Sumário  

INTRODUÇÃO

RUI E A LÍNGUA PORTUGUESA

 

O varão

“Rui é um mundo.” (PEREIRA, 1945, p. 9). A flama viva do espírito, que Deus acendeu na lâmpada de barro da nossa mortalidade, sagrou-o, para a vigília dos séculos, o iluminado intérprete da consciência nacional – nas suas lutas e aspirações, no seu culto da justiça e no seu amor da liberdade:

Creio na liberdade onipotente, criadora das nações robustas; creio na lei, emanação dela, o seu órgão capital, a primeira das suas necessidades; creio que, neste regímen, não há poderes soberanos, e soberano é só o direito, interpretado pelos tribunais ... (BARBOSA, 1896, p. 216)

À face do mundo e com a bênção do céu, a nação brasileira, em apoteose, divinizou, a 13 de agosto de 1918, o jubileu cívico da sua glória, aclamando-o o maior de seus filhos.

Sob a beca do jurisconsulto, ou com a pena do jornalista; na curul senatorial, ou no apostolado da pregação popular; fronteiras dentro da terra natal, ou a deslumbrar os povos civilizados nas conferências internacionais – sempre se extremou pela fidelidade da vocação democrática, pela nobreza do idealismo mais puro e pela religião do trabalho. "Para ele" – escreveu Américo Palha em recente estudo biográfico –

a humanidade era a família comum de todos nós, irmanada pelos laços da fraternidade cristã. Onde houvesse um Caim, a sua palavra se erguia para vergastá-lo. Onde houvesse um réprobo, seu verbo se levantava para fulminá-lo (PALHA, 1948, p. 82)

Tão extenso se lhe alargara o campo das suas lidas e fainas; em tantas províncias do saber fora o primeiro, que (dir-se-ia), em sua época e depois dele, todos os brasileiros lhe ficamos a dever parte do nosso destino como povo.

"Bastaria vos lembrásseis" – é um trecho do elogio que lhe fez Laudelino Freire, ao suceder-lhe na Academia Brasileira de Letras –

que de Sólon e Licurgo teve a larga visão no legislar; de Publícolo, a resistência contra a tirania; de Péricles, a dignidade do proceder e a grandeza d’alma; de Marcelo, a coragem cívica; de Catão, aquele saber e utilidade nas orações do Senado; e de Demócrito, a mesma doçura e humanidade depois do triunfo ... (FREIRE, 1936, p. 37)

Nem espaço, nem tempo nos sobraria, na angusteza deste capítulo, para sequer esboçar a síntese da sua vida, nos dias largos de uma existência que as virtudes do trabalhador infatigável maravilhosamente multiplicaram. Já lhe tem sido glorificada, com brilho maior ou menor,[1] a ação de político e diplomata, de jurista e homem de estado, de evangelizador da liberdade e construtor da história republicana.

O que não se tem dito suficientemente a seu respeito é que, por entre os vaivéns da sua vertiginosa carreira, jamais deixou de haver nele

um homem ansioso pela verdade e pelo bem, corajoso e leal. Algumas das mais belas qualidades humanas iluminavam a sua vida como nenhuma eloquência poderia fazer. E mesmo quando todas as lições políticas, sociais e humanas, que ele escreveu e pregou, viessem a esmaecer definitivamente, restaria, como o seu legado aos homens, a nobreza moral do homem que ele foi. (DELGADO, 1945, p. 275)

Àquele que se iniciou na tribuna popular, ainda estudante, “em defesa de um escravo contra o senhor” (BARBOSA, 1897, p. 51); na tribuna forense, para desafrontar a “honra de uma inocente filha do povo contra a lascívia opulenta de um mandão” (Ib.); e na tribuna parlamentar, patrocinando a eleição de um conservador contra o próprio partido liberal em que militava – saberia conservar pelos anos fora, como coroa imperial da sua vida, a mesma invencível repugnância a qualquer forma de tirania e a mesma “sede insaciável de justiça” (Ib.), que lhe modelou irresistivelmente a carreira toda. Protestando sempre contra a brutalidade da força, herdou ao seu país a lição admirável de crer na lei, nos momentos em que todos dela duvidavam. Só não fez conspirar. Nem se pôs jamais ao lado da violência – quer a do poder constituído, quer a de rebeldes à ordem legal.

Propugnei ou adversei governos; golpeei ou escudei instituições; abalei até à morte um regímen, e colaborei decisiva e capitalmente no erigir de outro. Pelejei contra ministros e governos, contra prepotências e abusos, contra oligarquias e tiranos. Ensinei, com a doutrina e o exemplo, ma ainda mais com o exemplo que com a doutrina, o culto e a prática da legalidade, as normas e o uso da assistência constitucional, o desprezo e horror da opressão, o valor e a eficiência da justiça, o amor e o exercício da liberdade. (BARBOSA, 1920, p. 205)

Duas forças demolidoras – o modernismo e a ditadura – tentaram envolver em penumbra a incomodativa glória do seu nome, cuja presença permanente doía como uma acusação.

Uma grande glória pesa sempre aos contemporâneos. Se ela não é o que os homens mais ambicionam na vida, é certamente o que menos perdoam aos seus semelhantes. Não espanta que Aristófanes preparasse a cicuta de Sócrates, que Vergílio e Horácio nem sequer pronunciassem o nome de Cícero, que Madame de Sevigné, com igual clarividência, profetizasse Racine passaria, como havia de passar a moda recente do café ...

Quando um monstro, um Hugo, depois de encher um século com a atroada e o clarão do seu gênio, morre por fim, a humanidade que ele coagira ao admirar, suspira desabafada, e tàcitamente conspira, daí por diante, em não lhe repetir uma imagem, declamar um verso, reler um livro, divertindo-se em lhe devassar a intimidade para o reduzir à miséria comum dos viventes. Ai de quem possui uma glória exclusiva, e, portanto, intolerável, ou pior, uma glória duradoura, e, então, fatigante! (PEIXOTO, 1944, p. 45)

O mestre da língua e o escritor

Custa crer que, através de tantas personificações em que se lhe cem-dobrava a atividade, ainda lhe restasse energia e gosto para perseguir a perfeição literária, que só se conquista à força de vigílias esgotantes e de pertinacíssimo e amorosíssimo estudo.

Não queremos com isto insinuar haja sido Rui gramático, ou filólogo. Pensamos, até, que esses títulos lhe devam ser recusados.

Empolgou-o, sim, desde a puerícia, a paixão do idioma pátrio, instrumento do seu ministério, cujos recursos e segredos conhecia como ninguém. Em oração proferida no Senado, em 1904, ele nos ensina, com singular justeza, o lugar que cabe à gramática no estudo de uma língua:

Desde menino tive os bons livros dos nossos mestres de linguagem nas minhas mãos ... E foi esta a gramática que aprendi. Creio mesmo que, em um exame de regras gramaticais, seja, fatalmente, um aluno reprovado.

E’ este o meu conceito a respeito da gramática: é uma arte que se aprende pela prática, pelo manejo da língua, pela convivência com os que a falam e escrevem corretamente; e, se existe a ciência da gramática, não é senão, como várias autoridades competentes a têm definido, a ciência dos fatos da linguagem. (BARBOSA, 1904, p. 319)

Já vinte e um anos antes, no famoso Parecer (BARBOSA, 1946) sobre a reforma do ensino primário (1883), no qual mostra leitura dos mais distintos teoristas então em voga (Bréal, Brachet, Ayer, Whitney etc.), manifestara as mesmas convicções:

Que o ensino da língua não se confunde com o ensino da gramática, não é licito contestar. (Op. cit., p. 218-219).

O primeiro passo da gramática usual consiste numa definição, e de definições, de classificações, de preceitos dogmáticos se entretece todo este ensino. Em todo esse longo e penoso curso de trabalhos que nos consomem o melhor do tempo nos primeiros anos de estudo regular, não se sente, não há, não passa o mais leve movimento de vida. Como se as teorias fossem a primeira, e não a última, expressão da atividade intelectual no desenvolvimento do indivíduo, ou da humanidade. Como se o uso não fosse anterior às regras. Como se a definição não pressupusesse o conhecimento cabalmente real do objeto definido. Como se a linguagem, numa palavra, não precedesse necessariamente as codificações gramaticais! (Ib., p. 227)

... quando a observação constante, em toda a parte, nos está mostrando, na infância, no povo, e até entre indivíduos dados ao trato literário, a mais pura vernaculidade ordinariamente aliada à mais completa ignorância das leis da ortodoxia gramatical. (Ib., p. 233).

Na sua vasta biblioteca, conservada na “Casa de Rui Barbosa”, antiga residência do mestre, que a devoção do Governo brasileiro transformou em museu público, encontram-se vestígios indeléveis do seu amor à língua. Seus dicionários portugueses (todos o sabem), lia-os Rui de capa a capa, e marginava-lhes os verbetes de aditamentos e remissões, opuletando, aqui, a sinonímia, documentando, além, um torneio de frase, corrigindo, adiante, uma citação em falso. Apenas por amostra, a título de fundamentação, colhemos, a esmo, no mais conhecido dos nossos dicionários, o de Cândido de Figueiredo (edição de 1899), estas anotações do próprio punho de Rui, a tinta vermelha:

verbete alpestre: a que ele acrescentou: alpígeno, alpense, alpino, álpico, alpéstrico, alpestrino;

verbete gabo:     a que ele aditou: gabadela, gabação, gabamento, gabazola;

verbete açoite:    logo enriquecido com os sinônimos: látego, chibata, azorrague, vergalho, tagante, relho, estafim, vergasta, flagelo.

Ao perlustrarmos o velho Morais (na 1ª edição), deparou-se-nos o mesmo empenho de carrear material variado para os seus escritos; ao verbete, por exemplo, açoutar, apôs ele, em chorrilho, meia dúzia de vozes equivalentes: atagantar, azorragar, verberar, vergalhar, fustigar, chicotear.

Notícia que todos os estudiosos da língua portuguesa receberam com imensa alegria, foi a de que, na edição das “Obras Completas”, em cento e cinquenta volumes, que se está preparando para as comemorações do centenário, um dos tomos (o da Réplica) reunirá, em apêndice, preciosos inéditos de um Dicionário Analógico, que ele, por certo, pretendia concluir e, talvez, publicar. O exame desses apontamentos nos revela que Rui trabalhara neles durante toda a vida, pois o caderno mais antigo está datado de 1864, e as notas mais recentes já foram escritas naquele excelente papel pautado que ele trouxera do seu exílio na Inglaterra.

Era este o segredo da copiosidade de seu vocabulário, do que nos dá exemplo a memorável página “A Rebenqueida” (BARBOSA, 1912), onde, por entre os estiletes de uma ironia golpeante, se alinham trinta e tantos sinônimos da palavra rebenque! Tivemos em mãos, na “Casa de Rui Barbosa”, a folha original (Fig. 1) onde foram recolhidas as palavras para a construção dessa brilhante peça literária e política.

O manusear os volumes de seus clássicos portugueses permite-nos apurar, com surpresa crescente, o vigor do seu espírito de eleição: os mestres de seu pensamento e de seu estilo, aqueles que mais o seduziram e lhe plasmaram a individualidade de escritor, foram, sem dúvida, Frei Luís de Sousa, Bernardes, Herculano, Camilo e o padre Antônio Vieira, este principalmente, cuja música oratória e audácia de arquitetura verbal somente Rui pôde rivalizar.

Não satisfeito com os comentários que punha às margens das folhas dos “Sermões”, trasladava-os ele para cadernos metodicamente numerados, que recebiam as rubricas devidas: “Vieira-Sintaxe”; “Vieira-Ideias” ...

Daí as aproximações inevitáveis entre a forma literária de Vieira e a de Rui; em muitos passos, este está visivelmente impregnado daquele.

Nos artifícios de ideação e no jogo harmonioso das repetições e antíteses, um e outro prestaram tributo àquele ludismo quase sensual da mais desvairada prosa gongórica. Compare-se este cintilante excerto de Vieira, no “Sermão de Santo Antônio”, pregado na cidade de São Luís do Maranhão, em 1654, aos fragmentos de Rui, postos logo a seguir:

VIEIRA: Vós, diz Cristo Senhor Nosso, falando com os Pregadores, sois o sal da terra; e chama-lhe sal da terra, porque quer que façam na terra, o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção, mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela, que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os Pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina, que lhe dão, a não querem receber: ou é porque o sal não salga, e os Pregadores dizem ũa cousa, e fazem outra, ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem que fazer o que dizem: ou é porque o sal não salga, e os Pregadores se pregam a si, e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal.

 ......................................................................... (VIEIRA, 1944)

RUI:        A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura.

Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. (BARBOAS, 1921, p. 25)

E estoutro trecho, provocado pela declaração do chanceler da Alemanha de que os tratados internacionais eram “trapos de papel”:

Se os tratados são trapos de papel, porque se consignam em papéis, trapos de papel são contratos, porque todos em papel se escrevem. Se, celebrando-se no papel, os tratados, por isso, não são mais que trapos de papel, mais que trapos de papel não são também as leis, que no papel se formulam, decretam e promulgam. Se os tratados, porque recebem no papel a sua forma invisível, a trapos de papel se reduzem, as Constituições, que no papel se pactuam, não passam de trapos de papel. Trapos de papel maiores ou menores, mas tudo papel e em trapos. (BARBOSA, 1916, p. 86)

A própria Réplica (BARBOSA, 1904) é menos um monumento gramatical do que mais uma coroa para o escritor culto e de bom gosto. Haja vista, para aludir somente a um lugar, o capítulo sobre o Neologismo (nº 475, especialmente), capítulo que nenhum gramático do mundo escreveria, e raros escritores saberiam fazê-lo com aquele brilho literário que Rui lhe comunicou.

No entanto, parece lícito concluir que ele se beneficiou grandemente com a feitura da Réplica. Porque, de começo, sua pena não seguia tão à risca, em muitos casos, os preceitos literários havidos por exemplares. A propósito, deponha Sousa da Silveira:

Alguns dos grandes escritores brasileiros, como Rui Barbosa, João Ribeiro e Raimundo Correia, que no princípio da sua carreira literária, embora escrevessem em português, se afastavam um pouco do bom tipo linguístico, esforçaram-se depois por acompanhá-lo de mais perto, e conseguiram tornar-se modelos da mais formosa vernaculidade. (SILVEIRA, 1947)

Prova magnífica de sua evolução como mestre da língua, surpeendemo-la nos dois [primeiros] volumes da Queda do Império (BARBOSA, 1947), nos quais, ao recompor, em 1921, para publicação em livro, os artigos estampados, em 1889, no Diário de Notícias, quase se diria que fez timbre em obedecer, à letra, às lições da Réplica.

Curioso é que, entre os que lhe negavam a qualidade de escritor, figurava ele próprio em primeiro lugar. Fundido em moldes olímpicos, talvez pensava que, à força de o glorificarem como puro homem de letras, iriam deixando na penumbra o coautor da Abolição, o arquiteto da República, o apóstolo do Civilismo, E’ o que se depreende deste fragmento do discurso do jubileu:

Os órgãos de publicidade, que redigi, eram todos eles de política militante; os livros, que escrevi, trabalhos de atividade pugnaz; as situações em que me distingui, situações de energia ofensiva ou defensiva.

...............................................................................................

Uma existência vivida assim nos campos de batalha, tecida, assim, toda ela, dos fios da ação combatente não se desnatura da sua substância, não se desintegra dos seus elementos orgânicos, para se apresentar desvestida e transmudada naquilo que ela tem menos, na mera existência de um homem de letras. Como quer que se encare, boa ou má, é a de um missionário, é a de um soldado, é a de um construtor. As letras nela entram apenas como a forma da palavra, que reveste o pensamento, como a eloquência, que dobra o poder das ideias, como a beleza aparente que reflete a beleza interior, como a condição de asseio que lhe dá clareza às opiniões, que as dota de elegância, que as faz inteligíveis e amáveis. (BARBOSA, 1920, p. 205)

Se é certo que ele não se adarvou na longínqua turris eburnea da arte pela arte, que somente pisam os imaculados, os budas – não é menos certo que bastariam para imortalizá-lo, além das suas obras de índole estritamente literária, aquelas grandes perorações épicas e aqueles trechos sublimados de beleza, que ele encravou nos seus discursos, nos seus escritos, e, até, nas páginas técnicas de muitos trabalhos forenses! Não é num discurso político que se engasta “O Estouro da Boiada” (BARBOSA, 1910, p. 134), aí posto, oito anos depois de Os Sertões, com o intuito visível de provocar um paralelo literário com a descrição de Euclides da Cunha? Não é ao caricaturar um adversário político de ocasião, que lhe sai da pena o imortal libelo contra “O jogo” (BARBOSA, 1897a, p. 109)? Que autor sacro escreveu prosa de maior sopro lírico sobre o mistério da Ressurreição, do que o Rui da “Prece de Natal” (Id., 1898), ou de “Surrexit” (Id., 1899b)? E a inigualável “Visita à terra natal” (Id., 1948)? E o quadro bucólico das “Andorinhas de campinas" (Id., 1920, p. 182-183)? e a “Saudação aos jangadeiros” (Id., 1922)? e “Bustos e estátuas” (Id., 1920, p. 206-207)? e Porneia (Id., 1899a)? Não teria fim esta enumeração ...

Depois de haver escrito, a propósito da redação do Código Civil, aquele pensamento lapidar:

... só o influxo da arte comunica durabilidade à escrita humana, só ele marmoriza o papel e transforma a pena em escopro. (BARBOSA, 1902, p. 5)

ele, na oração clássica, em francês, com que recebeu a Anatole France na Academia Brasileira de Letras, confessou reconhecer que

... la forme, dans l’idéalité de ses lignes, c’est presque toujours ce qui reste de la pensée, comme une amphore ancienne d’une essence perdue. (BARBOSA, MCMIX, p. 29)

Como produções literárias puras, lembre-se (e é ele mesmo quem no-las cita):

O elogio do poeta, a respeito de Castro Alves; a oração do centenário do marquês de Pombal; o ensaio acerca de Swift; a crítica do livro de Balfour; o discurso do Liceu de Artes e Ofícios, sobre o desenho aplicado à arte industrial; o discurso do Colégio Anchieta; o discurso do Instituto dos Advogados; o parecer e a réplica acerca do Código Civil; umas duas tentativas de versão homométrica da poesia inimitável de Leopárdi; a adaptação do livro de Calkins, e alguns artigos esparsos de jornais, literários pelo feitio ou pelo assunto. (Id., 1920, p. 203).

Esqueceu-lhe muita coisa ainda, especialmente o adeus a Machado de Assis (PUJOL, 1917, p. 355) que, por si só, consagraria qualquer grande prosador em qualquer parte do mundo.

Escritor, Rui logrou alcançar, iluminada e serena, a perfeição que sonhara: marmorizou o papel e transformou a pena em escopro, para glória da língua portuguesa.

 

[1] – Pela objetividade e profundeza de análise, banido o tom vulgar da apologia pela apologia, merecem relevo especial estas três obras, publicadas ùltimamente: Viana Filho (1941), Mangabeira (1943) e Delgado (1945).