. No entanto, como a lógica do sistema ainda operava o Controle do Imaginário, isto é, a opressão, a censura e o poder alienador, na permanência de paradigmas absolutistas, as fontes liberais do Arcadismo eram trabalhadas veladamente, como transgressão do sistema opressor em direção à plenitude existencial. Por isso, o Arcadismo é a cifra do APELO por liberdade, que, na feição brasileira, representa poeticamente o ideário da Inconfidência Mineira. Assim, o Arcadismo é literatura em seu mais alto grau, manifestando-se como um radical "ato de liberdade", tanto no conteúdo cifrado e codificado, quanto na estrutura que se dobra para transpassar a censura e os limites do texto/doxa.